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Como é a Copa dos coadjuvantes?

No final das contas, a primeira fase do Mundial é feita para o enorme público que torce por seleções sem nenhum favoritismo no torneio

Muito se conhece sobre os torcedores brasileiros que viajam para as Copas cheios de esperança, apostando todas as fichas que assistirão à nossa seleção em uma ou mais partidas em busca de mais uma taça. O mesmo acontece com os argentinos, alemães, franceses, espanhóis, entre outros torcedores das seleções protagonistas da Copa. No entanto, é muito interessante observar como se comportam os torcedores das zebras do Mundial. Tive a oportunidade de assistir a País de Gales x Irã e Polônia x Arábia Saudita. Vamos combinar que nenhuma dessas seleções tem maiores expectativas, mas todas trouxeram apoiadores para cá.

Os sauditas simplesmente invadiram o Catar depois da surpreendente vitória contra a Argentina. Nas ruas, os torcedores perguntavam a todos os turistas que não trajavam camisas alvicelestes: “Where’s Messi?” (“Cadê o Messi?”, em tradução livre). Depois, apontavam para seus bolsos vazios, dando sonoras gargalhadas.

O estádio foi pintado de verde, e o hino foi cantado a plenos pulmões por dezenas de milhares de torcedores orgulhosos, esperançosos por repetir a zebra contra a Polônia. Infelizmente para eles, a seleção de Lewandovski jogou água no chope sem álcool dos árabes, que pelo menos não vieram de tão longe. Muitos moram no Catar e outros vieram de carro, já que a Arábia é o único país que faz fronteira com o país-sede. Depois do jogo, nas ruas, mesmo com a derrota, a torcida continuava enrolada em suas bandeiras e camisas verdes, com uma sensação de terem jogado de igual para igual com as duas seleções favoritas do grupo.

Já o duelo entre galeses e iranianos, os torcedores dos dois times eram minoria no estádio, cheio de fãs de outras nacionalidades, que conseguiram comprar esse único ingresso, menos procurado que os dos jogos entre as grandes seleções. O que era para ser um jogo pouco interessante se mostrou uma partida em que os iranianos corriam atrás da bola como quem faz o jogo mais importante de suas vidas e foram recompensados com a vitória com dois gols nos acréscimos. Mesmo com a derrota, a torcida do País de Gales aplaudiu seus jogadores no final do jogo e, numa atitude surpreendente, aplaudiu também os jogadores do Irã por sua entrega e conquista.

Conversando com torcedores desses países, percebi algumas similaridades:

  • todos eles compraram ingressos para assistir a um ou três jogos da sua seleção. Se o time passar para a segunda fase, será um bom problema logístico a resolver, mas sem nenhuma expectativa quanto a isso;
  • conseguiram comprar ingressos sem maiores dificuldades, sem precisar recorrer a cambistas ou comprar na última hora. Mexicanos, argentinos e brasileiros muitas vezes não tiveram a mesma sorte, e a venda de ingressos corre solta nos grupos de WhatsApp;
  • a maioria vem em grupos de amigos aproveitando a “desculpa” da Copa para conhecerem um país normalmente fechado que está recebendo de braços abertos israelenses, jovens com roupas decotadas ou quem gosta de ir para a praia com sunga ou biquíni;
  • mais importante que os jogos, esses grupos gastam bastante tempo (e dinheiro) com turismo. O mercado central de Doha, chamado de Souq Waqif, vive apinhado de gente comprando, comendo, usando camisas de futebol e dando risadas, mesmo depois que a seleção de alguns torcedores tenha perdido um jogo importante.

No final das contas, a primeira fase da Copa é feita para esse enorme público. Das 32 seleções, possivelmente 26 delas vieram sem grandes esperanças, bem como seus torcedores. E é principalmente para eles que o país se preparou, esperando que se transformem em formadores de uma opinião positiva quando voltarem para casa, podendo contar para os amigos que o Catar conseguiu oferecer um clima amistoso, tolerante e organizado. Se os governantes decidirem se manter nesse caminho, quem sabe se torne um destino cada vez mais interessante para outros turistas pós-Copa?

Falyakun!