Menos de 7 km separam o bairro Cidade de Deus, bairro onde nasceu Rafaela Silva, do Parque Olímpico, onde conquistou o primeiro ouro do judô brasileiro nos Jogos do Rio 2016. A distância entre as duas realidades vividas pela brasileira, porém, é muito maior.
“É muito bom para as crianças que estão assistindo o judô. Pude mostrar, com esse resultado, que uma criança que saiu da Cidade de Deus aos cinco anos, que lutou judô por brincadeira, se tornou campeã mundial e campeã olímpica. É inacreditável. Quero mostrar que, se elas têm um sonho, elas podem realizá-lo”, afirmou a brasileira.
Rafaela subiu no dojô pressionada pela má campanha até então da equipe brasileira na competição. No sábado, primeiro dia de competições, foram eliminados Sarah Menezes, ouro em Londres 2012, e Felipe Kitadai, bronze na última Olimpíada. No domingo, foi a vez da eliminação precoce de Charles Chibana e da frustração de Erika Miranda, derrotada na disputa pela medalha de bronze.
Nesta segunda-feira (dia 8), Alex Pombo foi eliminado logo na estreia da categoria até 73 kg pelo chinês Saiyinjirigala por yuko, a pontuação mínima do judô. Coube a Rafaela, finalmente, redimir o esporte que é a grande aposta do COB (Comitê Olímpico do Brasil) e do Ministério do Esporte para colocar o país no top ten do quadro geral de medalhas da Olimpíada.
Em sua primeira luta, porém, Rafaela mostrou bastante agressividade para derrotar a alemã Miryam Roper por ippon com apenas 46 segundos de luta. No segundo combate, teve mais dificuldade, mas bateu a sul-coreana Kim Jan-di por wazari.
Nas quartas de final, a brasileira superou seus fantasmas pessoais contra a húngara Hedvig Karakas, medalhista de bronze no Mundial de 2009. Em Londres 2012, contra a mesma adversária, Rafaela foi eliminada após tentar um golpe ilegal. A brasileira acabou sendo bombardeada por insultos racistas nas redes sociais.
“Depois da minha derrota em Londres eu ia largar o judô. Mas comecei a fazer um trabalho psicológico. Voltei. Não tive grandes resultados em 2014 e 2015. Perdi para algumas adversárias para quem nunca tinha perdido antes. Falavam que eu era uma incógnita”, lembrou a campeã.
Na semifinal, a judoca teve outra forte adversária, a romena Corina Caprioriu, vice-campeã mundial em Astana, no ano passado. Sem nenhuma judoca conseguindo pontuar, a luta foi para o golden score, quando a brasileira derrotou a rival por um wazari.
Na decisão, um bom sinal: a japonesa Kaori Matsumoto, campeã olímpica em Londres 2012, foi derrotada logo aos 24 segundos de luta pela mongol Sumiya Dorjsuren por ippon.
“Foi uma luta muito travada. Mas quando ela passou a romena e vimos a mongol ganhando, ficamos confiantes. Sabemos que tinha uma chance muito grande da medalha de ouro e foi o que aconteceu”, analisou o técnico Mario Tsutsui.
A decisão foi bastante equilibrada, mas a brasileira conseguiu encaixar um contragolpe com 1min 06s de luta. Após deliberação dos árbitros, foi confirmado um wazari. A partir daí, mesmo a maior agressividade de Dorjsuren não foi suficiente para tirar o ouro de Rafaela.
“A torcida me ajudou bastante, o ginásio chegava a tremer. Eu não podia decepcionar todas essas pessoas que torceram por mim”, agradeceu a judoca.