Prática relativamente recente no Brasil, a venda de naming rights de estádios ganhou força nos últimos anos, graças a uma série de acordos firmados em São Paulo, principalmente, e também no Nordeste, no Centro-Oeste e em Minas Gerais.
Passados 20 anos desde que essa propriedade começou a ser negociada por clubes brasileiros, o país conta com dez acordos em vigor (poderiam ser 11, se a Viva Sorte não houvesse aberto mão do naming right da Vila Belmiro).
Por ironia ou obra do acaso, o Athletico-PR, pioneiro nesse tipo de negociação, deixou de usar a marca Ligga no nome da Arena da Baixada.
Oficialmente, porém, esse contrato ainda não foi rescindido e portanto deve ser contabilizado entre as parcerias vigentes.
Atualmente, o estado de São Paulo concentra 50% dos acordos de naming right do futebol brasileiro. Os demais contratos estão espalhados por diferentes unidades da federação.
Estes são os acordos de naming right hoje em vigor no futebol brasileiro:
Casa de Apostas Arena Fonte Nova
Casa de Apostas Arena das Dunas
Arena MRV (Atlético-MG)
Arena BRB Mané Garrincha
Arena Nicnet (Botafogo-SP)
Mercado Livre Arena Pacaembu
Morumbis (São Paulo)
Allianz Parque (Palmeiras)
Neo Química Arena (Corinthians)
Ligga Arena (Athletico-PR)
Dos dez contratos em vigor, apenas um, o do Morumbis, não é em uma arena. Para Sergio Schildt, vice-presidente da Associação Brasileira da Indústria do Esporte (Abriesp), o conforto e as novas opções de entretenimento contribuem diretamente para que um novo público também possa se interessar em frequentar o ambiente.
“A modernização dos estádios transformou a ida ao jogo em uma experiência muito mais ampla, que vai além do futebol e contempla toda a família. As arenas contemporâneas oferecem estruturas completas, com restaurantes, camarotes sofisticados, serviços de bem-estar e uma programação diversificada, incluindo shows e grandes eventos. Isso agrega valor não apenas para o público, mas também para a marca que detém os direitos de naming daquele espaço”, afirma Schildt, que é também presidente da Recoma.
História
O mais longevo e conhecido desses contratos é o do Allianz Parque, que adotou o nome da seguradora alemã em 2013, antes mesmo de concluída a reformulação do estádio palmeirense.
Um dado curioso é que, durante décadas, o Palestra Itália, antigo estádio do Palmeiras, esteve associado a uma marca, sendo chamado popularmente de Parque Antarctica.
Esse caso, porém, nada tinha a ver com naming right. Na verdade, o terreno onde o estádio foi construído abrigou durante vários anos, no início do século passado, um complexo esportivo pertencente à Cervejaria Antarctica, empresa que hoje integra o conglomerado AB Inbev.
Em 1920, o clube, que já mandava seus jogos no local, resolveu adquirir o terreno do Parque Antarctica, onde seria construído o Estádio Palestra Itália, com mesmo nome da equipe, que mais tarde, durante a 2ª Guerra Mundial, precisou virar Palmeiras, por determinação do governo de Getúlio Vargas.
Apenas neste século, já totalmente reformulada, é que a arena palmeirense teria seu nome negociado pelo clube.
Mas este caso não é pioneiro em matéria de naming right, no país. Esse posto cabe à Arena da Baixada, em Curitiba (PR).
Em 2005, o Athletico-PR, dono do estádio, fechou acordo com a japonesa Kyocera, que passou assim a batizar a Arena da Baixada.
“A ideia dessa mídia alternativa nasceu antes mesmo da reforma da Baixada. É uma maneira a mais de conseguirmos renda, que hoje vem da bilheteria, outros patrocínios e da televisão. Lamentavelmente, passamos seis anos procurando um parceiro”, declarou, durante a apresentação do acordo, Mauro Celso Petraglia, presidente do clube.
