Nenhum profissional do futebol se expõe tanto como o técnico. São eles que falam antes e depois das partidas. Carregam a responsabilidade de representar a equipe para as câmeras, mais do que qualquer atleta, por maior que seja o ídolo. Nem o presidente tem a imagem tão associada a um clube quanto o treinador. Mas, aparentemente, pouquíssimos têm qualquer tipo de preparo para tamanho peso.
O que se tem visto constantemente, no Brasil e no mundo, é um show de horror na frente das câmeras. No último sábado (13), o maior representante do despreparo foi Vitor Pereira. O comandante do Corinthians afirmou que não tinha medo de ser demitido. “Sabe quanto dinheiro eu tenho no banco, meu amigo?”, respondeu o treinador a um jornalista que perguntou sobre um possível medo de demissão após maus resultados em campo.
Além da arrogância surreal, a fala é um atropelo ao clube que se posiciona como “do povo” e que tem a raça como principal bandeira de posicionamento. O maior representante público do time mostra total desalinhamento com seu empregador.
Vitor Pereira se retratou em seguida. Disse ter reagido “a quente” após a derrota sofrida para o rival Palmeiras. Ok, justo. Mas então era melhor se calar. Essa, aliás, não foi a primeira vez que ele teve que pedir desculpas por uma entrevista coletiva; o treinador já disse que queria mesmo era ser técnico do Liverpool.
Ainda no fim de semana, houve mais uma entrevista complicada de Cuca, técnico do Atlético Mineiro, que carrega em sua carreira uma enorme dificuldade em perder. Sobrou ironias a Abel Ferreira, do Palmeiras, que venceu a disputa da Libertadores com dois jogadores a menos em campo.
Trata-se do mesmo Abel Ferreira que já disse que “o Brasil carece muito na formação do homem”. O mesmo que já foi vítima de uma desastrosa demonstração de xenofobia por parte de Jorginho, treinador do Atlético Goianiense. Um preconceito que deveria ser rebatido com ênfase em qualquer clube de futebol.
A lista de casos vai longe. Até a seleção brasileira já teve técnico que xingou jornalista ao vivo em entrevista coletiva. Dunga, que chamou Alex Escobar, da Globo, de “cagão”, não foi demitido por isso. Foi, por sinal, recontratado pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF) poucos anos depois. Se atualmente Tite é tão cuidadoso nas palavras, a atitude parte exclusivamente de sua consciência sobre a responsabilidade do cargo, não de cuidados de gestores.
A briga entre Thomas Tuchel e Antonio Conte, também neste fim de semana, na Premier League, mostra que o problema não é exclusividade do futebol brasileiro. Mas o espetáculo ridículo em gramados internacionais não tira o peso do que se vê no país.
Os clubes precisam, com urgência, repensar que tipo de imagem querem passar quando as câmeras começam a gravar. Com atletas e dirigentes, a missão parece mais simples. Com técnicos tarimbados, parece que há uma carta branca que não faz nenhum sentido.
Declarações que desrespeitam marcas, empregadores e consumidores são banidas em qualquer grande empresa. Está na hora dos clubes pensarem além do que é feito em campo na hora de contratar aquele que, além de treinar, falará quase diariamente sobre a equipe.
Duda Lopes é CEO da Pivô Comunicação e escreve mensalmente na Máquina do Esporte