Em menos de um mês, entre dezembro do ano passado e janeiro de 2010, a Nike anunciou acordos para patrocinar as confederações brasileiras de atletismo e basquete. Os dois contratos foram assinados até 2016, ano em que o Rio de Janeiro vai sediar os Jogos Olímpicos, e reforçam a importância que o mercado nacional tem para a companhia, patrocinadora da seleção brasileira de futebol. No entanto, o cenário não é apenas promissor. O basquete é uma das modalidades mais importantes dos Jogos Olímpicos, mas o time masculino não conseguiu classificação para as últimas três edições do torneio. O atletismo é um esporte nobre, mas o Brasil esteve envolvido no ano passado com um escândalo de doping que afastou vários atletas e findou o investimento do Grupo Rede na elite. E os atletas, outro grande foco da Nike, são uma seara totalmente instável, como bem mostra o recente caso do golfista norte-americano Tiger Woods. É esse panorama que o diretor de sports marketing da Nike, Luis Alexandre Pontes Rodrigues, analisou em entrevista exclusiva à Máquina do Esporte. ex-jogador de vôlei, o executivo soma oito anos de trabalho na companhia norte-americana e também já teve passagens por Cruzeiro, Atlético-MG, Koch Tavares e pela Fifa. Pontes Rodrigues fez uma análise sobre as novas investidas da Nike e o desafio da companhia para a próxima década no mercado brasileiro. E de certa forma, esquadrinhou questões pertinentes a outras empresas no marketing nacional. ?Sempre buscamos a liderança. Isso é da companhia. Sempre fomos muito arrojados, inovadores, e o que vai acontecer daqui para frente precisa ser muito bem analisado. Os contratos que estavam disponíveis, que eram atletismo e basquete, nós trabalhamos. Acreditamos muito na ética do esporte e não temos costume de invadir contratos que estejam vigentes. O que vai acontecer nos próximos anos é uma análise da área, como sempre fazemos, para que tomemos as melhores decisões e que todo mundo saia ganhando?, avisou o executivo. Confira a seguir a íntegra da entrevista:Máquina do Esporte: O que levou a Nike a investir no basquete brasileiro? Luis Alexandre Pontes Rodrigues: Nós nascemos no atletismo. Nosso segundo esporte foi o basquete. Faz todo sentido você, dentro de uma oportunidade, promover um trabalho com a CBB. A entidade está em um momento novo e abriu uma oportunidade que não havia acontecido anteriormente. Por isso, nós resolvemos trabalhar. Somos especialistas e achamos que valia a pena. ME: A seleção brasileira masculina não conseguiu vaga nas últimas três Olimpíadas. O time feminino esteve em Pequim, mas foi eliminado na primeira fase. Mesmo com a falta de resultados expressivos recentes, o basquete é um bom produto? LAPR: Na verdade, o que a gente coloca é que isso é uma parceria. E uma parceria tem de ter fundamento em várias coisas. O resultado sempre é importante, mas a gente precisa estar junto do patrocinado. Se você olhar para trás, vai ver que é isso que a gente vem fazendo ao longo dos anos, inclusive nos contratos com atletas: são apostas feitas na juventude, que os acompanham durante longos períodos. A companhia não chegou onde chegou apostando em coisas que achava que não dariam certo, e isso vale para o basquete. A gente acredita, confia, aposta. Não é simplesmente fornecimento de material esportivo. É uma participação direta, até por perfil da companhia, que é uma empresa de atletas, feita por atletas. Não só as confederações, mas eles também são importantes. ME: E de quais formas vocês pretendem usar, portanto, os atletas patrocinados pela empresa que fazem parte das seleções brasileiras de basquete? LAPR: Nós ainda não temos isso definido, até porque é uma coisa que se constrói a quatro mãos. Vamos definir internamente no departamento de marketing, com o qual nós dividimos todas as ideias. Não creio que esse seja o momento para estarmos com tudo pronto. Estamos no princípio de uma gestação e precisaremos de um tempinho para que isso seja colocado da melhor maneira possível e atenda os anseios da companhia, da confederação e dos atletas. ME: A falta de resultados expressivos pode não ter sido um peso na negociação com o basquete, mas o atletismo tem uma situação ainda mais conturbada. Meses antes de fechar com vocês, a modalidade deflagrou um dos maiores escândalos da história no país, o doping em massa que acabou com a equipe de elite do grupo Rede. Vocês ponderaram isso antes de apostar na confederação? LAPR: Questões internas das confederações são questões internas das confederações. Nós achamos que o escândalo pode ser maléfico por um lado, mas tem outro ângulo: isso mostra que a confederação está trabalhando, e quem sai no prejuízo é quem se envolve com esse tipo de coisa. Isso não contou na nossa escolha porque confiamos no poder do trabalho e não nos metemos em questões internas. ME: Ainda assim, escândalos têm sido parte da rotina da Nike nos últimos anos, sobretudo por casos envolvendo atletas patrocinados pela companhia ? o mais recente foi o golfista Tiger Woods, pivô de uma polêmica sobre casos extraconjugais, que chegou a abandonar o circuito em função disso. Que tipo de trabalho vocês fazem para combater esse tipo de crise e por que a empresa sempre se mantém ao lado dos atletas? LAPR: A melhor resposta para essa pergunta é a história de um atleta: Lance Armstrong. Quando ele teve câncer, todos os patrocinadores se distanciaram e nós ficamos. É o que eu falei de aposta: é um trabalho de longo prazo, no qual ninguém quer fazer nada que não