Apesar de ter vencido o Campeonato Brasileiro, o Fluminense terá nova gestão no triênio composto por 2011, 2012 e 2013. Ao lado de Peter Siemsen, presidente eleito com 66,5% dos votos, Idel Halfen assume a vice-presidência de marketing com a missão de criar ações planejadas, embasadas por pesquisas com torcedores.
A ampliação do portfólio de produtos licenciados surge como uma das prioridades, principalmente para explorar a imagem de figuras como Conca, Fred ou Muricy Ramalho. Ao contrário do que é feito em outros times brasileiros, entretanto, o novo vice-presidente quer agir amparado por estudos que aumentem a eficácia das iniciativas.
“Queremos algo com planejamento, e não só pegar um caso fortuito, como o Conca ter sido eleito o melhor do Brasileirão, e lançar camisa”, argumenta o executivo em entrevista exclusiva à Máquina do Esporte. “Um grande diferencial é ter uma área de inteligência de marketing, para definir quem é o cliente, quais atributos ele valoriza”.
A execução desse modelo, no entanto, tende a ocorrer gradualmente, mas o Fluminense conta com dois parceiros de alto calibre. A Unimed, parceira do clube desde 1999, renovou por mais um ano o contrato de patrocínio, e a Traffic, empresa de marketing esportivo, foi contratada para auxiliar o marketing do clube em funções operacionais.
As deficiências a serem amenizadas, porém, estão em evidência em diversas áreas. Comercialização de ingressos e aperfeiçoamento do programa de sócios-torcedores, segundo o novo vice-presidente, são duas prioridades “zero”. Ainda há, em longo prazo, as construções de centro de treinamento e estádio, carências comuns no Rio de Janeiro.
Confira, abaixo, a entrevista na íntegra:
Máquina do Esporte: Quais são os projetos da nova diretoria para aproveitar a exposição gerada pelo título nacional?
Idel Halfen: Na verdade, nós ainda estamos assumindo, e temos grandes problemas a serem resolvidos. Um grande problema é a venda de ingressos, algo que temos de resolver. Nós iremos criar algum sistema de sócio-torcedor, ou seja lá qual será a nomenclatura adotada, que será nosso projeto prioritário. Não sei se já no início dá para fazer da forma como pretendemos, mas temos em mente fazer algo que beneficie o sócio, o torcedor, apesar de que não gosto de usar essa nomenclatura porque ela dá a entender que ele terá direito a usar as dependências do clube, o que não pode ser transformado em realidade. O grande problema é que sócios têm direito a usar piscina, instalações, então não sei se iremos usar essa nomenclatura. A ideia é ter um projeto no qual o torcedor que se filia tem uma série de vantagens com uma série de parceiros. É mais próximo de um programa de fidelidade.
ME: Em relação aos ingressos, qual é o maior problema?
IH: A forma como o ingresso tem sido comercializado. Não tenho dados de contratos, mas, principalmente em jogos que a demanda é maior que a oferta, não há locais suficientes para venda, o que causa irritação nos torcedores. O sujeito não sabe se terá direito a ingresso, passa horas debaixo de sol e chuva, na dúvida se os ingressos serão colocados à venda. Há uma necessidade maior de melhorar essas vendas.
ME: Existe algum plano específico do marketing para atletas como Fred e Conca?
IH: É óbvio que pretendemos aproveitar esses atletas. O potencial de receita que eles podem criar para o clube, por meio de licenciamentos e venda de camisas, é enorme. Mas queremos algo com planejamento, e não só pegar um caso fortuito, como o Conca ter sido eleito o melhor do Brasileirão, e lançar camisa. Algo mais planejado. Na linha do tempo, uma produção dos produtos corretos, voltados para um público-alvo, que ainda vamos definir qual é. Não adianta ter produto que não é bem distribuído. Nessa parte de licenciamentos, queremos trabalhar melhor a gerência de produtos. Queremos ser responsáveis pelo desenvolvimento, pela distribuição, pela dispersão de linha, por várias etapas.
ME: Vocês já têm um modelo de trabalho pronto para produtos licenciados na nova gestão?
IH: Ainda não, porque não temos os contratos existentes, então fica difícil dizer que vai ser dessa forma ou daquela. Posso adiantar que haverá gerenciamento de produtos nessa parte, que iremos trabalhar isso de uma forma responsável.
ME: Quanto o título pode acrescentar em termos de faturamento para o Fluminense?
IH: Não tenho esses dados. As informações que tenho sobre o faturamento, algo que escuto falar, porque não vi o balanço, indicam que é algo ridículo. O potencial é enorme, apesar de não dar pra quantificar, mas a tendência é melhorar muito. Melhorar a distribuição de produtos, o desenvolvimento, porque não basta colocar camisa com a cara do Fred à venda. Onde irá vender? Para qual público? Ela terá uma boa qualidade? De que tipo? Será direcionada para crianças? Mulheres? Qual grade? Essa é a diferenciação que queremos dar.
ME: Existe algum plano pronto para alterar o modelo de gestão do contrato com a Unimed?
IH: Essa é uma coisa mais ligada ao futebol. Quando estreitarmos relacionamento com o marketing da Unimed, iremos conversar sobre coisas que vão beneficiar a própria Unimed, com a nossa visão de mercado. A gente pode agregar à Unimed. Podemos agregar mais do que simplesmente exposição de marca. A Unimed já consegue excelente exposição, um recall lá em cima, então eles têm resultado, mas não dá para inferir se é o patrocínio ou não. Queremos, a quatro mãos, ajudar o patrocínio a trazer mais receita para a Unimed, e pegar carona nisso. Não dá para dizer se terá ingerência de um jeito ou de outro.
