A frase que gerou ampla repercussão no esporte, proferida pelo técnico Ramón Díaz, do Internacional, após o empate por 2 a 2 contra o Bahia, no último sábado (8), em jogo válido pelo Brasileirão, é o ponto de partida para uma discussão que vai muito além das quatro linhas.
“Futebol é para homens, não para meninas”.
O impacto da fala atinge não apenas a comunidade do clube, mas toda uma parcela da sociedade que luta diariamente por igualdade e representatividade.
A frase foi dita com o intuito de cobrar força dos jogadores. Mas esta fala não reforça coragem; ela reforça preconceito.
Ao usar o feminino como símbolo de fraqueza, o líder destaca qual é a sua compreensão de força e enfatiza que são características que não podemos ver em mulheres, reforçando antigos estereótipos.
Para líderes de um clube que tem uma grande marca como o Internacional, esse ato seria, mais que um equívoco, uma demonstração de desconhecimento da realidade do mercado e do quanto a voz de um líder pode gerar consequências impactantes.
Ser técnico de futebol é ocupar um dos cargos mais complexos do esporte. Não é apenas montar um time; é conduzir pessoas sob pressão permanente, diante de milhões que observam cada palavra, cada gesto, cada escolha.
Para além das responsabilidades em campo, o técnico de futebol está investido deste lugar de fala pelo clube, ainda que a sua atribuição e as expectativas sobre o seu desempenho sejam principalmente técnicas. Ele representa uma instituição que atravessa décadas, comunidades e identidades. E quem está neste papel tem a obrigação de zelar por seus valores.
O Internacional carrega uma história que inspira, e as mulheres são, desde sempre, parte essencial desse legado. O clube ostenta um profundo pioneirismo social, sendo detentor da primeira sócia mulher do futebol brasileiro (Maria Von Ockel, em 1918) e, frequentemente, com o maior número de sócias do país.
Liderar é saber que a irresponsabilidade de uma única frase traz impactos, provoca ações, gera prejuízo financeiro e afeta diretamente patrocínios e a base de sócios.
Liderança é ter consciência da força da própria voz. A palavra e a narrativa de um líder também são ativos de negócios.
Palavra constrói cultura.
E cultura ganha jogo – ou perde. Não só nos 90 minutos, mas na credibilidade e na sustentação da marca no mercado.
O futebol não precisa que homens provem que são homens.
Precisa que profissionais provem que são líderes.
O artigo acima reflete a opinião do colunista e não necessariamente a da Máquina do Esporte
Liana Bazanela é cofundadora da Hoc Sports
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