A Cerimônia de Abertura dos Jogos Olímpicos de Paris 2024 foi original, em sua proposta de realizar o evento em um passeio pelo Rio Sena e não em um espaço fechado num estádio olímpico. A perspectiva de realizar um passeio de 6km por pontos turísticos da capital francesa é, de fato, uma perspectiva inusitada para todas as delegações que participaram da iniciativa.
Cerca de 7 mil dos mais de 10.700 atletas de 205 países (mais o time de refugiados) que disputarão 19 dias de competições participaram do desfile, divididos em 85 barcos. Para delegações maiores, como a do Time Brasil, um barco só dela. Para times menores, a divisão do espaço com países vizinhos na ordem alfabética.
Para o público que adquiriu ingresso e acompanhou algum trecho do desfile, a visão fica ainda mais distante da que teria das delegações em um estádio. Falta o conforto e a o entendimento do todo, que arenas fechadas proporcionam. Afinal, esses espaços foram especialmente projetados para esse tipo de espetáculo, entre outros.
Há vantagens, como a maior mobilidade para quem conseguiu passar por todos os bloqueios impostos pelas normas de segurança, embora a chuva tenha atrapalhado. É algo que também aconteceria em estádio e que costuma dar as caras em cerimônias do tipo. Mas fazer a festa em uma paisagem natural serviu para os organizadores exibir lugares icônicos da capital francesa que as limitações de um estádio jamais permitiriam.
Paris 2024 conseguiu, de fato, abraçar a cidade com sua festa de abertura, sem limitações de espaços fechados. Muito mais gente teve acesso ao local (os organizadores falaram em até 300 mil espectadores). Mesmo o morador que não esteve em algum ponto da cerimônia pôde se sentir mais próximo de ter participado de tudo.
Muitas das atrações, porém, não ficam disponíveis ao público que assistiu do local à inusitada cerimônia. Não há telões para acompanhar a narrativa que o Comitê Organizador de cada festa de abertura costuma contar para destacar os aspectos culturais, mostrar os orgulhos nacionais e as contribuições à civilização de cada país-sede.
Festa de Abertura olímpica é, sim, uma celebração ao Estado-nação, conceito forjado com a Revolução Industrial. Não à toa, acompanhou o desenvolvimento das Olimpíadas, ressurgidas no fim do século XIX. Eric Hobsbawm permanece vivíssimo.
Mas voltemos às margens do Sena. Em relação a quem vê da TV, perde-se muito para o torcedor que está ao vivo no local da festa. Por exemplo, as belas coreografias gravadas, como as que representaram a reconstrução da Catedral de Notre-Dame, um dos orgulhos de Paris, incendiada em 2019. Ou o périplo do condutor misterioso da tocha olímpica, passando por locais e situações que mostraram elementos caros aos franceses, como a indústria da moda.
Tradição x inovação
Pode-se até criticar as dificuldades de acesso, a falta de conforto, a ausência de visão do todo, as limitações impostas pela segurança e a distância dos atletas que orgulhosamente desfilam.
O fato é que a realizar a operação logística e coreografar uma cerimônia ao longo de 6km e 4 horas é um desafio considerável. E os organizadores de Paris 2024 se propuseram a fazer isso.
E, apesar de contratempos (ataque ao sistema ferroviário e chuva sendo os principais), foram bem-sucedidos na iniciativa. Paris foi onde surgiram os Jogos Olímpicos da Era Moderna, em um Congresso na Sorbonne, há 130 anos. A Cidade Luz não abrigava as Olimpíadas havia 100 anos.
Por tudo isso, a França já representa uma tradição considerável na história olímpica. Paris 2024 quebrou parâmetro. Lançou desafio para Los Angeles, Brisbane e a quem mais vier no futuro. Difícil vai ser superar em originalidade.