seja em prol do atleta. Nós sabemos que esse segmento é como uma montanha-russa, mas brincamos sempre que estamos abraçados. ME: Isso quer dizer que a empresa seguirá patrocinando Tiger Woods até mesmo se ele abandonar definitivamente o circuito? LAPR: Essa é uma questão em que eu não posso me envolver. É algo que está dentro da estratégia global da área de golfe, que não passa por aqui. ME: O Brasil, que já havia sido escolhido para sediar a Copa do Mundo de 2014, foi escolhido no ano passado para receber as Olimpíadas de 2016. Meses depois, a Nike acertou com as confederações nacionais de atletismo e basquete. Qual é o planejamento da companhia para aproveitar o foco sobre o país nos próximos anos? LAPR: A estratégia da Nike para 2016 é a mesma que a Nike teve em 2008, em 2004 ou em 2000; É estar presente, da melhor maneira possível, com o melhor trabalho possível. ME: E como vocês farão para ganhar mercado e conseguir esse posicionamento até 2016? LAPR: Sempre buscamos a liderança. Isso é da companhia. Sempre fomos muito arrojados, inovadores, e o que vai acontecer daqui para frente precisa ser muito bem analisado. Os contratos que estavam disponíveis, que eram atletismo e basquete, nós trabalhamos. Acreditamos muito na ética do esporte e não temos costume de invadir contratos que estejam vigentes. O que vai acontecer nos próximos anos é uma análise da área, como sempre fazemos, para que tomemos as melhores decisões e que todo mundo saia ganhando. ME: Por falar em contratos disponíveis, o do Comitê Olímpico Brasileiro com a Olympikus dura até o final deste ano. Vocês têm intenção de brigar por esse acordo depois? LAPR: A realidade é que o COB tem um contrato vigente com outra marca esportiva. Se eles abrirem a opção para uma conversa quando o atual contrato acabar, nós vamos analisar. E se definirmos internamente que é a coisa correta a ser feita, vamos falar com eles. Tudo que permitir um debate e uma conversa com todos, para nós é saudável. ME: No ano passado, a Nike foi substituída pela Olympikus no Flamengo. A empresa pretende investir em outra equipe do futebol nacional para compensar essa perda? LAPR: O que nós imaginamos para o futebol aqui dentro, neste momento, é que temos muitas chances de ganhar vários títulos com o Corinthians em 2010. E logicamente, como foi no passado, estaremos presentes em busca da sexta estrela para a seleção brasileira. Trabalhamos em busca desse tipo de coisa, e outros investimentos agora não são prioritários. Temos o centenário do Corinthians, a Libertadores, o Brasileiro, a seleção se preparando para a Copa do Mundo… é um futuro que pode nos trazer muita coisa. ME: Por falar em Corinthians, quais são os planos da Nike para o centenário? LAPR: O trabalho nunca cessa. Nós estamos sempre tentando melhorar, sempre buscando a melhor maneira possível de moldar essa relação. Você sempre pode esperar coisas especiais da companhia, que sempre teve grandes ideias e ideias diferentes. Isso vai acontecer a todo momento, mas o departamento de marketing é que está encarregado. ME: Na reta final do contrato com a Nike, o Flamengo chegou a reclamar publicamente da distribuição de produtos, sobretudo para uso do clube. Isso procede? Vocês fizeram alguma mudança na estrutura de fornecimento de material? LAPR: Essa é uma questão passada, e questão passada eu não gostaria de comentar. A situação do contrato com o Flamengo é que foi bom enquanto durou. Esperamos que eles sejam muito felizes com as escolhas que fizeram, porque nós estamos muito felizes com as nossas. ME: Além do centenário do Corinthians, 2010 é ano de Copa do Mundo. Qual o planejamento da Nike para a seleção brasileira nesta temporada? Que tipo de ação a empresa desenvolverá com a equipe? LAPR: Como em todos os anos de Copa do Mundo, vamos lançar o novo uniforme. Isso já virou uma tradição, e vamos fazer da melhor maneira possível. A camisa azul será lançada até o dia 15 de fevereiro e a amarela até o dia 25, até para aproveitarmos o amistoso que a seleção fará no início de março [contra a Irlanda, no dia 3, ainda sem local definido]. ME: Por que promover dois lançamentos separados das camisas? LAPR: Acreditamos sempre que o impacto das duas camisas precisa ser expandido, como a Nike já vem fazendo há algum tempo. A camisa amarela tem uma cara mais global, uma mística da seleção, e a camisa azul é a que chama atenção dos brasileiros desde a Copa do Mundo de 1958. Sabemos que o brasileiro se importa muito com as duas camisas, e em termos globais a amarela tem um peso diferente. ME: Nos últimos anos, a Nike se caracterizou por apostar fortemente em mídias alternativas para suas campanhas. Um exemplo disso é o extenso uso de vídeos virais. Nesse sentido, qual será o perfil das ações da companhia em 2010? LAPR: Eu não sou a melhor pessoa para falar sobre isso, mesmo porque a companhia está guardando as principais surpresas. O departamento de marketing se encarrega disso, mas eu posso assegurar que vai ser bem interessante. ME: Vocês já começaram a procurar atletas para montar patrocínios até a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016? Se sim, qual é o perfil desses esportistas? LAPR: A aposta é fazer o mesmo que já fazemos no mundo inteiro. Trabalhamos sempre ao lado do atleta. Buscamos nomes que estarão em 2016, mas queremos fazer isso de maneira correta. Trabalhamos o longo prazo, a análise, e focamos aquilo que temos certeza de estar dentro do perfil. A partir daí, procuramos o atleta para compor o nosso grupo.