O repórter investigativo Andrew Jernnings, de 78 anos, morreu no último sábado (8). A morte foi anunciada na conta oficial do jornalista no Twitter, que afirmou que Jennings padeceu de uma “doença grave e repentina”, mas não especificou qual foi o mal.
Nascido na Escócia, Jennings radicou-se em Londres ainda criança. Destacou-se como repórter investigativo ao examinar sobretudo as grandes organizações do esporte mundial. Nos anos 80, voltou atenção às mazelas do Comitê Olímpico Internacional (COI), à época dirigido pelo espanhol Juan Antonio Samaranch.
Jennings se deteve no jogo de poder em torno do comitê e nos cartolas que comandavam o mundo olímpico, como o italiano Primo Nebiolo, presidente da antiga Federação Internacional de Atletismo Amador (IAAF), atual World Athletics.
Segundo o “Os senhores dos anéis” (publicado junto com Vyv Simson), Nebiolo exigiu dos organizadores dos Jogos de Seul 1988 um cheque de US$ 20 milhões para mudar os horários das finais do atletismo na Olimpíada. Os sul-coreanos precisavam dessa alteração para agradar a TV dos Estados Unidos, que perderia muita audiência se as finais fossem no final da tarde, madrugada na América do Norte pelo fuso horário.
Os organizadores dos Jogos tiveram que convencer uma empresa sul-coreana de material esportivo a patrocinar a Iaaf com essa verba. Detalhe: o montante era US$ 5 milhões acima do que a Visa havia gastado para ser parceira comercial dos Jogos Olímpicos.
Nos anos 90, o jornalista voltou suas atenções à corrupção na FIFA, investigando a gestão do brasileiro João Havelange e do suíço Joseph Blatter, que dirigiram a federação por mais de 40 anos. Jennings investigou acusações de pagamento de propina a dirigentes por direitos de marketing cedidos à ISL e compra de votos de cartolas para a eleição de Blatter.
Em 2006, apareceu no Panorama, programa de documentários da BBC, com sua primeira leva de denúncias de corrupção da FIFA. No ano seguinte, apareceu em outro episódio explorando as relações entre Sebastian Coe, presidente da World Athletics, com o Comitê de Ética da FIFA.
O programa com maior repercussão foi veiculado em 2010. Intitulado “Os segredos sujos da FIFA”, denunciou a eleição da Rússia a sede da Copa do Mundo de 2018 (na ocasião, a Inglaterra era uma das candidatas). Jennings revelou que dirigentes, entre os quais o brasileiro Ricardo Teixeira (presidente da CBF), o paraguaio Nicolás Leoz (presidente da Confederação Sul-Americana de Futebol, a CONMEBOL) e Issa Hayatou (mandatário da Confederação Africana de Futebol) teriam aceitado propina de uma empresa de marketing.
Em 2015, o jornalista apresentou um resumo de suas investigações em programa intitulado “FIFA, Sepp Blatter e eu”. No mesmo ano, veio ao Brasil e foi um dos depoentes da CPI do Futebol, no Senado Federal.
Como repórter, Jennings também se notabilizou por investigar instituições fora do esporte, como a Scotland Yard e o caso Irã-Contras, denúncia de que integrantes do governo de Ronald Reagan, presidente dos Estados Unidos, facilitaram secretamente a venda de armas ao Irã, que sofria embargo internacional, nos anos 1980. Com o dinheiro arrecadado, financiaram os Contras da Nicarágua, grupo armado que tentava derrubar o governo sandinista, de orientação de esquerda.
Em 1993, Jennings também foi o primeiro jornalista ocidental a conseguir entrar na Chechênia com uma equipe de TV para investigar a máfia do Cáucaso.
No Brasil, o jornalista teve três livros traduzidos: “Os senhores dos anéis: poder, dinheiro e drogas nas Olimpíadas modernas” (com Vyv Simson, BestSeller/Círculo do Livro, 1992), “Jogo sujo: o mundo secreto da FIFA: compra de votos e escândalo de ingressos” (Panda Books, 2011) e “Um jogo cada vez mais sujo” (Panda Books, 2014).
Ele também colaborou com um texto para o livro “Brasil em jogo: o que fica da Copa e das Olimpíadas?” (Boitempo, 2014).