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Peak vence burocracia, chega ao Brasil e focará no running com direito a Aloísio Chulapa como embaixador

Marca chinesa foi parceira do COB durante quase oito anos, mas não conseguiu entrar no mercado brasileiro; em agosto, fechou contrato de exclusividade com a ABN8 Trading

ABN8 Trading, representada pelo CEO Alfredo Novais, se tornou representante exclusiva da Peak no mercado brasileiro - Divulgação / Peak

O ano era 2017. O esporte brasileiro vinha da melhor campanha do país na história dos Jogos Olímpicos até então, justamente em casa, no Rio de Janeiro, um ano antes, vestido pela Nike. No entanto, o contrato com a gigante norte-americana chegou ao fim, e, em um dos seus últimos atos como presidente do Comitê Olímpico do Brasil (COB), Carlos Arthur Nuzman optou por uma mudança radical.

Em meados de setembro daquele ano, a chinesa Peak, praticamente desconhecida do público brasileiro, foi anunciada oficialmente como nova fornecedora de material esportivo da entidade. Cerca de 15 dias depois, Nuzman foi preso durante a Operação Unfair Play, um desdobramento da Operação Lava Jato, acusado de corrupção e compra de votos para que o Rio de Janeiro fosse sede dos Jogos no ano anterior.

Seis dias após a prisão, o dirigente renunciou à presidência do COB. O acordo com a Peak, porém, já estava assinado e seria respeitado até o fim, por dois ciclos olímpicos inteiros, o que incluiu duas edições dos Jogos de Inverno (PyeongChang 2018 e Pequim 2022) e outras duas dos Jogos de Verão (Tóquio 2020 e Paris 2024).

Ao todo, foram quase oito anos. E, mesmo com o logotipo estampado nos uniformes brasileiros em quatro edições olímpicas, a Peak nunca conseguiu entrar de fato no país. O contrato acabou no fim do ano passado, e o COB anunciou, em maio deste ano, a Adidas como nova parceira.

Mas eis que, agora, no primeiro ano fora da entidade, o que parecia impossível durante tanto tempo, aconteceu. Em 2025, finalmente, a Peak chegou ao Brasil.

ABN8 Trading

A responsável pela “façanha” é a ABN8 Trading, empresa especializada na importação e exportação de produtos de diversos segmentos. Fundada em 2009 como ABN International, nome que conservou até 2012, a companhia foi, com o tempo, especialmente após 2015, já com o nome atual, se especializando no mercado chinês. O número 8 no nome, inclusive, tem a ver com isso, já que é um número do qual os chineses gostam muito.

“Minha primeira visita à China foi em 2011 e achei o máximo. Com o decorrer dos anos, decidi focar muito o meu negócio no país e acabei me tornando um especialista em China, um profundo conhecedor do mercado chinês. Aprendi como negociar, como me portar, como me inserir na comunidade deles. Uma visita não é só uma visita. Tem todo o ritual com os caras, desde o chá até tomar uma cerveja no jantar”, afirmou Alfredo Novais, CEO da ABN8 Trading, em entrevista à Máquina do Esporte.

Em 2016, entre tantos outros segmentos com os quais já trabalhava, Alfredo decidiu entrar no setor de vestuário, mas com roupas sem marca específica e mais focadas no outono/inverno, que passou a importar para vender para distribuidores e lojistas de todo o Brasil, especialmente na região do Brás, em São Paulo (SP). Nada de esporte.

O olhar para o universo esportivo veio apenas no fim de 2023, em mais uma viagem do executivo à China.

“Eu estava sem ir para lá desde o começo da pandemia. Então, em dezembro de 2023, voltei a ir. E, andando na rua, reparei em uma megaloja esportiva de uma marca chamada Anta. Por conta do nome, quis bater uma foto para brincar com um amigo aqui no Brasil. Só que, em seguida, ao dobrar a esquina, percebi o tamanho daquele lugar e me perguntei: “espera aí, que marca é essa?”, recordou-se Alfredo.

Líder esportiva na China, a Anta está entre as três maiores marcas do segmento no mundo. Frequentemente, inclusive, é citada como uma gigante que é capaz de desafiar a hegemonia de multinacionais como Nike e Adidas. Atualmente, em termos de valor de mercado, a Nike lidera com US$ 113,67 bilhões, seguida de longe pela Adidas, com US$ 34,74 bilhões. A Anta, por sua vez, já está colada na marca alemã, com US$ 32,74 bilhões.

“Entrei na loja e comprei o tênis de corrida mais caro, que saiu por R$ 650. Foi bizarro”, ressaltou o executivo.

Dali em diante, Alfredo decidiu focar na Anta. As conversas, porém, não evoluíram, e o olhar passou a ser para o mercado esportivo chinês como um todo, com pesquisas sobre marcas como 361o, Xtep e a própria Peak, da qual ele se lembrava justamente por vestir o Time Brasil.

Peak

Em outubro de 2024, o executivo voltou à China para participar da Canton Fair, uma feira de importação e exportação que é considerada a maior feira multissetorial do mundo, realizada duas vezes ao ano na cidade de Guangzhou (também conhecida como Cantão). Alfredo já havia visitado o evento em outras oportunidades, mas, dessa vez, foi com o objetivo traçado no segmento esportivo.

