Muitas vezes não temos noção em tempo real de que estamos vivendo um momento histórico. Somos a geração que viu Usain Bolt, Roger Federer e Lionel Messi, mas talvez a gente só tenha mesmo a dimensão da magia disso quando contarmos para os nossos netos, cheios de nostalgia.
Talvez tenha sido assim também com o episódio-emblema do feminismo, a queima dos sutiãs nos anos 1960 nos Estados Unidos, ou com o direito ao voto dado às mulheres nos anos 1930 no Brasil. