Papel é um artigo em extinção nos grandes eventos desportivos dos EUA. Já não existe mais ingresso físico ou impresso. Todo e qualquer tíquete de entrada é 100% digital, sendo obrigatória a sua leitura dentro de um telefone celular. Se por acaso quiser enviar um ingresso para alguém, esse processo deverá também ser feito de maneira on-line.
Mas não é só o papel do ingresso que já não se vê mais nos estádios e arenas da América do Norte. O dinheiro em moeda também foi banido das grandes instalações esportivas. Os estádios são chamados de “cashless”, ou seja, todo e qualquer pagamento deve ser processado de maneira digital, através de cartão ou outros meios de pagamento eletrônico, muitas vezes dentro mesmo do super app do estádio.
O desaparecimento do papel segue também nos estacionamentos, que já não usam mais os tíquetes cuspidos das catracas, substituídos por QR Codes lidos dentro de um celular.
A troca do papel por transação digital não parece ser um tema de sustentabilidade, mas um processo natural de mudança do comportamento do torcedor somado à necessidade de gestores em conhecer cada vez mais o seu consumidor através da análise dos dados obtidos em cada transação eletrônica. Aqui também podemos somar outros aspectos, como a melhoria da experiência de consumo e a segurança de não existir mais a necessidade de movimentação grandes quantias de notas.
Nós, consumidores, deixamos rastros (dados) em cada transação feita. Em um dia de jogo, largamos para trás centenas de marcas eletrônicas. Se for feita uma boa análise desses dados, é capaz de fazer um detalhamento completo da jornada de cada torcedor. Em que momento os ingressos são comprados, com quem a pessoa costuma ir aos jogos, de que maneira ela vai, que horas chega, o que consome antes e no intervalo das partidas, e muitas outras perguntas podem ser respondidas minuciosamente.
Esse processo se chama Business Intelligence (BI), isto é, o procedimento de capturar, analisar e transformar os dados em estratégias que guiam as tomadas de decisão. O BI que já faz parte do DNA das grandes marcas do mundo também é amplamente adotado nos estádios e arenas dos EUA.
Como isso funciona na prática? Vou exemplificar com uma experiência pessoal. Eu fui duas vezes em jogos de beisebol no mesmo estádio, nas duas ocasiões comprei cachorros-quentes. No dia seguinte ao segundo jogo, como de praxe, recebi um e-mail marketing com chamadas e informações sobre a próxima partida, mas dessa vez já não se tratava de uma publicidade genérica. Era um convite personalizado, com o meu nome e surpreendentemente (ou não) um voucher de desconto para a compra de cachorros-quentes no próximo jogo. Na verdade, cada pessoa do meu grupo de amigos recebeu uma publicidade/promoção diferente, todas voltadas aos seus perfis de consumo.
A análise dos dados deixados por cada um dos milhares de torcedores permite que estádios e arenas consigam desenvolver um profundo conhecimento do seu consumidor, podendo oferecer experiências customizadas. É através de informações adquiridas diretamente com os torcedores, seja por análise de dados ou pesquisas de mercado, que os estádio norte-americanos estão na vanguarda de serviços e espaços oferecidos aos torcedores. Por isso que, por aqui, encontramos camarotes com piscinas, espaços “all you can eat” (comida liberada), lounges com super DJ’s, espaços famílias, variação enorme de opções de alimentos e bebidas, entre outras atividades e áreas que são cuidadosamente desenvolvidas para atender as reais demandas e necessidades dos torcedores.
O uso inteligente de dados pode significar um faturamento extraordinário de receitas de dia de jogo, Afinal de contas, cada torcedor é diferente dos outros e, por isso, suas necessidades são distintas. Entender o consumidor por meio de dados oferecidos por eles próprios e tomar decisões baseadas nesse conhecimento é o grande segredo do sucesso das maiores instalações esportivas dos EUA.
Romulo Macedo é chefe de operações de mídia da Copa América 2024 e escreve mensalmente na Máquina do Esporte