“Entrei no estande da Peak com a camisa que uso diariamente para trabalhar, com o logotipo da ABN8 Trading e uma grande bandeira do Brasil. Exatamente pelo fato de que o Brasil era patrocinado pela Peak nas Olimpíadas, a bandeira chamou a atenção. E percebi que uma moça começou a me olhar”, contou.

“Percebi que a bandeira estava chamando atenção, mas pensei: ‘eles estão com o COB, são a segunda marca da China, quem sou eu na fila do pão?’. Mas a moça veio falar comigo, disse que tinha visto a bandeira e a palavra trading na minha camisa, e quis saber o que eu fazia. Trading é muito valorizado na China. E quando eu disse que meu maior faturamento era vestuário desde 2016, ela perguntou se eu poderia conversar com a diretora dela”, completou.

Alfredo Novais no estande da Peak na Canton Fair – Divulgação / Peak

A conversa durou uma tarde inteira, Alfredo disse que não tinha exclusividade com nenhuma marca, e a diretora da Peak afirmou categoricamente que a ABN8 Trading era a empresa que eles precisavam no Brasil. Após o encontro, o executivo fez uma verdadeira imersão na sede da marca, na cidade de Quanzhou.

A essa altura, o acordo com o COB estava se encerrando, não seria renovado, e a marca, portanto, seguiria sem entrar no Brasil. Parece inacreditável após quase oito anos de parceria, mas a única ação que a Peak conseguiu realizar com o COB foi na Casa Brasil, que funcionou durante Paris 2024 na capital francesa, em que a marca teve uma pequena loja e vendeu seus produtos para quem frequentou o local. No Brasil, durante todo esse tempo, não houve nada.

“É claro que eles tentaram vir, mas tiveram uma série de problemas pelo não conhecimento do mercado brasileiro, da legislação brasileira, da burocracia brasileira. O Brasil é um país muito difícil, burocraticamente falando. E quando a gente fala de importação, é mais difícil ainda. Me contaram uma série de dificuldades que eles tiveram, inclusive para mandar material para os atletas olímpicos. Tem um monte de material encalhado na China até hoje, tênis, chinelo, calça, corta-vento, e teve muita coisa que eles perderam aqui no porto porque não conseguiram tirar os produtos de lá”, comentou o CEO da ABN8 Trading.

Alfredo Novais na sede da Peak, na cidade de Quanzhou – Divulgação / Peak

Basquete ou corrida?

Do fim de 2024 até meados de 2025, as conversas ganharam corpo, e o acordo para que a ABN8 Trading representasse com exclusividade a Peak no Brasil foi sacramentado em agosto.

De início, a marca chinesa estava interessada em fechar com a seleção brasileira de basquete. No entanto, Alfredo sugeriu que eles fossem para o universo da corrida, caso realmente quisessem “mexer o ponteiro” por aqui. Isso porque é um mercado aquecido desde a pandemia no país e onde o executivo enxerga grandes possibilidades. Como o basquete também era um foco dos chineses para estes lados do mundo, acabaram fechando com a seleção argentina.

No Brasil, então, o centro das atenções da Peak passou a ser a corrida. E Alfredo optou por uma estratégia no mínimo diferente.

“Decidi trazer uma quantidade pequena de tênis, não um contêiner cheio, e começar a testar por meio de grupos de corrida no WhatsApp, tornando uma experiência exclusiva e focando no marketing de corredor para corredor. Foi uma maneira que encontrei de testar o mercado. Eu corro e pedi também para que amigos meus testassem os tênis. Queria saber se era eu que estava apaixonado pela marca e estava ficando cego ou se realmente a qualidade é tão boa como eu estava achando”, revelou.

As vendas via grupos de WhatsApp devem começar em breve. Com o tempo, a ideia é passar a crescer no mercado, primeiro com o Mercado Livre e, depois, a princípio a partir de abril de 2026, adentrar os “grandes players”, como Velocità e Centauro, especialmente com cinco modelos de tênis: Peak Taichi 30/40 (com placa de carbono), Peak Up 30 Pro 2.0 (top de linha), Peak Taichi Flow (sem placa), Peak Taichi Flow 7.0 e Peak Taichi Walking (para o dia a dia).

Peak Taichi 30/40 possui placa de carbono e está sendo usado por José Renato Silva – Divulgação / Peak

Aloísio Chulapa

José Renato Silva, que é atleta profissional, se tornou embaixador da marca e já ganhou algumas provas calçando tênis da Peak. E o objetivo é fechar com outros atletas para serem embaixadores nos próximos meses. Mas outro personagem, bastante conhecido por conta do futebol, é quem deve chamar mais atenção, em uma espécie de rolê aleatório bastante improvável do running: Aloísio Chulapa.

Dono de alguns títulos com o São Paulo, inclusive o Mundial Interclubes de 2005, o ex-jogador é amigo pessoal de Alfredo Novais. Mais do que isso: o CEO da ABN8 Trading é padrinho de batismo do filho mais novo de Aloísio, que se chama Rogério Ceni.

“Fizemos a romaria para Aparecida [cidade no interior de São Paulo] no início de outubro, e ele andou 28km, sendo alguns deles com o Peak Taichi Flow, logo no primeiro dia. Por conta da época de jogador, os joelhos dele são destruídos, e ele gostou muito. Pode ter certeza de que ele vai fazer propaganda da Peak”, finalizou o executivo.