A polêmica parceria entre o Corinthians e o fundo de investimentos MSI completou dois anos no último mês de novembro. Em todo esse tempo, o contrato assinado em 2004 teve um grande opositor: Antônio Roque Citadini, ex-vice-presidente do clube.
Afastado do departamento de futebol corintiano desde que o acordo foi firmado, Citadini sempre foi intransigente quando indagado sobre os efeitos que o contrato poderia trazer ao Corinthians e sobre suas desconfianças relativas ao comportamento dos investidores. O acordo, incialmente, tem 10 anos de vigência. Citadini espera que o negócio seja desfeito brevemente.
“Na minha opinião, ao Corinthians interessaria encerrar essa parceria. Ela é traumática, muito ruim para o clube”, afirma em entrevista exclusiva à Máquina do Esporte.
“O Corinthians se amadorizou, se desprofissionalizou, estabeleceu-se o caos, uma bagunça, uma anarquia completa”, completa Citadini, conselheiro vitalício do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, onde atua desde 1988.
Recentemente, Citadini foi apontado como um dos prováveis candidatos à sucessão de Alberto Dualib, mas negou qualquer articulação para chegar à presidência do Corinthians.
“Isso é papo que o MSI fica divulgando, ficam falando que essa história de eu ser contra a parceria seria um jogo de cena. Eles têm horror de mim da mesma forma que eu tenho horror deles”, disse.
Procurado pela reportagem, o MSI, por intermédio de sua assessoria de imprensa, disse não se envolver nas questões políticas do clube e se negou a falar sobre a declaração do dirigente.
Antônio Roque Citadini fala ainda sobre os problemas da parceria corintiana e avalia o futuro do clube sem o investidor.
Leia a seguir a íntegra da entrevista:
Máquina do Esporte: Flávio Adauto [vice-presidente de comunicação corintiano] disse que Renato Duprat está em Londres para solucionar, definitavamente, os problemas da parceria, e que o clube deve divulgar uma nota oficial dentro de 15 dias. Nesse comunicado pode estar a notícia do final da relação entre Corinthians e MSI?
Antônio Roque Citadini: Realisticamente a parceria está travada. Ela nem avança, nem está cumprindo os objetivos da parceria. Não define nada, não contrata jogadores. Ela está em ponto morto. O que vai acontecer nos próximos meses eu não acho que depende somente do Renato Duprat, depende da avaliação feita pelo MSI sobre continuar ou não com o Corinthians. Na minha opinião, ao Corinthians sim interessaria encerrar essa parceria. Ela é traumática, muito ruim para o clube. Essa é a minha opinião. Está tudo travado e o melhor caminho é acabar com tudo e recomeçar.
ME: Para o senhor quais foram as principais falhas no contrato assinado entre as duas entidades?
ARC: Existe uma grande falha. É um contrato que dá muito poder a uma empresa que não tem nenhuma experiência no futebol e é uma entidade complicada. É esse o problema.
ME: O senhor acha que o Corinthians será condenado a pagar as multas e dívidas resultantes dos contratos assinados durante a parceria?
ARC: Não existe multa nenhuma. Te digo o porquê: nenhum dos dois lados cumpriu o contrato direito. O MSI teria que apresentar uma fiança bancária e nunca apresentou. Nem ele cumpriu, nem o Corinthians cumpriu.
ME: Nesses dois anos de relação, o Corinthians teve algum benefício?
ARC: É claro que é preciso fazer um balanço, ver quais foram as coisas positivas. O Tevez como jogador, por exemplo, o título do Brasileiro em 2005. A questão é que o lado negativo foi maior. Primeiro porque o Corinthians se amadorizou, se desprofissionalizou, estabeleceu-se o caos, uma bagunça, uma anarquia completa. Para você ter uma idéia, nós temos um técnico a cada três meses, isso é coisa de time pequeno, time de bairro, não para o Corinthians. Outro detalhe: perdemos como poucas vezes perdemos, nunca ficamos tantas semanas na zona de rebaixamento de um campeonato como agora. Perdemos competições simples como a Copa do Brasil. Futebolisticamente é uma parceria ruim. Mas o pior da parceria é que ela gera muita notícia negativa contra o Corinthians. Todos os dias você lê os sites, vê os jornais e há uma notícia ruim. No “The Guardian”, nos jornais da Europa você vê notícias ruins sobre o Corinthians, más referências. São nossos investidores sendo investigados, nossos investidores fugindo, prisão decretada daqui, de lá. Onde sai notícia ruim sobre o MSI sai o nome do Corinthians também. Há um volume de notícias negativas como nós nunca tivemos.
