O velocista Paulo André, de 23 anos, tinha pouco mais de 78 mil seguidores no Instagram quando entrou no BBB 22, em janeiro. Três meses depois, finalista do programa, o principal velocista do Brasil virou uma celebridade quase instantânea. Ele já contava com mais de 7,6 milhões de fãs até a noite desta segunda-feira (25), véspera da decisão do vencedor do reality show, e via esse número não parar de crescer.
O atleta disputa a vitória no programa nesta terça-feira (26) com os atores Arthur Aguiar e Douglas Silva, na primeira final só com homens e apenas com integrantes do Camarote (grupo selecionado entre celebridades e pessoas com alguma fama).
Para especialistas, Paulo André é o caso raro de um atleta que ganhou tantos fãs não por suas façanhas no esporte, mas por participar de uma atração de TV.
“As pessoas geralmente se envolvem mais com a imagem do atleta quando ele expressa o seu dia a dia ou sua relação familiar. Isso faz com que as pessoas se sintam mais próximas da vida dele. Há mais interesse nos lugares em que ele visita, nas marcas que utiliza, no que o faz ficar alegre ou triste”, apontou Thiago Santos, coordenador do curso de licenciatura em gestão esportiva da Universidade Europeia, em Lisboa (Portugal), em entrevista à Máquina do Esporte.
“Isso tem um peso muito maior do que pelos feitos esportivos, porque a rede social está bem mais conectada com essa lógica da identificação das pessoas com os outros“, acrescentou Santos, que é especialista em redes sociais.
Essa capacidade que Paulo André demonstrou de cativar o público faz do atleta um dos favoritos ao prêmio do BBB 22. O vencedor do reality show embolsará a bolada de R$ 1,5 milhão, além de um carro 0 km. O segundo colocado ganhará R$ 150 mil e contrato de um ano com a Globo. Já quem ficar em terceiro na final leva R$ 50 mil para casa.
“As pessoas viram o Paulo André como uma boa pessoa. Por consequência, tendem a vê-lo como atleta de uma maneira positiva. No BBB, ele se manteve treinando. Não como deveria, mas teve a preocupação em fazer exercícios. O Paulo André criou uma conexão com o público via Big Brother que, apesar de ser nosso principal velocista, não conseguiria conquistar como atleta”, analisou Fernando Fleury, CEO da Armatore Market+Science, agência de inovação focada em esporte.
Independentemente do fato de ganhar ou não o prêmio do BBB 22, o corredor já terá motivos a comemorar com a popularidade que conquistou. Ele já é o competidor do atletismo olímpico em atividade com mais fãs no Instagram. O brasileiro superou Neeraj Chopra, campeão do lançamento de dardo nos Jogos de Tóquio e primeiro atleta da Índia a ganhar o ouro olímpico no atletismo. Atualmente, o indiano conta com 5,7 milhões de seguidores.
O brasileiro está à frente até mesmo de nomes de alcance global, como a americana Simone Biles, destaque da ginástica artística, que soma 6,9 milhões. No atletismo, o brasileiro só é superado por dois ex-atletas: Caitlyn Jenner, com 12,9 milhões, e Usain Bolt, que tem 11,3 milhões de fãs. O americano Michael Phelps, multicampeão da natação, por exemplo, fica bem atrás de Paulo André, com 3,4 milhões.
Fora do futebol, o velocista ainda não é páreo para tenistas como Rafael Nadal (14,1 milhões) Novak Djokovic (10,5 milhões) e Roger Federer (9,2 milhões), ou pilotos como Lewis Hamilton (27,8 milhões) e Max Verstappen (8,3 milhões).
Todos esses nomes do esporte, porém, têm conquistas de alcance mundial no currículo, em modalidades badaladas e com muita divulgação nos meios digitais. Não é o caso do brasileiro, que possui no currículo uma medalha de ouro no 4x100m no Mundial de Revezamento, além de um ouro (4x100m) e uma prata (100m) no Pan-Americano de Lima (Peru), ambos em 2019.
Mas, se rompeu a bolha do esporte com sua participação no BBB 22, Paulo André ainda terá um desafio gigantesco pela frente: manter o foco após a intensa visibilidade obtida no reality show.