ME: Ao contrário de outros clubes brasileiros, que aumentaram recentemente a quantidade de marcas expostas no uniforme, o Fluminense tem só a Unimed. Esse modelo irá continuar?
IH: O contrato, pelo o que sei, só dá direito à Unimed. Teríamos que negociar com ela algo nesse sentido, mas hoje o que recebemos da Unimed é um valor que, talvez, mesmo com uma marca só, é muito maior do que vários clubes recebem fazendo da camisa um macacão de Fórmula 1. Não é algo que temos em mente, nesse momento. Até porque entre o pessoal que entrou, uma das coisas que me fez aceitar o cargo foi trabalhar com pessoas sérias, que cumprem contratos.
ME: Flamengo e Vasco anunciaram recentemente planos para fomentar outras modalidades esportivas. A nova diretoria tem algum plano nesse sentido? Como o marketing participaria?
IH: Com certeza, é um ponto que iremos trabalhar. A extensão da marca Fluminense. Essa é uma forma de pegar outro público e fazê-lo simpatizar com a marca. Acredito muito nos esportes olímpicos como ferramenta de marketing, porque muitas mulheres não gostam de futebol, mas isso não quer dizer que não possam torcer para os times de vôlei, basquete e outras modalidades. É uma maneira de pegar outro público para que tenha simpatia pelo Fluminense, e, claro, isso ajuda a vender mais produtos com a marca.
ME: Quando o Muricy estava no São Paulo, chegou a ser usado como personagem de produtos licenciados. Vocês pretendem aproveitar a imagem dele também?
IH: O Muricy é uma marca fortíssima, mas queremos fazer algo estudado. Não queremos fazer simplesmente porque o Muricy é moda. Um grande diferencial que queremos implantar é ter uma área de inteligência de marketing, para definir quem é o cliente, por que ele escolheu o Fluminense, quais os atributos que ele valoriza. Não iremos esperar isso estar pronto para fazer iniciativas, mas vamos fazer as coisas com planejamento, em função disso. Hoje, nenhum clube está posicionado junto a um público, a não ser que tenha alguma relação de etnia, como com portugueses ou italianos. Então temos que posicionar nosso clube, saber por que torce para o Fluminense, quais atributos ele mais gosta, como ele se sente, qual a percepção que ele tem sobre o clube, e, baseado nisso e nas pesquisas, vamos utilizar os produtos que temos, Fred, Conca, Muricy, para fazer algo para ele.
ME: Quanto tempo isso demoraria para ficar pronto?
IH: Demora muito tempo para ficar pronto, então precisamos de parceiros para entender isso. O mais difícil nessa pesquisa é encontrar parceiros que queiram ajudar nessa pesquisa, que entendam que a pesquisa é boa para todo mundo. Digamos que a gente pegue um instituto que queira fazer esse estudo, que tenhamos um preço subsidiado, em função de que ele pode fazer muitos trabalhos com os dados coletados. Eu queria ter todas as pesquisas estendidas a todos os clubes, e não só restritas ao Fluminense, para entender a concorrência. A demora seria encontrar um parceiro. Se não me falha a memória, a Nielsen era parceira da Internazionale. Não sei se ainda é, porque teve corte no número de parceiros, mas isso indica que há essa possibilidade. Além do que, à medida que conseguimos implantar esse programa, vou fazer um CRM [Customer Relationship Management] dos torcedores, ter cadastro, para fazer ofertas com direção mais certeira.
ME: Insisto no assunto porque é difícil saber se essa pesquisa estará pronta em janeiro, fevereiro ou depois. Como vocês pretendem fazê-la? Gradualmente ou de uma vez só?
IH: Tem de ser gradual, porque os recursos em termos de pessoal não são grandes, e é um clube que tem uma dívida enorme. Precisamos de orçamento, recursos para isso, então não acredito que dê para fazer a pesquisa hoje, até porque não é prioridade na atual situação macro do Fluminense. Hoje, no que tange o marketing, a venda de ingressos é a prioridade zero.
ME: Quais são os focos da nova diretoria para aumentar o faturamento do Fluminense nos próximos anos?
IH: Ingressos, patrocinadores, que não precisam ser necessariamente para o futebol, negociação de direitos de mídia, seja televisão, internet, mobile, ou qualquer outra forma que aumente nossas receitas. Indiretamente, ainda dá para citar o aumento do valor patrimonial da marca, que também gera mais receitas.
ME: Como será a parceria com a Traffic? Qual será exatamente o papel dela no Fluminense?
IH: A Traffic terá função, basicamente, operacional do marketing do Fluminense. A vice-presidência terá função estratégica, e a Traffic irá ajudar operacionalmente, com sócio-torcedor, ingressos, entre outros. Os caras são bons nisso. Eles têm uma empresa com experiência enorme nisso, relativa a torcedor, eventual construção de arena, ou até negociação de direitos do Maracanã. São os caras que têm expertise para isso. O lado estratégico fica com o Fluminense, e a Traffic tem função operacional.
ME: Dá para listar quais serão as prioridades da Traffic? A principal é a construção de estádio?
IH: A construção do estádio eu acho mais difícil, porque a construção da arena é um assunto que ainda não está adiantado, mas há essa possibilidade. O sócio-torcedor é uma realidade que vamos fazer com eles, isso é certo, e vamos avaliar outras possibilidades, como construção de centro de treinamento e comercialização de direitos.
ME: A parceria com a Traffic já está valendo? Se não, quando ela começa a funcionar?
IH: Apesar de não ter sido assinada por nossa gestão, já foi assinada e, se não me falha a memória, já começa a valer a partir de janeiro. Mas, é claro, já estamos trabalhando juntos para adiantar alguns assuntos.