O Napoli resolveu tomar uma atitude mais drástica, depois que a Federação Italiana de Futebol optou por absolver o zagueiro Francesco Acerbi, da Internazionale, acusado de praticar racismo contra o brasileiro Juan Jesus, durante a partida válida pela Serie A, realizada no último dia 18 de março, em Milão.
A entidade alegou falta de provas e inocentou Acerbi, que proferiu para Juan as seguintes palavras: “Vá embora negro, você é apenas um negro”. No momento em que essa agressão ocorreu, a vítima chegou a abordar o árbitro e apontar para o patch utilizado nas camisas das equipes que disputam a Serie A. Elas trazem o slogan “Keep racism out”, que pode ser traduzido como “Mantenha o racismo fora”.
A decisão da Federação Italiana, de manter o racismo dentro da principal competição de futebol do país, fez o clube anunciar que não utilizará mais o patch com o slogan repleto de boas intenções.
O anúncio foi feito por Tommaso Bianchini, gerente de marketing do Napoli, durante a coletiva de apresentação do uniforme especial que o time usará no próximo sábado (30), na partida contra a Atalanta. A camisa celebra a parceria com a MSC Cruzeiros, patrocinadora máster da equipe.
Bianchini foi questionado a respeito da ausência do patch antirracista da Serie A. O slogan adotado pela liga foi classificado pelo clube como uma “iniciativa de fachada”.
O dirigente explicou que “qualquer iniciativa contra o racismo será feita pelo Napoli diretamente e não mais por meio de intermediários, órgãos, empresas ou organizações”.
“Então, vamos seguir em frente por conta própria”, afirmou Bianchini.
Em seu site oficial, o Napoli divulgou um relato de Juan Jesus, em que o atleta demonstra indignação com a decisão que beneficiou o autor das agressões racistas.
Após essa decisão, imagino que qualquer outra pessoa que se encontre em uma situação semelhante à minha agirá de maneira muito diferente, a fim de se proteger e conter a desgraça do racismo, do qual, infelizmente, estamos lutando para nos livrar.
Não me sinto de forma alguma protegido por uma decisão que tanto admite que “houve certamente provas do insulto” como sustenta que não há certeza de que tenha sido de natureza discriminatória, o que só eu percebi “de boa-fé”.
Eu realmente não entendo como “vá embora negro, você é apenas um negro” pode ser considerado certamente ofensivo, mas não discriminatório.
Não entendo toda a comoção daquela noite se realmente foi “apenas um insulto”, pelo qual o próprio Acerbi sentiu necessidade de pedir desculpas, o árbitro decidiu notificar o VAR, a partida foi suspensa por mais de um minuto e seus companheiros se apressaram em falar comigo.
Juan Jesus, jogador do Napoli
Problema recorrente
Nos últimos tempos, as agressões racistas, especialmente contra atletas negros, tornaram-se um problema recorrente nos gramados da Europa.
O caso que mais chama a atenção envolve o brasileiro Vinicius Júnior, que tem sofrido ataques reiterados vindos das arquibancadas, especialmente da torcida do Atlético de Madrid, arquirrival de seu clube, o Real Madrid.
Mas não apenas. Vini Jr. já sofreu insultos racistas vindos de dirigentes espanhóis, de comentaristas esportivos da TV e até de ex-atletas sul-americanos, como o paraguaio José Luis Chilavert, que usou termos homofóbicos para desqualificar a reação emocionada do jogador brasileiro, diante de todos os ataques que vem sofrendo.
O último caso notório de racismo contra Vini Jr. ocorreu neste mês, quando torcedores de Barcelona e Atlético de Madrid proferiram cânticos repletos de injúrias contra o brasileiro, antes das partidas de seus clubes pela Champions League.
À ocasião, o Real Madrid emitiu uma nota oficial, clamando às autoridades judiciais que tomassem alguma medida em relação aos agressores.
“O Real pede à Justiça que solicite às forças de segurança as gravações existentes nas duas localidades, a fim de identificar os autores dos insultos racistas e de ódio. Condenamos os violentos ataques de discriminação, que se produzem de maneira lamentável, contra Vinicius Júnior. Nosso clube seguirá trabalhando na defesa dos valores do futebol e do esporte, e se manterá firme em sua luta pela tolerância zero frente a episódios tão repugnantes como os recentes”, afirmou a nota de repúdio.
Desde que o problema do racismo nos estádios europeus passou a ganhar repercussão internacional, as ligas, clubes e demais entidades têm buscado demonstrar que estão empenhadas no combate ao problema.
De um modo geral, porém, as medidas adotadas consistem em mensagens de conscientização, como o slogan utilizado nas camisas dos times da Serie A da Itália.
Ou braçadeiras com a frase “LaLiga vs racism”, distribuídas nas arquibancadas da Espanha, no ano passado.
Ou mesmo as placas com QR Code instaladas nos estádios da LaLiga, para que torcedores pudessem usar seus celulares para denunciar eventuais casos de racismo às autoridades.
Mas situações como a absolvição de Acerbi ou mesmo a impunidade dos torcedores de Barcelona e Atlético de Madrid (que poderão vibrar com seus clubes na fase decisiva da Champions League 2023/2024, mesmo depois da demonstração pública de ódio racial que fizeram) indicam que o problema talvez não esteja, necessariamente, nos slogans ou na ausência de denúncias.