“Agora, o Paulo André vai se sentir na pele de um jogador de futebol famoso. É o que a gente cobra do Neymar e de todos os grandes astros. A participação dele na casa mostrou que ele é um atleta muito focado em vencer. Claro que ele vai aproveitar o momento, do ponto de vista econômico, com patrocínios e participação em eventos, como fazem os grandes astros do esporte. Mas não acredito que vá se deslumbrar”, afirmou Fleury, que é doutor em comportamento do consumidor, inovação e tecnologia pela Faculdade de Economia e Administração (FEA) da USP.
Como revés por ter ficado tanto tempo longe do atletismo, Paulo André deve perder o bolsa-atleta, programa do governo federal, por não ter cumprido o cronograma de treinamentos no período em que ficou confinado no BBB 22. No entanto, esse deve ser o menor dos problemas do corredor.
Com sua popularidade nas redes sociais, muitos convites para estrelar campanhas, dar aval a produtos, tornar-se embaixador de marcas ou fazer publicidade em suas contas oficiais começam a surgir. Procurada, a Nike, principal patrocinadora de Paulo André, afirmou que planeja realizar ações com o velocista, mas que não pode abrir detalhes neste momento.
Outras empresas devem aproveitar essa onda. Além de números impressionantes no Instagram, Paulo André conta hoje com 845,2 mil fãs no TikTok e 573 mil seguidores no Twitter. Precisará, a partir de agora, fazer uma gestão eficiente da carreira.
“Acho que esse é o ponto para pensar: quem vai gerenciar a carreira do Paulo André a partir de agora? Desconheço se ele tem uma equipe profissional para isso. Porque você tem o personagem, que começou a ser construído no programa, e o Paulo André atleta. É claro que os dois se misturam, e essa junção é muito importante”, opinou Fleury.
Para entidades como o Comitê Olímpico do Brasil (COB) ou a Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt), a entrada de Paulo André no mundo das celebridades também poderá ser útil na busca por engajamento do esporte olímpico nas redes sociais.
O comitê, por exemplo, poderia usar a imagem do velocista em campanhas para atrair os torcedores para apoiar o Time Brasil nos Jogos Olímpicos de Paris 2024. Já a confederação conseguiria aumentar a popularidade das provas de pista e campo entre os jovens. Com um trabalho bem feito, a CBAt aumentaria a base de praticantes no atletismo e revelaria novos talentos que hoje não veem o esporte como opção ou mesmo são direcionados a modalidades com maior divulgação.
“O Paulo André é um novo fenômeno nas redes sociais. Mas como podemos usar essa imagem para potencializar a atenção das pessoas para o esporte ou o atletismo? É algo essencial para as entidades esportivas: ter o público assistindo e gostando do atletismo. Acho que esse é outro fator importante que essa ruptura da bolha pode servir: utilizar a imagem desse atleta. Porque, neste momento, o Paulo André não é visto como atleta, mas como o cara do Big Brother”, comentou Thiago Santos.
Para Fleury, Paulo André será mais um caso de atleta com popularidade que será desperdiçado pela confederação da sua modalidade, assim como já aconteceu com Ayrton Senna no automobilismo e Gustavo Kuerten no tênis, entre outros astros nacionais.
”O atletismo, assim como o basquete e o vôlei, precisa de atletas com algumas características: ser forte, grande. Então, a Confederação Brasileira [de Atletismo] deveria aproveitar a imagem do Paulo André para aumentar o número de praticantes. Mas acho que não farão isso”, lamentou.
Até agora, a CBAt tem se ”calado” nas redes sociais sobre o novo velocista fenômeno. O perfil do COB é o único a conversar com o fã de Paulo André em busca de engajamento. Quando o atleta ganhou a vaga na final, um post no Instagram com a imagem dele e o pedido por votos para o corredor ser o vencedor teve 48 mil curtidas. Foi o maior engajamento de uma postagem do perfil oficial do esporte olímpico brasileiro desde a imagem de Rebeca Andrade recebendo o ouro olímpico, em agosto de 2021.