ME: Quais serão as conseqüências a curto e médio prazo caso o rompimento do contrato seja formalizado?
ARC: O fim da parceria será difícil, mas é melhor que seja assim. O problema é que nós vamos ter uma herança e ainda não sabemos qual será. Nos envolvemos com pessoas complicadas, negócios complicados. Compra de jogador na Argentina, em Portugal e não se sabe exatamente quais serão os desdobramentos na área do Banco Central ou na área tributária, por exemplo. Mas é melhor estancar agora do que adiante, quando os problemas estiverem maiores. Não podemos esquecer também que existem duas ações na Fifa contra o Corinthians: uma do Passarela e a outra do Lyon, referente à contratação do Nilmar.
ME: O senhor acredita que o Corinthians vá receber os 20 milhões prometidos pelo MSI?
ARC: Eles freqüentemente falam em fazer pagamentos e depois demoram. Eu não sei. Pode ser que sim e pode ser que não.
ME: Depois de Excel, HMTF e MSI, o Corinthians ainda acredita que as parcerias são a solução para o departamento de futebol?
ARC: O Banco Excel faliu. Já a parceria com a Hicks foi muito boa, estava caminhando bem até que a direção da empresa resolveu sair da América Latina, não teve nada a ver com o Corinthians. Eles tiveram um prejuízo monstruoso na Argentina com a mudança do valor do dólar em relação ao peso, perderam US$ 1,5 milhão, foi uma loucura. Além disso, eles se envolveram naquela PSN, que era um canal de esportes para a América Latina. Quando eles resolveram acabar com tudo isso, decidiram sair do continente. São coisas diferentes, não dá para comparar. A parceria com a Hicks foi muito boa, enquanto a relação com o MSI foi uma tragédia. Parceria pode sim ser muito positiva, mas o primeiro item a ser observado é a confiabilidade do parceiro, saber se é realmente confiável. Nosso problema com o MSI é que a empresa é uma ficção, ela não existe, nunca fez negócios. Não comprou padaria, não comprou carro, nada. Ela começou com o Corinthians. Com esse tipo de parceiro não dá para fazer negócio.
ME: O senhor será candidato à presidência do Corinthians?
ARC: Não. O que existe é o seguinte: saiu uma matéria na Folha falando sobre uma conspiração a favor da minha candidatura e essa matéria tem três pontos falhos. Primeiro porque isso é papo que o MSI fica divulgando, ficam falando que essa história de eu ser contra a parceria seria um jogo de cena. Eles têm horror de mim da mesma forma que eu tenho horror deles. O segundo ponto é que alguns dizem que o Dualib tem pesadelos quando ouve o meu nome, eles querem defender a “boquinha” deles, um carguinho, mas tem horror ao meu nome. E tem o pessoal dessa tal oposição aí que também tem pesadelo quando falam no meu nome. Então veja só, essa matéria tem esse sentido. Juntou as pessoas do Corinthians que temem que o futuro seja um futuro de mudança, porque no fundo eles não querem mudar, querem continuar como está. Mas não existe nada disso, eles podem ter menos pesadelos.
ME: A “Folha de S. Paulo” divulgou nas últimas semanas que o senhor se aliou ao presidente Alberto Dualib. A notícia confere?
ARC: Eu não fui ouvido nessa matéria. A matéria tem três lados: MSI, que é um fantasma que fica falando para a imprensa, ninguém sabe quem é que está falando na realidade; alguns diretores do Dualib que têm muito medo de mim e algumas pessoas ligadas à oposição que também têm pavor ao meu respeito. E eu não fui procurado. Fizeram lá uma articulação, um negócio todo sem me ouvir.
ME: O que se diz é que existe um consenso para esfriar os ânimos do MSI até que o Corinthians receba os 20 milhões.
ARC: Eu não. Não faço parte disso. Eu continuo falando contra o MSI.
ME: O que há de verdade sobre o adiantamento pedido pelo Corinthians à FPF para saldar dívidas?
ARC: Não posso falar sobre esse assunto porque o desconheço. Não sei nada sobre isso.