No final de dezembro, enquanto o Corinthians comemorava a conquista do Campeonato Brasileiro, e a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) a consolidação do formato da competição por pontos corridos, a cúpula da Globosat contabilizava, pela primeira vez em quatro anos, um resultado de venda dos pacotes de pay-per-view abaixo do esperado.
Dos 380 mil pacotes de jogos inicialmente previstos para serem comercializados, a empresa conseguiu realizar a negociação de 368 mil. O motivo para a queda, segundo explica Elton Simões, diretor dos canais Premium da Globosat, foi o escândalo de manipulação de jogos envolvendo o árbitro Edílson Pereira de Carvalho.
“Por duas ou três semanas as pessoas pararam de assinar [os pacotes]. A compra do pay-per-view é por impulso. E durante três semanas o torcedor ficou sem saber o que ia acontecer com o campeonato”, afirma Simões em entrevista exclusiva à Máquina do Esporte.
Em conseqüência dessa queda na receita da venda de pacotes, a partir de 2006 a Globosat decidiu adotar a estratégia de não revelar mais os números de previsão de venda de pacotes de PPV ligado ao futebol. Além disso, a empresa reformulou o formato dos pacotes, envolvendo também os campeonatos estaduais e o parcelamento por igual no ano todo.
Leia a seguir a íntegra da entrevista com Elton Simões:
Máquina do Esporte: Por que foi feita a alteração na forma de venda dos pacotes do pay-per-view neste ano?
Elton Simões: É muito simples. Como muitos mortais, nosso assinante tem um salário mensal. Ele tem que pagar as contas mensalmente. A segunda premissa é que você quer que o assinante tenha acesso ao futebol o ano inteiro. Antes ele comprava o Campeonato Brasileiro e tinha acesso a descontos dos outros campeonatos. A opção que ele tinha era de comprar o estadual e depois ligar o Brasileiro, em que ele não teria desconto. Ou, então comprar os dois juntos, em que ele teria desconto, mas pagaria um pouco a mais até o final do Estadual e o restante em parcelas menores. Agora a gente pode garantir para quem quer comprar um desconto. No final, são três benefícios que o torcedor tem. O primeiro é financeiro, já que ele tem um desconto significativo. O segundo é a conveniência. Uma ligação feita e ele já compra o futebol o ano todo. Aliás, compra até 2008 se quiser. E o terceiro é o fluxo de caixa do assinante, pois ele não precisa ter variação no valor das mensalidades. Para nós, esse modelo tem dois pontos positivos. Nós queremos primeiro premiar os assinantes que consomem mais futebol. E, segundo, aumentar o número de pessoas que tenham acesso ao futebol. Além disso vamos dar continuidade ao produto, não mais oferecer campeonatos separados
ME: Qual a expectativa com essa mudança?
ES: Não posso dar números absolutos. Mas posso dizer que hojenosso total de pacotes vendidos do estadual é maior do que o total do ano passado e ainda tenho 70 dias de campeonato para vender.
ME: Nos últimos três anos, a venda de PPV atingiu números expressivos no Brasil. Por acaso já atingimos o limite da venda de pacotes?
ES: Não. Na verdade está longe ainda. Tem dois aspectos que têm de se olhar. O primeiro é o crescimento da indústria de TV por assinatura no Brasil. Em 2005 cresceu em 12% o número de assinantes. Aumenta a base, aumenta o nosso potencial de vendas. Mas ainda não está perto do teto, que é o número total de assinantes. Primeiro, nós temos de fazer um bom trabalho na Série A. Com ela estável tudo funciona. O segundo aspecto é que a gente passou a cobrir os estaduais. Este ano estamos consolidando os estaduais, mas é um processo que vai até 2007. Ainda este ano também vamos passar para a consolidação definitiva da Série B, para conseguir mais estabilidade. São mais uns 24 meses. Além disso, pelo menos temos mais uns três ou quatro anos do estadual. A Série A também vai crescer, mas esse crescimento está ligado à base de assinantes.
ME: A presença de 20 clubes na Série A do Campeonato Brasileiro vai ter um impacto na venda de pacotes, já que teremos menos jogos no total?
ES: Para a gente não tem grande impacto. A gente aprendeu que o importante é a qualidade dos jogos, depois a extensão e a qualidade da cobertura. A Série A em 2005 cobriu 100% dos jogos. A Série B este ano terá um aumento dos jogos cobertos. Os estaduais devem aumentar a cobertura. O número total de jogos não costuma ter impacto. Nossa função não é reclamar sobre isso, mas trabalhar a venda.
ME: Em 2004, diversos clubes fizeram pressão e reivindicaram a venda dos pacotes individuais, feitos pelos times mandantes. É possível esse tipo de venda segmentada ser colocada em prática?
ES: Bom, eu não fui pressionado. Em primeiro lugar, não existiu essa pressão. Os clubes sempre apoiaram o que a gente fez. Não temos queixa em relação a qualquer coisa. Essa discussão aconteceu, na minha área, em 2002. A gente chegou a colocar o empacotamento dos jogos à venda. Foi um fracasso. Tivemos apenas 500 assinaturas [de jogos individuais, em que o torcedor comprava a partida]. É fácil olhar para trás e isso [a venda segmentada] faz sentido. Mas na hora não faz. O assinante quer acompanhar o campeonato, e o clube dele dentro do campeonato. Fazendo uma analogia, se o clube do assinante é o principal ator, o campeonato é o cenário, a história, tudo o resto. É como se você for ver o filme porque tem o ator principal. Mas não é verdade que, se for arrancado todo o resto, você vai ainda querer ver o filme.
ME: Em 2005, a venda dos pacotes de PPV do Campeonato Brasileiro da Série A não conseguiu atingir a previsão feita inicialmente. Qual o motivo para isso? O escândalo de manipulação de jogos do campeonato pode ser apontado como um dos motivos?
ES: A gente teve de fato o problema da arbitragem. Por duas ou três semanas as pessoas pararam de assinar os pacotes. A diferença da previsão para o resultado ficou em 12 mil assinantes, que é menos de 5% do total. O que acontece é que a compra de pay-per-view é por impulso. Quando esse impulso passa, é difícil fazer o torcedor comprar. No ano passado o campeonato vinha naquela direção, estava emocionante. Aí mudou a tabela toda. As pessoas demoraram para entender o que ia acontecer. Essas vendas foram a distância da previsão para o realizado.
ME: A solução para este ano, então, é torcer para que não tenhamos mais nenhum tipo de imprevisto, de rolo, no campeonato?
ES: Rolo é sempre ruim. O que as pessoas não percebem é que a Série A do Brasileiro custa 510 reais. Com esse preço você pode comprar dois aparelhos de DVD, ou um aparelho de som novo. Mas você chega na loja e pergunta qual é a garantia, o vendedor não sabe dizer e vai perguntar ao gerente. Enquanto o cara não te der a resposta, você não compra. Naquelas duas semanas em que o assinante não sabia qual seria o destino do campeonato, ele também não comprou…