Mulheres Líderes da Indústria Esportiva: Leila Pereira, presidente do Palmeiras

Leila Pereira, presidente do Palmeiras - Reprodução / Instagram (@leilapereira)

A Máquina do Esporte dá início, nesta sexta-feira (10), à publicação das reportagens destacando as principais lideranças femininas da indústria do esporte no Brasil. A personagem escolhida para inaugurar a série talvez seja a mais evidente de todas, por um fato simples: é a única mulher a comandar um grande clube da Série A do Campeonato Brasileiro. Mas não apenas por isso e sim porque, desde que ela passou a fazer as engrenagens rodarem, a torcida dessa equipe vem experimentando alguns dos momentos mais gloriosos de sua história.

Nascida em Cabo Frio (RJ), em uma família de vascaínos, Leila Pereira pouco se interessava por futebol na infância. Na juventude, tentou trilhar os caminhos do Jornalismo, para depois formar-se em Direito e sonhar com uma carreira nos tribunais. Não ter sido aprovada no concurso público para juíza, na segunda metade dos anos 1990, certamente deve ter provocado algum dissabor à jovem. A torcida do Palmeiras, porém, pode agradecer eternamente por esse “fracasso” momentâneo.

Algum tempo depois, em 2000, Leila passaria a trabalhar como advogada nas empresas do marido, o banqueiro José Roberto Lamacchia, filho do fundador da Crefisa. O casal se conheceu durante o Carnaval, no tempo em que ela ainda cursava Jornalismo na Estácio de Sá, no Rio de Janeiro. Como estagiária, a jovem chegou a participar da cobertura da Copa de 1990, pela extinta TV Manchete.

Ao atuar de maneira decisiva na disputa judicial entre o marido e o cunhado Antônio Luiz Lamacchia, Leila foi conquistando cada vez mais espaço nas empresas. Até se tornar a presidente e, por que não dizer, a personificação da Crefisa.

Paixão pelo futebol se torna investimento

O ano de 2017 marca o início de uma era no Palmeiras que está fortemente associada à figura de Leila Pereira. Foi quando a empresária, que também é dona da FAM, entrou para o Conselho Deliberativo do clube, tendo sido a mais votada até então.

Sua chegada ao quadro de dirigentes foi turbulenta e marcada por forte influência masculina nas articulações. O Palmeiras vinha de um complexo processo de reconstrução, depois do rebaixamento para a Série B do Campeonato Brasileiro, em 2012.

Durante a segunda gestão de Paulo Nobre, a Crefisa e a FAM iniciaram a parceria com o clube. Oficialmente, trata-se de um patrocínio, embora alguns chamem de mecenato, ao passo que Leila Pereira já declarou que tudo não passa de um investimento (ou seja, a empresária espera retorno desse dinheiro destinado ao time do coração).

Embalado pelos fartos recursos injetados por Leila e Roberto Lamacchia, o Palmeiras conquistou a Copa do Brasil de 2015 e o Brasileirão de 2016 (a última taça do campeonato era de 1994). Mas o casal de patrocinadores queria ir além.

Em 2017, pelas mãos do ex-presidente Mustafá Contursi, líder do grupo “Palmeiras Forte”, Leila foi inscrita como candidata ao Conselho Deliberativo. A ideia do velho cartola era usá-la como puxadora de votos na eleição proporcional, no embalo das conquistas obtidas pelo clube com o patrocínio da Crefisa.

Mas a situação tornou-se tensa quando Paulo Nobre, que já havia deixado a presidência, resolveu impugnar a candidatura da empresária, alegando que ela estava há apenas um ano no quadro de associados (seriam necessários oito, no mínimo), razão pela qual não estaria habilitada a participar do pleito. Leila afirmava, por seu turno, que era sócia do clube alviverde desde 1996.

No fim das contas, a candidatura prevaleceu, e ela se tornou conselheira e depois presidente, em 2021. O resto dessa história vai sendo escrito com uma fileira imensa de troféus nacionais e internacionais conquistados recentemente pelo Palmeiras e também pelos resultados para lá de positivos nas finanças do clube.

A única em um ambiente majoritariamente masculino

Desde que o futebol foi trazido oficialmente para o Brasil, em 1895, com o esporte organizando-se em torno de clubes esportivos, a quantidade de mulheres que presidiram agremiações pode ser contada nos dedos das mãos de uma pessoa.

