A carreira de Renan dal Zotto foi totalmente construída no voleibol. Como jogador, ele integrou a seleção brasileira por 13 anos e participou de três edições dos Jogos Olímpicos ? integrou até a geração que conquistou a medalha de prata em Los Angeles-1984. Como técnico, dirigiu times do Brasil e da Itália.
No início de 2009, no entanto, Renan mudou para seguir no vôlei: tornou-se gerente da Cimed, cuidando do marketing esportivo da equipe e da relação entre clube e empresa. Ele já havia treinado com sucesso o time, mas é nos bastidores que o dirigente tem ganhado mais destaque.
Nas quadras, Renan enfrenta o desafio de fazer com que o esporte seja ainda mais difundido no Brasil, contornando os problemas financeiros e estruturais. Além disso, tem prestado consultoria ao futebol do Figueirense.
Focado em planos de negócios que tornem um clube sustentável e atrativo às empresas, Renan não teme dizer que, hoje, ?o vôlei é um exemplo de gestão?. Na visão do dirigente, mesmo sem o apelo do futebol, o esporte consegue fazer com que grandes companhias o vejam como bom foco de investimento.
Os resultados têm sido positivos. Em quadra, a Cimed é a atual campeã da Superliga masculina de vôlei, contanto com astros como o levantador Bruninho. Além disso, a empresa tem tido crescimento de 25% ao ano e já tem estendido seus investimentos para outros esportes, como o futsal e o futebol.
?A Cimed é um caso à parte. Não é o Florianópolis que está inscrito nas federações, é a Cimed mesmo. Hoje, 70% dos recursos vêm da empresa. Os outros 30% estão divididos entre prefeitura e outros patrocinadores menores, casos da Unimed, da Olympikus e da Uptime. Mas não é fácil conseguir empresas que acreditem no esporte, mesmo no futebol. Tem muito time de futebol sem patrocinador. O que nós temos é que fazer é apresentar um plano de negócio que faça com que a empresa não seja um simples patrocinador, mas um investidor, que possa conseguir retorno com a parceria?, disse Renan em entrevista exclusiva à Máquina do Esporte.
Durante a conversa, Renan falou sobre seu trabalho na Cimed. Mas também aproveitou para analisar o atual momento do voleibol no Brasil e até traçar um paralelo com o que encontrou ao fazer consultoria ao futebol do Figueirense.
Confira a seguir a íntegra da entrevista:
Máquina do Esporte: Em que pontos a vivência como atleta ajudou no início de sua carreira como técnico ou ajuda na atual fase como dirigente?
Renan dal Zotto: Durante minha carreira eu tive um aprendizado muito grande, até porque sempre tive a vontade de aprender por onde eu passei. A situação de maior relevância foi na Itália, onde pude ter contato com uma realidade no vôlei bem diferente da brasileira na época. A grande aprendizagem, além da Itália, foi durante os seis anos de universidade, quando pude ter contato e vivência com professores e profissionais.
ME: Você começou a carreira de treinador no Palmeiras/Parmalat. Quais são os ensinamentos que essa parceria deu para o trabalho no esporte da Cimed?
RDZ: São projetos diferenciados. O Palmeiras foi a minha primeira oportunidade como treinador, mas tive contato e experiência com gestores da Parmalat. Mas nenhum trabalho que eu tenha feito me apresentou uma cartilha, isso não existe. Cada projeto tem diferentes necessidades, com diferentes investidores que têm públicos, objetivos e modelos de negócios distintos. Não adianta tentar passar um mesmo modelo de um clube para o outro que o projeto irá naufragar.
ME: Como você justifica a recente saída de grandes investidores, como Finasa, Blausiegel e Santander, do vôlei brasileiro?
RDZ: Entram umas, saem outras. Isso é cíclico, sempre foi assim, não vejo como tendência. Um dia a Cimed também sairá. Nenhum patrocínio é eterno. O que os clubes têm que fazer é apresentar um projeto para as empresas, um plano de negócio. O voleibol brasileiro ainda tem muito o que crescer, muito o que explorar. Se sai o Santander, que antes era o Banespa, já entraram marcas com muito mais força, como é o caso da Sky no Pinheiros, ou mesmo o caso do Sesi. Aí, a empresa cumpre o seu ciclo, seus objetivos, e sai. Esperamos que sempre seja assim.
ME: Se o vôlei tem muito o que crescer no Brasil, quais são os espaços a serem preenchidos?
