Nossas vidas foram tomadas de assalto pelo universo digital nas últimas décadas. Não quero chover no molhado e ser redundante, mas o mundo dos Jetsons é, na verdade, o mundo em que vivemos hoje. E no esporte, esse microcosmo que tanto reflete a sociedade, isso também é verdade.
O conceito de ordem na indústria esportiva em 2023 foi a inteligência artificial. A famosa IA talvez já estivesse presente há algum tempo nos campos e quadras mundo afora sem que tivéssemos muita consciência de sua existência, por meio de programas que auxiliavam a monitorar a performance de atletas e equipes, além da integração das estatísticas com as transmissões de TV. Agora, a IA foi parar na arquibancada e mediar a relação com os fãs, além de auxiliar na monetização de iniciativas nas plataformas digitais.
Ao longo de 2023, o tema IA foi largamente abordado nos diferentes eventos dos quais pude participar na Europa: Sportel, SportsPro Summit, Major Events International Summit e Smart Cities & Sports, entre alguns outros. Mais um caminho irreversível, sobretudo se pensarmos que os Jogos de Los Angeles 2028 chegaram a cogitar ter dois estádios para sua Cerimônia de Abertura, um com o espetáculo ao vivo e o outro, o Estádio Olímpico de 1984, com o público acompanhando a ação por intermédio de realidade virtual.
A bola da vez é a IA como geradora de conteúdo (não apenas texto) e catalisadora de engajamento. Organizações esportivas estão começando a enxergar esse ainda polêmico mundo robótico como um caminho eficiente e muitas vezes de custo não tão alto como forma de otimizar processos, bem como recursos humanos e financeiros.
De acordo com a última PWC Sports Survey, entre 2015 e 2023, houve uma considerável mudança no consumo de vídeos pelos fãs de esporte. Enquanto o conteúdo ao vivo caiu de 7:44 para 6:22, os melhores momentos (highlights) nas mídias sociais passaram de 1:17 para 3:34, um aumento de 177%. O que obviamente reverbera em um aumento de 220% em receitas no ambiente digital, segundo uma apresentação da agência N3XT Sports, uma das propulsoras da revolução em curso. Só isso já justifica essa corrida pelas soluções de IA para a produção multiplataforma de conteúdos.
A IA já é capaz de produzir leiautes para mídias sociais e clipes de vídeos a partir de imagens de arquivo, embalando dados e conhecimento de forma mais acessível para diversos públicos no sentido de transformá-los em mais compreensíveis, precisos, customizáveis e, sobretudo, encontráveis com maior facilidade. O que antes era um “elefante branco” nos bancos de dados, apenas ocupando terabytes de memória, hoje pode ser aproveitado para alavancar a interação com o público nas redes sociais, proporcionando um saboroso conteúdo “always on”. Um caminho que já começou a ser trilhado por gigantes como a NBA, a Federação Internacional de Vôlei (FIVB) e a Federação Internacional de Basquete (Fiba), por exemplo.
Alguns desafios ainda se impõem, obviamente, como a confiabilidade dos resultados finais (o olhar humano ainda é fundamental para polir os produtos que são frutos da IA) e a profusão de serviços oferecidos. Mas o fato é que o mundo virtual é cada vez mais o mundo real.
Manoela Penna é consultora de comunicação e marketing, e escreve mensalmente na Máquina do Esporte