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Saída de Daniel Levy do Tottenham mostra que no esporte, às vezes, fazer tudo certo não é o suficiente

Um clube, até mesmo quando se tornou uma empresa, continua sendo um clube, e os resultados esportivos sempre terão enorme importância

Daniel Levy foi presidente-executivo do Tottenham por quase 25 anos - Reprodução / BBC

A saída de Daniel Levy do comando executivo do Tottenham no início deste mês encerra uma era que redefiniu o clube como potência financeira, mas escancara um dilema central da gestão esportiva moderna: resultados econômicos exemplares não garantem o sucesso esportivo. Pode parecer uma afirmação lógica, mas isso ficará claro abaixo, quando a Máquina do Esporte mostrar o tamanho do feito que Levy realizou em quase 25 anos à frente dos Spurs e que é digno de qualquer manual de MBA.

Durante todo esse tempo, uma das condições que mais chamou atenção foi o baixo custo com folha salarial. Em 2023/2024, por exemplo, entre os clubes da Premier League que figuram entre as 20 maiores receitas do planeta, o Tottenham apresentava a menor proporção de gastos com folha: 42% da receita (cerca de £ 222 milhões).

Outro vetor fundamental e ponto de inflexão e consolidação econômica foi a construção do multifuncional Tottenham Hotspur Stadium, que diversificou e aumentou as receitas, superiores a £ 6 milhões em dias de jogo, e é capaz de receber eventos como jogos da NFL e shows de grandes artistas. Os acordos comerciais também bateram recorde: £ 321 milhões, superando as receitas com bilheteria e até com direitos de transmissão, segundo dados do Football Money League 2025, da Deloitte.

Tudo isso elevou o clube ao grupo das dez maiores receitas do futebol mundial, com crescimento de 152% em apenas oito anos. E, claro, rendeu reconhecimento formal ao Tottenham, ficando no topo do Fair Game Index, ranking que avalia clubes ingleses em relação a sustentabilidade financeira, governança, engajamento com torcedores e ética.

Perguntado sobre se o Tottenham não fosse um clube de futebol, seria considerado um negócio “bem gerido”, o especialista em finanças no futebol Kieran Maguire afirmou: “absolutamente”, além de ressaltar que seria um ótimo estudo de caso.

Esse sucesso financeiro, porém, contrastou com a escassez de conquistas esportivas: foram apenas dois títulos, além de uma final de Champions League em todo o período. A prudência de Levy, voltada para a sustentabilidade, foi muitas vezes percebida pelos torcedores como falta de ambição, alimentando protestos e um crescente desgaste. Fred Caldeira fez uma boa comparação com o cenário vivido pelo Flamengo na gestão de Eduardo Bandeira de Mello: finanças exemplares, mas uma pressão enorme por resultados esportivos, tanto da mídia como dentro do clube e também por boa parte dos torcedores.

Apesar de existirem torcedores conscientes sobre a gestão dos clubes, e até os considerados “torcedores de balanço”, fica claro que, mesmo fazendo (quase) tudo certo, um clube, até mesmo quando se tornou uma empresa, continua sendo um clube. 

Para quem quiser se aprofundar no tema, fica aqui uma análise do site The Athletic, que explicita até uma queda financeira na última temporada do Tottenham sob o comando de Daniel Levy.

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