Esse contrato pioneiro, firmado há 20 anos, aparentava ser promissor, mas enfrentou uma série de obstáculos.
Naquele ano, o Athletico-PR (ainda sem “h” no nome) conseguiu chegar à final da Copa Libertadores. Dessa forma, a Kyocera Arena seria palco do jogo de ida da decisão do principal torneio de futebol do continente.
Esse fato, porém, não se concretizou, já que o São Paulo, com regulamento da competição embaixo do braço, manobrou junto à Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) para impedir que o estádio em Curitiba sediasse a partida.
A regra exigia capacidade mínima de 40 mil lugares para estádios nas partidas finais. A alternativa encontrada pelo Athletico-PR, de instalar arquibancadas tubulares para o jogo, não foi aceita, e assim a ida da decisão ocorreu no Estádio do Beira-Rio, em Porto Alegre (RS), com empate em 1 a 1.
Mas esse nem foi grande obstáculo enfrentado pelo primeiro acordo de naming right da história do futebol brasileiro. Um dos principais problemas consistia na resistência dos veículos de comunicação, em especial as emissoras de TV (que concentravam a maior audiência do país), em utilizar o nome da marca patrocinadora do estádio.
Dessa forma, nas transmissões e reportagens a Kyocera Arena se tornava fatalmente Arena da Baixada. Esse entrave chegou a ser citado por dirigentes do Athletico-PR, durante a entrevista coletiva concedida em 2023, para anunciar o acordo com a empresa de telecomunicações Ligga, que assumiu os naming rights do estádio do clube.
A postura da mídia mudou em tempos recentes, sobretudo depois que clubes como Palmeiras e Corinthians firmaram contratos de venda de naming rights de seus estádios. A partir daí, os nomes patrocinadores das arenas passaram ser citados nas transmissões e na cobertura das competições.
Como o primeiro acordo da história chegou ao fim
O primeiro acordo de naming right da história do futebol brasileiro, entre Athletico-PR e Kyocera, durou apenas três temporadas e chegou ao fim em março de 2008.
Conforme noticiou à época a Máquina do Esporte, o clube havia recebido R$ 5 milhões pelo contrato com a empresa, mas desejava dobrar esse valor para prorrogar a parceria por mais dois anos.
O argumento era de que a marca teria sua exposição ampliada, uma vez que o estádio seria uma das prováveis sedes da Copa do Mundo de 2014, já confirmada para ocorrer no Brasil.
A Kyocera, por sua vez, pretendia reduzir as quantias pagas ao clube, sob o argumento de que ele havia deixado de disputar competições internacionais. O contrato, de três anos de duração, trazia cláusulas que exigiam esse desemprenho esportivo por parte do Athletico-PR.
No ano que marca as duas décadas do início dessa parceria pioneira, o clube está em vias de encerrar outro acordo de naming right.
No início deste mês, o Athletico-PR deixou de usar o nome Ligga Arena em suas comunicações oficiais, voltando a chamar o estádio de Arena da Baixada.
A decisão teria sido motivada por suposta inadimplência da empresa de telecomunicações. Até hoje a equipe não se pronunciou formalmente sobre o caso. Em comunicado à imprensa, a Ligga declarou estar surpresa com a suspensão do naming right e disse que negocia a questão com o clube.
Valores dispararam
Em comparação ao acordo pioneiro firmado entre Kyocera e Athletico-PR, os atuais contratos de naming right em vigor no Brasil adotam prazos mais longos e valores bem mais substanciais.
O do clube paranaense com a Ligga, por exemplo, deveria ter duração mínima de 15 anos e renderia ao clube R$ 200 milhões.
No Pacaembu, em São Paulo (SP), o contrato com o Mercado Livre está previsto para durar 30 anos, rendendo a quantia global de R$ 1 bilhão.
