Após a publicação da coluna no mês passado, em que apontei o caminhão de dinheiro que os clubes estão jogando pelo ralo mantendo uma taxa de ocupação média menor que 30% nos estádios, algumas pessoas me questionaram de que maneira poderíamos, então, encher os jogos de futebol pelo país.
A primeira parte da solução começa pela conscientização de clubes e federações de que, de fato, há um problema de baixa presença de torcedores nos estádios. Infelizmente, no Brasil, existe uma assustadora normalização dos estádios vazios, e aqui incluo nós, torcedores. Parece que ninguém se incomoda em ver um jogo, seja ao vivo ou pela TV, com quase a totalidade dos assentos desocupados.
Segundo um relatório da Pluri Consultoria publicado pela coluna Lance!Biz em 24 de dezembro do ano passado, a taxa de ocupação média da principal competição esportiva do Brasil, a Série A do Brasileirão, foi de apenas 49%. Esse número é extremamente preocupante se comparamos com os 95% de ocupação média das grandes ligas europeias. O que sinaliza claramente que temos um problema de baixo público nos estádios no “país do futebol”.
Após superada a primeira parte da solução, clubes e federações devem aplicar a seguinte fórmula “matemática”: Público no estádio = Conteúdo² + Experiência.
Na equação, o “Conteúdo” está ao quadrado propositalmente porque, de fato, é o elemento mais importante para atrair torcida a um estádio de futebol. Espetáculos com melhor qualidade, por via de regra, atraem mais espectadores. Por exemplo: um concerto do Coldplay esgota os ingressos com meses de antecedência, enquanto se esse escritor aqui resolver fazer um show, sem cobrança de ingresso, é capaz de não conseguir atrair o interesse nem da própria família. É notório que a importância do jogo e o nível do adversário influenciam na quantidade de público no estádio.
No entanto, se levarmos em consideração que o brasileiro segue absolutamente apaixonado por seus clubes e que a audiência televisiva do Brasileirão em 2022 foi maior que a do ano anterior, podemos concluir que o produto, o futebol brasileiro, segue bastante atrativo, porém não está sendo mais consumido ao vivo nas praças esportivas. De tal maneira que, se voltarmos a analisar a fórmula apresentada, fica evidente que a falta de público nos estádios não se deve à qualidade do “Conteúdo”, e sim ao fator “Experiência”.
Resumindo: se a experiência não é agradável, o poder de atração do público a um estádio cairá todo sobre o conteúdo. Assim, o torcedor tende a escolher os jogos mais importantes para ir, ou melhor, o que vale a pena enfrentar um maior sacrifício para ver o seu time de perto. Esse comportamento fica comprovado quando comumente vemos um jogo, em uma quarta-feira à noite, pela Copa Libertadores, com o estádio quase lotado, enquanto a mesma equipe, jogando no mesmo estádio, no domingo seguinte, atua para um público infinitamente menor.
Mas como se melhora a experiência de um jogo de futebol? Aqui é importante ressaltar que não existe uma mesma receita que se aplique para todos os casos. Cada estratégia deve ser adaptada aos seus próprios desafios e limitações, mas algumas premissas são comuns a todas as soluções. O primeiro passo que deve ser dado é entender qual é o problema, o que exatamente afasta o torcedor apaixonado por futebol dos estádios.
Para compreender quais são as dores de um torcedor na sua jornada para assistir a uma partida de futebol, é mandatório que o mesmo seja escutado. Não escutar o consumidor para resolver um problema de baixo consumo é como ir ao hospital sem o médico perguntar ao paciente o que ele está sentindo. A pessoa será submetida a dezenas de exames e talvez não encontre nenhuma enfermidade. Aí, com o passar dos tempos, as dores piorarão e pode ser que seja tarde demais para começar um tratamento.
Outro ponto primordial é entender que existem diferentes “públicos” dentro de um mesmo estádio e que cada um desses “públicos” tem necessidades, dores e anseios diferentes, ou seja, algumas ações não impactarão a totalidade da torcida. Um exemplo: uma promoção no preço dos ingressos será muito mais atrativa para o grupo de jovens das arquibancadas do que para o grupo que busca o conforto dos assentos premium.
Os clubes têm de assimilar que o universo de torcedores não fanáticos é maior do que os chamados torcedores doentes, portanto devem criar ferramentas de comunicação e diálogo também com os não tão apaixonados. Precisam também aprender que a jornada de um jogo de futebol começa muito antes da entrada no estádio e problemas na venda de ingressos, no percurso, no transporte público, no entorno do estádio, etc. impactam muitíssimo na experiência do torcedor. Por último, mas não menos importante, enxergar que banheiros limpos atraem muito mais torcedores aos estádios que jogadores de qualidade duvidosa, além de serem muito mais baratos.
A notícia boa é que a parte mais valiosa da equação já temos: o conteúdo futebolístico relevante. Mas somente um grande produto vem se provando não ser mais suficiente para competir com o tempo e o bolso do torcedor, visto que existem outras infinitas formas de entretenimento e lazer por aí.
Romulo Macedo é head de operações de mídia e serviços de notícias dos Jogos Pan-Americanos e Parapan-Americanos de Santiago 2023 e escreve mensalmente na Máquina do Esporte