O fechamento da janela de transferências do futebol brasileiro foi amplamente acompanhado pelo público no início deste mês de setembro. Diante de um mercado de transferências aquecido, a proximidade de uma data-limite para que os clubes brasileiros reforçassem seus elencos para o fim da temporada naturalmente gerou ansiedade e expectativa nos torcedores.
Por outro lado, lesões sofridas por atletas de diversos clubes também suscitaram debates sobre a possibilidade de novas contratações mesmo após o encerramento da janela. Afinal, isso seria possível?
Antes de chegar à resposta para a pergunta acima, vale dar um passo atrás e explicar o conceito de “janela de transferências”: trata-se do período no qual um clube de futebol pode registrar novos atletas. A existência dessas “janelas” há muito decorre do Regulamento Fifa sobre o Status e a Transferência de Jogadores (conhecido como “Fifa RSTP”, em função da sigla do original em inglês), aplicável a transferências internacionais. Nos últimos anos, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) também incorporou esse conceito a algumas transferências nacionais, por meio do seu Regulamento Nacional de Registro e Transferência de Atletas de Futebol (RNRTAF).
O Fifa RSTP estabelece que “jogadores somente podem ser registrados durante um dos dois períodos de transferências no ano fixados pela respectiva federação nacional”. Ali se define, portanto, que cada país deve ter exatamente duas janelas de transferência ao longo do ano; nem mais, nem menos.
Em se tratando de transferências internacionais, deve ser observado o período de registro vigente no país do clube que contratar o jogador (a janela definida no país do clube cedente é irrelevante). Assim, um clube brasileiro que pretenda se reforçar com um atleta que estava vinculado a um clube estrangeiro deve, a princípio, registrá-lo dentro de uma das janelas de transferências determinadas pela CBF (independentemente da nacionalidade do jogador).
No âmbito das transferências nacionais, o estabelecimento das janelas de transferências é mais recente e não se aplica a todos os clubes. Segundo a edição 2024 do RNRTAF, a limitação dos períodos de registro diz respeito tão somente a transferências para clubes participantes das Séries A e B do Campeonato Brasileiro. Portanto, todos os demais clubes ficam dispensados dessa restrição; por outro lado, isso não os isenta do cumprimento de outras possíveis condições que lhes sejam aplicáveis (por exemplo, eventuais prazos-limite para inscrição de atletas que estejam definidos nos regulamentos das competições que disputem).
Estabelecidas as linhas gerais do conceito, voltamos ao questionamento inicial: é possível a contratação de jogadores após o encerramento da janela de transferências? A resposta é positiva, pois a regra tem suas exceções.
A primeira delas diz respeito ao jogador que tenha tido seu vínculo com o clube anterior encerrado antes do término da janela de transferências, pelo fim da vigência do contrato ou por meio de uma rescisão por comum acordo. O atleta que se encontrar nessa situação pode ser registrado pelo novo clube mesmo após o fim da respectiva janela de transferências.
A segunda exceção se refere ao jogador que tenha rescindido seu contrato anterior unilateralmente por culpa do clube, em especial diante da existência de débitos em relação a salários por meses sucessivos. Também nessa hipótese o atleta se encontra apto a ser registrado por um novo clube fora de uma janela de transferências. O mesmo vale para jogadores que tenham tido seus contratos rescindidos pelo antigo clube de forma unilateral e sem justa causa, à luz do Fifa RSTP.
Além dessas duas exceções gerais, identificam-se outras de natureza específica. Em âmbito exclusivamente nacional e com relação apenas à janela do início do ano, a CBF excepciona casos específicos de jogadores participantes de campeonatos estaduais. Internacionalmente, a Fifa estipula exceções especiais para o futebol feminino: se uma jogadora entra em licença-maternidade, o clube é autorizado a registrar uma nova atleta para substituí-la a qualquer tempo; além disso, a atleta que retorna de licença-maternidade também pode ser registrada de imediato, mesmo que fora de uma janela de transferências.
Enfim, nota-se que, por intermédio de tais exceções, Fifa e CBF estabelecem soluções excepcionais para circunstâncias específicas, sempre visando à proteção de jogadores e jogadoras. Em meio a elas, surge a oportunidade (bastante restrita, de fato) de que clubes se reforcem mesmo após o fim da janela de transferências. Portanto, ainda pode restar alguma esperança aos torcedores: mesmo com a janela fechada, reforços ainda podem chegar.
Pedro Mendonça é advogado especializado na área esportiva desde 2010, com vasta experiência na assessoria a diversas entidades esportivas, como comitês, confederações e clubes, além de atletas, e escreve mensalmente na Máquina do Esporte