São nove no total, sendo que a primeira foi Jurema Bagatini Ramos, nos anos 1970, que presidiu o Esporte Clube Encantado, do Rio Grande do Sul. Destas, apenas três comandaram times considerados grandes no Brasil.

A primeira foi Marlene Matheus, esposa do folclórico Vicente Matheus e que presidiu o Corinthians de 1991 a 1993, tendo sido afastada do cargo por uma manobra de Alberto Dualib no Conselho Deliberativo. Até a sua morte, em 2019, ela representou a principal (ainda que, por vezes, solitária) voz de oposição no clube.

A segunda foi a ex-atleta Patrícia Amorim, que assumiu a presidência do Flamengo em 2010, prometendo inicialmente investir no fortalecimento das categorias de base do clube e depois apostando em contratações de peso, como Vágner Love e Ronaldinho Gaúcho. Em 2012, ela seria derrotada, em sua tentativa de reeleição, por Eduardo Bandeira de Mello. A partir daí, seguiu carreira na política partidária.

A terceira mulher presidindo um grande clube brasileiro surgiria apenas em 2021, com Leila Pereira.

Esta foto de uma reunião de dirigentes da Liga do Futebol Brasileiro (Libra), publicada há algumas semanas, viralizou em diferentes meios, justamente pelo fato da presidente palmeirense ser a única mulher em meio a diversos homens.

Leila Pereira é a única mulher na foto oficial da Libra, publicada em fevereiro de 2023 – Divulgação

Visão meritocrática

A foto acima permite muitas interpretações. Alguns verão o retrato de um país estruturalmente machista e onde as esferas de decisão permanecem dominadas pelos homens. Outros, porém, talvez enxerguem o exemplo de uma mulher que superou as barreiras de gênero e conquistou seu espaço. Questionada sobre como se sente transitando em um mercado majoritariamente masculino, Leila Pereira faz uma leitura meritocrática da situação.

“Olha, já me fizeram diversas vezes essa pergunta. Eu transito com muita tranquilidade, porque eu acho que o gênero não é definitivo na capacidade da pessoa, entendeu? Você, sendo homem ou mulher ou o gênero que for, se você luta, se você sabe o que você quer, se você se dedica, se você é correta, você vence. Eu sei exatamente o que é melhor para o Palmeiras. Sei exatamente aonde eu quero chegar. Então, para mim, é bem tranquilo”

Leila Pereira, presidente do Palmeiras

Estar no topo é estar em evidência e, portanto, sujeita a críticas, que muitas vezes ultrapassam o tom do razoável, descambando para o terreno da ofensa. No início de fevereiro deste ano, após o empate em 0 a 0 contra o São Paulo, em casa, pela terceira rodada do Campeonato Paulista, os muros do Allianz Parque amanheceram pichados com a palavra “Blogueirinha”, em referência ao uso frequente que a dirigente costuma fazer das redes sociais. Não se tem notícia de que algum cartola homem tenha sido tratado nesses termos em algum protesto nos tempos atuais de sociedade conectada.

Mais recentemente, novamente em um caso relacionado ao clube rival, Leila tem enfrentado fortes questionamentos por parte dos torcedores, por conta da decisão de emprestar o Allianz Parque para o São Paulo mandar o jogo das quartas de final do Paulistão, diante do Água Santa, na próxima segunda-feira (13), às 20h (horário de Brasília). Nessa data, o Morumbi receberá o show da banda britânica Coldplay.

Além de não ceder às críticas, Leila tem como característica ir a público para realizar o embate e bancar suas decisões. Na polêmica sobre o jogo do São Paulo no Allianz, ela declarou que não administra o Palmeiras “segundo nota de torcida organizada”.

Os setores que a criticam costumam chamá-la de centralizadora. Sempre que questionada a esse respeito, Leila se defende, alegando que as decisões são tomadas em conjunto com a diretoria e o conselho técnico.

De qualquer modo, mesmo seus críticos mais mordazes reconhecem que a presidente palmeirense tem personalidade marcante e faz valer suas decisões.

“A gente tem que parar com essa conversa de que mulher é sexo frágil. Nós somos muito fortes. Às vezes, a gente bate mais forte do que muito homem. Então, para mim, é tranquilo, as pessoas me respeitam, entende? Porque eu me faço respeitar. Eu faço o que é melhor para o meu clube, e vamos tocar a bola para frente”, enfatizou a mandatária.

Sair da versão mobile