Provocação não paga a conta: Por que o boca a boca positivo é o caminho para o sucesso

Proselitismo usado no Twitter (hoje X) do Internacional em novembro de 2013 - Reprodução / X (@SCInternacional)

O mundo dos esportes está em constante transformação, exigindo que clubes e organizações invistam cada vez mais em gestão profissional e estratégias de marketing inovadoras para fortalecer a conexão com os torcedores.

Pensando nisso, durante o mestrado/doutorado, meu colega George Alba e eu nos dedicamos a investigar um tema inédito na época: as diferentes formas de comunicação promovidas pelos clubes e o impacto disso no desempenho organizacional. Identificamos duas abordagens principais: o boca a boca positivo, marcado por uma recomendação amigável e autêntica, e o proselitismo, caracterizado pela exaltação da superioridade do próprio clube, frequentemente acompanhado por provocações como “tocar flauta” em rivais.

Embora o boca a boca positivo impulsione o consumo e o engajamento dos torcedores, muitos clubes ainda apostam no proselitismo para aquecer as redes sociais. Mas será que essa provocação realmente traz um retorno financeiro?

O poder do boca a boca no esporte

O boca a boca no contexto esportivo é uma recomendação amigável, em que os torcedores compartilham experiências positivas do clube e ajudam a criar uma imagem atraente da equipe. Na prática, isso se reflete em ações que incentivam o consumo e a presença nos jogos. Clubes como Flamengo e Palmeiras, por exemplo, investem em programas de afiliação e iniciativas de engajamento, como as embaixadas de torcedores, para fortalecer esses vínculos. Essas ações reforçam a identificação amigável com a marca e estimulam os torcedores a compartilharem sua paixão com amigos e familiares, gerando um efeito de rede que aumenta a frequência nos estádios e as vendas de produtos licenciados.

Empresas como Nike e Adidas já perceberam o valor econômico de uma base de fãs engajada e positiva. A Nike, por exemplo, investe em campanhas que promovem a identificação pessoal com os atletas e times que patrocina, criando um “fã ativo” que não só consome, mas recomenda seus produtos. Quando o estado emocional do torcedor é positivo e ele se sente parte do clube, percebemos que ele é mais propenso a participar ativamente, comprando produtos oficiais e comparecendo aos jogos.

“Tocar flauta”: Um tiro pela culatra?

O proselitismo representa um esforço intenso para converter torcedores, frequentemente à custa de uma relação mais amistosa com os rivais. Marcado por provocações como “tocar flauta” ou “sacanear”, esse comportamento expressa emoção e lealdade, mas será que gera o retorno financeiro esperado?

Na nossa pesquisa, realizamos um levantamento de dados quantitativos com 237 torcedores de clubes brasileiros, incluindo Grêmio, Internacional e Flamengo. Com o uso de uma modelagem estatística robusta, confirmamos que o boca a boca positivo, com seu tom amigável, está associado a intenções de comportamento de gastos com o clube e ao comparecimento aos jogos, enquanto o proselitismo não demonstrou relação significativa com esses resultados.

Proselitismo usado no Twitter (hoje X) do Palmeiras em novembro de 2021 – Reprodução / X (@Palmeiras)

Embora nossa pesquisa não tenha focado nos porquês desses resultados, uma das explicações é o impacto emocional de cada abordagem. O boca a boca positivo, associado a experiências agradáveis e sentimentos de pertencimento, gera uma disposição maior para agir: torcedores se sentem motivados a frequentar jogos, comprar produtos e participar de atividades do clube. Por outro lado, o proselitismo, que envolve provocações e uma postura mais agressiva, tende a gerar sentimentos menos convidativos, o que pode acabar inibindo ações de consumo.

Esses achados sugerem que, apesar da paixão envolvida, a agressividade e a competição exacerbada no discurso tendem a afastar tanto torcedores quanto potenciais consumidores. Para os gestores esportivos, isso destaca a importância de se cultivar um ambiente de apoio positivo, incentivando um comportamento que projete uma imagem amigável e acolhedora do clube. Clubes europeus, como o Barcelona, têm investido há anos em campanhas como as da Barça Foundation, que promovem inclusão e respeito, atraindo torcedores de perfis variados. Ao adotar valores que ressoam com o público moderno, os clubes podem construir um ambiente mais engajado, com torcedores dispostos a investir tempo e dinheiro no clube de forma consistente.

Oportunidade para profissionais qualificados

Nossa pesquisa destaca a necessidade de uma gestão qualificada, com profissionais capacitados em marketing esportivo e comportamento do consumidor. O curso de Administração de Empresas da ESPM, com seu ecossistema de ensino em esporte e iniciativas como o Eleva, hub de negócios e marketing do curso, desempenha um papel essencial na formação de profissionais que compreendem as nuances do comportamento dos torcedores e a importância de um marketing estratégico sólido.

Enquanto o proselitismo intensifica rivalidades, não encontramos evidências empíricas de que ele agregue valor econômico significativo. Clubes que se engajam em práticas como “tocar flauta” nos rivais deveriam reconsiderar essas ações e buscar direcioná-las conforme as melhores práticas da literatura especializada, focando em abordagens que promovam uma relação positiva com os torcedores.

Para clubes e patrocinadores, investir em estratégias que incentivem o boca a boca positivo não é apenas uma questão de paz nos estádios; é também uma estratégia que contribui para uma performance superior e resultados financeiros duradouros.

Rafael Laitano Lionello é professor de Marketing Analytics (Análise de Marketing) no curso de Administração de Empresas da ESPM, onde lidera a área de ADM Metrics, focada no desenvolvimento de índices e métricas para o mercado

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