Sempre que chega minha semana de escrever aqui na Máquina do Esporte, busco falar sobre algum tema que esteja em alta no mercado e tenha sido assunto nos dias que antecederam a publicação do meu texto.
Dessa vez, não será diferente. E quero falar sobre uma declaração forte dada pelo presidente do Fortaleza.
Na última segunda-feira (19), Marcelo Paz, por quem tenho grande admiração, soltou a seguinte frase.
“A gente está vivendo um mercado no futebol brasileiro prostituído. Um mercado em que a palavra não vale mais para algumas pessoas, e isso a gente tem visto em algumas das operações que a gente tentou no Fortaleza”, disse o dirigente.
Confesso que fiquei bastante surpreso com essa declaração, justamente por vir de um dirigente que entendo ser um dos mais capacitados para a função, hoje, em atividade, no Brasil.
Quando digo surpreso, não é por ser uma novidade para mim, mas sim por saber que isso acontece no mundo do futebol há tempos. E por isso a estranheza de uma declaração dessa partindo de um presidente com o gabarito do Marcelo Paz.
Comecei a trabalhar diretamente com futebol em 2011, quando entrei no Fluminense, e, já nessa época, vi situações constrangedoras, mas que não saíam dos bastidores.
Obviamente isso não começou em 2011. Muito antes de eu existir, há relatos e relatos de situações nas quais o dinheiro falava muito mais alto do que a palavra de quem já estava “acertado”.
Um dos caras com quem eu mais aprendi sobre futebol foi Rodrigo Caetano, que recentemente assumiu a diretoria de seleções da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Nunca vou esquecer a vez que ele me ligou e disse:
“Murrinha (forma carinhosa como ele me chama), prepara tudo que puder para anunciarmos o ‘fulano’. Tem que ser anúncio grande, mas presta atenção: não solta nada sem o meu OK”, ponderou.
Desliguei e acelerei o nosso time para deixar tudo pronto. Dias depois, o tal “fulano” foi anunciado por outro time.
Na mesma hora, liguei para o Rodrigo e perguntei o que tinha acontecido. E ele me falou uma frase que levo comigo em todas as negociações até hoje:
“No futebol, só está fechado quando está assinado”, cravou.
E infelizmente isso é um fato.
A palavra não tem peso no futebol brasileiro. Quantas vezes eu vi negociações de patrocínio estarem “fechadas” e, depois do OK dado, minutas de contrato sendo trocadas, uma novidade inesperada aparece como uma “proposta irrecusável”.
Não adianta. O dinheiro fala mais alto, sempre.
Raros foram os momentos que vi o acordo ser mantido em situações de conflito financeiro (proposta maior chegando após o acordo apalavrado).
Para surpresa de muitos, quem era muito ponta firme com isso era o saudoso Eurico Miranda.
Esse, se falasse que tava fechado, tava fechado mesmo, não precisava nem de contrato.
Quantas vezes vimos noticias do famoso “chapéu no rival”? Jogadores que tinham tudo encaminhado com determinado clube, mas, na hora de finalizar o processo, acabavam sendo anunciados pelo grande rival?
Obviamente que o empresário que tinha 10 no clube A, foi em busca de 11 ou 12 no clube B e conseguiu.
Estamos numa era tão complexa no futebol que, se a palavra não tem peso e significado, um contrato assinado também pode não ter, visto que quem assina o contrato parte do princípio de que ele irá até o final. E, hoje em dia, ter contrato também não garante estabilidade “por ter o contrato”.
Quando analisamos o mundo das apostas, há uma busca incessante por multas de contrato, justamente pra entender quais os valores para tirar quem está lá.
É óbvio que pagar a multa do contrato faz parte de cláusulas contratuais, não tem nada de errado nisso. Mas tem muito a ver com a declaração do Marcelo Paz, de um “mercado prostituído”.
“Não importa se meu contrato é de 10 e vai até o final de 2025. Se me pagarem mais agora e pagarem a multa, eu troco”.
Ou seja, relações fracas e frias. Instabilidade para todos os lados.
O mais triste dessa história é que quem ri um dia, chora no outro, e esse ciclo não tem fim. E assim o futebol brasileiro vai se desenvolvendo aos trancos e barrancos.
Bernardo Pontes, executivo de marketing com passagens por clubes como Fluminense, Vasco, Cruzeiro, Corinthians e Flamengo, é sócio da Alob Sports, agência de marketing esportivo especializada em intermediação e ativação no esporte, que conecta atletas e personalidades esportivas a marcas, e escreve mensalmente na Máquina do Esporte