O Senado Federal realizou a última sessão de debates em relação ao projeto de lei (PL) 2.796/2021, que pretende regulamentar o setor de jogos eletrônicos no Brasil. Durante a sessão, os parlamentares divergiram muito sobre o texto, que deve ser votado em plenário nesta quinta-feira (21).
Apresentado pelo deputado federal Kim Kataguiri (União-SP), o PL 2.796/2021 foi aprovado pela Câmara em outubro de 2022 e seguiu para análise da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado. A matéria tem como objetivo regulamentar o mercado de jogos eletrônicos no Brasil, criando um Marco Legal para o tema. Mas, segundo especialistas, com seis artigos, o texto carece de esclarecimentos em diversos pontos. Para outros, o conteúdo é completo e pode ser votado sem maiores problemas.
Além disso, o fato do texto ser apreciado por apenas uma comissão gera preocupação. No mês passado, parlamentares apresentaram requerimentos para que outras cinco comissões opinassem sobre o projeto de lei: Assuntos Sociais (CAS); Comunicação e Direito Digital (CCDD); Direitos Humanos (CDH); Educação (CE); e Esporte (Cesp). No entanto, os requerimentos não chegaram a ser analisados.
O texto ainda contempla os chamados fantasy games, em que os jogadores utilizam dados de desempenho de atletas reais para pontuar, podendo realizar saques em dinheiro. No Brasil, Cartola FC e Rei do Pitaco são dois exemplos de fantasy game no mercado.
Tamanho do setor
De acordo com a Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Games (Abragames), o Brasil possui 1.042 estúdios de desenvolvimento, empregando cerca de 13 mil pessoas diretamente na indústria de jogos. À revista Veja, a Abragames revelou que não foi consultada para fazer parte do desenvolvimento do texto.
Aqui, vale destacar que o PL refere-se apenas aos desenvolvedores de jogos. Mas a indústria de jogos, por sua vez, contempla uma série de outras profissões, como modeladores 3D, designers, animadores, finalizadores, publishers, editores de vídeo, profissionais de marketing e publicidade, etc.
Dos estúdios que participaram da pesquisa da Abragames, 17% operam no mercado há mais de dez anos, enquanto 19% tinham menos de dois anos de operação. A maioria dos estúdios (85%) já está formalizada, e 63% dos não formalizados pretendem fazê-lo até 2024.
É importante lembrar que o Marco refere-se aos jogos eletrônicos de forma geral, e não apenas aos esportes eletrônicos como Counter-Strike (CS:GO), League of Legends (LoL) e EA Sports FC (antigo Fifa), por exemplo.
Contestação
Além dos parlamentares, a sessão de debates, que foi sugerida pela senadora Leila Barros (PDT-DF), contou com a presença de representantes dos Ministérios da Fazenda e da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). Para Henrique de Oliveira, secretário de Ciência e Tecnologia do MCTI, embora a pasta seja favorável ao marco, o PL 2.796/2021 não cumpre essa finalidade.
“Algumas das principais entidades que atuam no setor de jogos eletrônicos têm demonstrado preocupação com o texto do projeto. Elas apontam contradições conceituais e itens que não foram abarcados pelo marco regulatório”, ponderou Oliveira.
Vilson Antonio Romero, presidente da Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip), analisou que o PL 2.796/2021 deve ser desmembrado, e classificou os fantasy games como um “jabuti”. Ele sugere que os dispositivos que tratam desse tipo de jogo sejam analisados de forma autônoma, uma vez que a modalidade se aproxima das apostas esportivas.
“[Os fantasy games] têm que ser tratados à semelhança da regulamentação da tributação das ‘bets’. Temos que aproximá-los mais das apostas de cota fixa do que dos jogos eletrônicos”, defendeu Romero.
Favoráveis
Já para o presidente da Associação Brasileira de Fantasy Sports, Rafael Marcondes, o PL está “maduro e apto a ser aprovado”.
“O fantasy é um jogo de estratégia e habilidade. Não é aposta e não é jogo de azar. A natureza jurídica das duas atividades é a mesma: a tecnologia. Uma empresa de games, assim como a de fantasy, é composta majoritariamente por pessoas relacionadas à área de tecnologia”, enfatizou Marcondes.
O advogado Udo Seckelmann, mestre em Direito Desportivo Internacional pelo Instituto Superior de Direito e Economia de Madri, destacou que há muita diferença entre os fantasy games e os jogos de azar, defendendo a aprovação do PL como forma de atrair capital estrangeiro.
“Enquanto as apostas já possuem direcionamento legislativo, os operadores de fantasy não têm essa clareza legislativa e regulatória. [Os investidores] chegam para investir, mas desanimam. Grande parte desiste exatamente porque tem o receio de fazer altos investimentos no Brasil e, daqui a um mês, as autoridades públicas baterem na porta e impedirem a plena exploração da atividade”, explicou Seckelmann.