É difícil mensurar hoje o peso da vitória de Jesse Owens na Alemanha de Hitler. O alcance das imagens era outro, e o racismo era uma questão aberta oficialmente no país. Por isso, não é exagero dizer que o ouro olímpico de Rafaela Silva pode ter um peso transformador maior no Brasil do que a antológica cena de 1936.
O principal ponto é a importância da representatividade da atleta. Silva é um conjunto de minoria: negra, pobre e gay. Fatores que serviram de obstáculos na vida, mas que nunca tiraram dela o lugar de campeã, vencedora, ouro olímpico.
Rafaela Silva será um enorme exemplo para todos aqueles que passam a vida inteira à margem de uma sociedade desigual. O topo é possível, e as diferenças entre as pessoas se limitam ao âmbito econômico. O ouro foi sim de todos na Cidade de Deus, e também de todos os outros no Brasil que vivem na periferia do dinheiro.
Na cidade em que há poucos meses pessoas das zonas mais pobres sofreram revista para chegar às praias da zona sul carioca, a celebração de uma atleta crescido na Cidade de Deus é uma agressão salutar naqueles que insistem em não perceber que as discrepâncias sociais formam o grande desafio deste país e que a sua diminuição deve ser, sempre, a principal prioridade de qualquer política pública.
E vai além: Rafaela é gay, em Jogos que já teve pedido de casamento homossexual e a presença de uma transexual na cerimônia de abertura. Esse tem tudo para ser a Olimpíada mais amigável ao público LGBT da História.
A realização dos Jogos em si não fez nada pelo tal do “mundo novo” estampado nas publicidades do Rio. Ainda bem que Olimpíada produz imagens muito mais poderosas do que políticos.