RDZ: Tecnicamente, só a vinda de jogadores estrangeiros. Toda a nossa seleção brasileira está aqui e temos jogadores de altíssimo nível. Como evento, temos o que melhorar, tanto para a torcida quanto para a empresa. Pra começar, temos pouco espaço na mídia. Dentro dos estádios, temos uma média de público baixa, assim como temos em outros esportes no Brasil. O voleibol é exemplo de gestão, mas há o que melhorar.
ME: E como aumentar o público nas quadras?
RDZ: Por exemplo: a Cimed não tem um ginásio condizente com o clube. No local não tem espaço para eventos de marcas, não tem estacionamento, não tem restaurante. Temos que ver o jogo de vôlei além da partida, mas como um encontro de entretenimento. A Cimed tem trabalhado nesse sentido, não só para o vôlei, mas para os outros esportes do clube. Ainda assim, as grandes finais não acontecem nesses ginásios e a gente vê os jogos em lugares maiores, como o Ibirapuera, o Maracanãzinho e o Mineirinho.
ME: O modelo de gestão do Brasil, baseado na seleção, atrapalha em algum sentido?
RDZ: Não, isso ajuda. A seleção é maravilhosa por chamar os torcedores para verem os jogadores. Às vezes temos problemas com lesão, um ou outro volta nessa situação, mas estamos sempre alinhados, as comissões técnicas sempre conversam. Há um calendário mundial, então cada um tem o seu tempo. A seleção e os clubes não competem entre si.
ME: Por que a maioria das equipes do vôlei brasileiro ainda baseia sua estrutura em apenas um grande patrocinador? Em alguns casos, o fim do aporte representou o fim também do time…
RDZ: Esse não é o único modelo. Tem vários modelos que dão suporte a um time: clube, prefeitura, patrocinador e antigamente havia as faculdades, que no momento não temos mais. Mas quem está inscrito nas federações são os clubes. Então, quando sai o parceiro, eles não acabam; eles perdem muito da sua força e partem em busca de novos patrocinadores.
ME: Até que ponto o time da Cimed depende da empresa?
RDZ: A Cimed é um caso à parte. Não é o Florianópolis que está inscrito nas federações; é a Cimed mesmo. Hoje, 70% dos recursos vêm da empresa. Os outros 30% estão divididos entre prefeitura e outros patrocinadores menores, casos da Unimed, da Olympikus e da Uptime. Não é fácil conseguir empresas que acreditem no esporte, mesmo no futebol. Tem muito time de futebol sem patrocinador. O que nós temos é que fazer é apresentar um plano de negócio que faça com que a empresa não seja um simples patrocinador, mas um investidor, que possa conseguir retorno com a parceria.
ME: É o caso da Cimed?
RDZ: A Cimed vem crescendo 25% ao ano. Claro que não é só por causa do voleibol, mas ele contribui. Não só com a exposição, mas com ações que alavancam os negócios.
ME: Neo Química e Medley, rivais da Cimed, também procuraram o esporte recentemente. Você vê similaridade entre as estratégias de comunicação ou só entre as plataformas?
RDZ: As duas têm investido no futebol. A Medley no Santos e a Neo Química em alguns outros times. Nós também temos projetos no futebol, no ABC de Natal e no Paysandu de Belém. Mas a Cimed não é patrocinadora. Ou é gestora, como no caso do voleibol, ou investidora. Em Belém, temos um plano de geração de negócio e parte do que é gerado com a parceria é passado ao Paysandu. Há uma relação entre o marketing esportivo e o comercial.
ME: Como funciona a consultoria que você tem feito ao Figueirense?
RDZ: Sou muito amigo do presidente do Nestor Lodetti, presidente do Figueirense, e nós montamos um novo modelo de negócio junto com o Marcos Teixeira, do futebol, e o Leonardo Moura, um empresário de Santa Catarina. Nós criamos um modelo para tornar o clube sustentável, mas eu só passo o meu auxílio pela minha empresa.
ME: Qual é a diferença entre a gestão de um time de futebol e um time de voleibol no Brasil atualmente?
RDZ: O maior objetivo é que você volte a preocupação para o orçamento, o planejamento. No futebol isso se extrapola, não se consegue colocar tudo para dentro. No voleibol existe um modelo de estrutura em que se trabalha com planejamento. O futebol precisa criar um modo de fazer um plano de negócio, sem extravagância.