O prazo para a regulamentação da lei das apostas de cota fixa (popularmente conhecidas como lei das apostas esportivas) será encerrado nesta terça-feira (13) e, ao que tudo indica, não haverá a sanção do presidente Jair Bolsonaro.
A lei 13.756/18, que permitiu as apostas esportivas no Brasil, foi assinada pelo então presidente Michel Temer e previa que o setor seria regulamentado nos próximos dois anos, prorrogáveis por mais dois. O prazo começou a contar a partir da publicação da lei pelo Diário Oficial da União, em 13 de dezembro de 2018.
Durante esse período, a tarefa de estabelecer o regramento do setor esteve a cargo do Ministério da Economia, que também teve a consultoria de outras pastas, como Casa Civil e Justiça, para que as regras não ferissem alguma legislação vigente. Uma minuta de decreto foi estabelecida em março, agradou o setor e é esperada que passe a valer ansiosamente pelos operadores.
“O Galera.bet entende que a regulamentação do mercado de apostas no Brasil é extremamente positiva e tem presença ativa em consultas e audiências sobre o tema”, contou Marcos Sabiá, CEO da operação do Galera.bet, em entrevista à Máquina do Esporte.
Mesmo sem regulamentação, o Galera.bet tem feito fortes investimentos em marketing, sendo patrocinador do Brasileirão (masculino e feminino), do Corinthians e da Confederação Brasileira de Basquete (CBB), entre outros ativos.
“A regulamentação é um instrumento importante para a proteção dos clientes e dos princípios de jogo responsável, determinando uma diretriz sob a qual as marcas devem atuar no mercado e garantindo as obrigações e responsabilidades dessas empresas com o usuário final”
Marcos Sabiá, CEO da operação do Galera.bet
“Apenas com a regulamentação é possível atingir um ecossistema de mercado saudável para todas as partes envolvidas no negócio”, completou o executivo.
Atraso
No entanto, apesar da expectativa do mercado, o governo federal adiou continuamente a sanção presidencial das normas para apostas. Inicialmente, o atraso foi motivado pela eleição presidencial. Havia o receio de que a regulamentação pudesse afastar de Jair Bolsonaro parte de sua base aliada, como os evangélicos.
Com o fim do pleito e com a derrota de Bolsonaro para Luiz Inácio Lula da Silva, houve a esperança de que o atual presidente finalmente assinaria o decreto. Isso, porém, não ocorreu.
Questionado sobre o que faltava para o documento conseguir a sanção presidencial, o Ministério da Economia afirmou que não se manifestaria sobre o tema.
Já a assessoria de imprensa da área de Esporte da equipe de transição do presidente Lula não respondeu aos contatos da reportagem. Ainda não houve manifestação oficial do futuro presidente, diplomado nesta segunda-feira (12), sobre o assunto.
Offshore
Sem a regulamentação, as empresas seguirão atuando da mesma maneira que já fazem: com escritórios fora do país, aceitando apostas de brasileiros e sendo tributadas nos países em que mantêm sede.
“Operamos legalmente no Brasil através da nossa estrutura offshore licenciada e credenciada para tal fim”, contou Darwin Filho, CEO da Esportes da Sorte.
Mesmo sem regulamentação, a marca já faz investimentos fortes em marketing para crescer no Brasil. O site de apostas tem contrato com jogadores como Matheus Cunha (Atlético de Madrid), João Gomes (Flamengo) e Rodinei (Olympiacos), além do ex-jogador Grafite (comentarista da Globo), do surfista Pedro Scooby, dos cantores Nego do Borel e Jonas Esticado, e dos influenciadores Deolane Bezerra e Lucas Guimarães, entre outros. Darwin, porém, lamenta que não haja evolução no Brasil.
“Preferíamos trabalhar com um CNPJ brasileiro: licenciado, credenciado e recolhendo os impostos para o Estado brasileiro, em vez do recolhimento de impostos no exterior, como é feito hoje, por falta de outra opção viável”, disse o executivo.
Impostos
É impossível dimensionar quanto o Brasil perdeu em arrecadação com impostos nesses quatro anos com a permissão das apostas, mas sem regras estabelecidas para a atuação. Há várias estimativas, mas é impossível chegar a um número confiável porque não há nenhum controle do Estado, nem uma associação que congregue o setor.
“Sem a regulamentação, há uma impossibilidade de arrecadação de tributos sobre este mercado no Brasil, considerando que os consumidores brasileiros continuarão recorrendo a empresas estrangeiras para utilizar os serviços de apostas”, argumentou Sabiá, do Galera.bet.
“No longo prazo, isso pode afetar a experiência dos jogadores, além de ser mais difícil para órgãos e instituições brasileiras fiscalizarem esse mercado”, completou o executivo.
Segundo levantamento de especialistas na área, há pelo menos 200 casas de apostas atuando no Brasil. Nessa relação, estão apenas empresas com maior visibilidade, que mantêm patrocínios esportivos ou investem em anúncios publicitários na mídia ou nas redes sociais. É provável que esse número seja ainda maior. Há estimativas de que existam entre 450 e 500 plataformas aceitando apostas de brasileiros.
Para atuar no Brasil, de acordo com um decreto formulado pelo Ministério da Economia, cada empresa teria que pagar uma taxa de R$ 22,2 milhões de licença. Portanto, se essas 200 plataformas de apostas, que já gastam com publicidade e marketing no país, quisessem formalizar sua entrada por aqui, já haveria uma arrecadação de R$ 4,44 bilhões para o governo federal.
Tais números ainda poderão ser inflados com a tributação das apostas em solo nacional. O Brasil é visto como um dos mercados mais promissores do planeta. Mas qual é o tamanho desse mercado? Ninguém é capaz de dizer.
“Há muitas variáveis envolvidas. Não gosto de falar em números. Nunca consegui encontrar um relatório sobre o setor que trouxesse uma metodologia eficaz sobre a quantidade de casas de apostas atuando no Brasil”, afirmou Udo Seckelmann, advogado do escritório Bichara e Motta e especialista no tema.
Empregos
Pelo mesmo motivo, é quase impossível dimensionar quantos empregos seriam criados no Brasil com a regulamentação das apostas. Mas não é difícil prever que a maioria dessas empresas passaria a contar com operação no país, gerando postos de trabalho e a necessidade de especialização da mão de obra nacional para o setor.
Sem normas estabelecidas, as empresas estudam as alternativas para continuar atuando no Brasil.
“Continuaremos a avaliar internamente, em conjunto com nosso jurídico, o melhor modelo para o prosseguimento da nossa operação. Hoje, operamos com licenciamento/credenciamento no exterior, bem como hospedagem de servidores e fluxo de pagamentos, tudo realizado fora do Brasil”
Darwin Filho, CEO da Esportes da Sorte
“A partir da inércia do poder público, vislumbraremos qual é a melhor alternativa a se seguir“, completou o executivo.
A decisão provável é aquela que apontam os advogados ouvidos pela Máquina do Esporte: continuar tudo do mesmo jeito.
“Não muda nada. Havia o prazo para fazer regulamentação, mas não existe uma sanção caso ela não ocorra. Isso não tira os efeitos da lei, nem a revoga”, explicou Luiz Felipe Maia, sócio-fundador da FYMSA Advogados e especialista no tema.
“Estamos falando de um serviço público, que não pode operar sem autorização. As empresas vão continuar gastando com publicidade e aceitando apostas de brasileiros. Enquanto isso, ninguém recolhe impostos no Brasil. Temos uma situação que seria engraçada, se não fosse trágica: as empresas querendo pagar imposto aqui e não podendo”, finalizou o advogado.