Alguns clubes ficam na cabeça de quem estuda as origens do futebol brasileiro. É o caso do Paulistano e do SPAC (São Paulo Athletic Club), que dominaram o Campeonato Paulista durante o amadorismo. No Rio Grande do Sul, temos o Renner, que superou a dupla Grenal para ganhar o Gauchão em 1954 e encerrou as atividades três anos depois.
Na vizinha Santa Catarina, o time com uma história pouco lembrada é o Metropol, de Criciúma, clube dominante no estado nos anos 1960, mas que não disputa mais torneios profissionais.
Esses episódios pouco conhecidos de uma das equipes mais marcantes do Sul do Brasil estão reunidos no livro “Histórias que a bola esqueceu: A incrível trajetória do E.C. Metropol e de sua torcida”, do pesquisador Zé Dassilva (Editora Carbo).
Em sua terceira edição, a obra ganhou prefácio dos jornalistas Ruy Castro e Juca Kfouri, além de anexos caprichados que ajudam a destrinchar melhor a importância do clube para o desenvolvimento do futebol catarinense.
O Metropol tem uma história curiosa. O clube disputava campeonatos amadores e não era conhecido por alguma conquista significativa nem em nível municipal. A guinada aconteceu quando Dite Freitas, membro de uma das famílias que eram sócias da Carbonífera Metropolitana, resolveu usar o futebol para distrair os funcionários e enfraquecer o movimento sindical, muito forte na região. A greve de 1959 havia eclodido forte, com um mês de paralisação e grandes prejuízos à firma.
Naquele ano, Dite viajou pelo Sul do país em busca de reforços. Era o início da fase do “Metropol rico”, que rendeu ao clube a conquista de cinco Campeonatos Catarinenses (1960, 1961, 1962, 1967 e 1969), além de histórias curiosas e divertidas, como quando o Santos de Pelé foi a Criciúma jogar um amistoso. Sua majestade, no entanto, não apareceu, frustrando os torcedores. Ou a gloriosa excursão de três meses pela Europa, em 1962. Foram treze vitórias, seis empates e quatro derrotas atuando em cinco países (Espanha, Suíça, Alemanha, Dinamarca e Romênia).
A campanha do Metropol pela Europa foi reconhecida pela Confederação Brasileira de Desportos, que condecorou os catarinenses com a Fita Azul, uma comenda concedida às equipes que representassem com louvor o nosso futebol no exterior.” (trecho do livro “Histórias que a bola esqueceu”)
Há histórias inusitadas, como a do zagueiro Zezinho Rocha, que se apaixonou pela romena Sukosd, mesmo sem o casal entender nada da língua do outro. Apesar de não ter reencontrado a amada, o defensor ainda conseguiu convencer a esposa brasileira, com quem se casou ainda nos anos 1960, a dar o nome de Sukosd à primeira filha do casal.
A obra também acompanha a realidade social da época, contando as consequências do golpe de 1964, que gerou perseguição e prisões aos trabalhadores da cidade carbonífera. E episódios de triste discriminação, como espaços da cidade exclusivos para brancos, como salões de baile.
Aliás, o Metropol, de certa forma, ajudou a quebrar barreiras do preconceito racial. O lateral-esquerdo Edson Madureira, ídolo do time alviverde, insistiu em se casar no luxuoso Criciúma Clube e bateu o pé para superar o veto da diretoria do local contra a presença de negros na festa. Como os jogadores eram celebridades na cidade, a proibição foi superada.
O clube alviverde teve vida curta, após o desinteresse da carbonífera em manter os gastos com o futebol. Àquela altura, não era mais necessário o ópio do povo, já que o movimento sindical já estava controlado pela ditadura militar.
O clube voltou ao amadorismo pouco depois de sua última glória: o título do Campeonato Catarinense de 1969. Seu legado, porém, é imenso. Não teríamos o Criciúma, campeão da Copa do Brasil de 1991, sem o Metropol dos anos 1960 (não vou dar spoiler!).
Para quem se interessa pelo desenvolvimento do futebol regional do Brasil, o resgate da história do Metropol é uma catarse de histórias que, se a bola esqueceu, poderão ser lembradas neste livro.