Nos casos de Allianz Parque, do Palmeiras, e Neo Química Arena, do Corinthians, os acordos são de 20 anos de duração e valem R$ 300 milhões cada.
No Atlético-MG, o contrato de naming right da Arena MRV terá inicialmente dez anos de vigência, rendendo R$ 71,8 milhões ao clube.
Uma exceção nesse cenário envolve o São Paulo, que firmou um contrato de apenas três anos com a Mondelez para a venda do naming right do Estádio do Morumbi, que passou a se chamar Morumbis, em alusão à marca de snacks.
Os números desse negócio, que é válido até 2026, não foram anunciados oficialmente, mas os valores globais divulgados pela imprensa giram em torno de R$ 75 milhões.
“É fundamental que clubes e empresas compreendam os ganhos estratégicos proporcionados pelas parcerias. Os estádios configuram-se como ativos de grande valor no ecossistema esportivo, e a comercialização dos naming rights representa uma relevante fonte de receita para as instituições. O investimento no esporte contribui para o fortalecimento das experiências oferecidas ao público, seguindo práticas consolidadas em mercados desenvolvidos, como o norte-americano”, diz Ivan Martinho, professor de marketing da ESPM.
Setor de apostas
Predominantes no patrocínio máster de uniformes, as empresas de apostas ainda têm presença tímida nos acordos de naming right firmados no Brasil.
Por enquanto, a Casa de Apostas é a única a investir nesse tipo de propriedade, com dois contratos em vigor, o da Fonte Nova, em Salvador (BA), e o da Arena das Dunas, em Natal (RN).
“A evolução do processo de profissionalização do futebol nos últimos anos, somada ao expressivo potencial de geração de receitas das arenas, foram fatores decisivos na escolha pela aquisição dos naming rights tanto da Fonte Nova quanto da Arena das Dunas. São dois equipamentos multifuncionais, com infraestrutura de alto padrão, preparados para receber grandes shows e sediar partidas de competições nacionais e internacionais, sejam de clubes ou seleções”, afirma Anderson Nunes, responsável pela área de negócios da empresa.
Como surgiu a exploração dos naming rights
O negócio envolvendo a venda de naming rights de estádios e ginásios surgiu nos Estados Unidos, na década de 1970.
O primeiro registro dessa prática é de 1973, quando a Rich Products Corporation agregou sua marca ao Buffalo Memorial Auditorium, que passou a se chamar Rich Stadium.
O espaço, localizado na cidade de Buffalo (estado de Nova York), costumava sediar jogos do Buffalo Bills, da NFL, e do Buffalo Sabres, NHL (que hoje atua no KeyBank Center), além de receber partidas de basquete universitário, shows e lutas.
Em 1999, após o fim desse contrato com a Rich, Ralph C. Wilson Jr., presidente e dono do Buffalo Bills, aproveitou a oportunidade para se auto-homenagear.
E assim a arena passou a se chamar Ralph Wilson Stadium. Hoje, os naming rights do estádio pertencem à empresa de saúde Highmark.
Na atual temporada da NFL, todas as arenas utilizadas nos Estados Unidos possuem acordo de naming rights. Entre elas o MetLife Stadium, em Nova Jersey, que também sediará a final da Copa do Mundo de Clubes, em 13 de julho.
Considerando-se os jogos realizados no exterior, apenas Wembley e o Tottenham Hotspur Stadium, na Inglaterra, não possuem um nome comercial.
Um detalhe curioso é que, de todos os estádios que contam com acordo de naming right, a Neo Química Arena é a única que não teve o nome do patrocinador divulgado nas comunicações oficiais da NFL.
O local, que é denominado pela liga de futebol americano como Corinthians Arena, sediará a partida entre Los Angeles Chargers e Kansas City Chiefs, em 5 de setembro. No ano passado, a Neo Química Arena recebeu o confronto entre Green Bay Packers e Philadelphia Eagles.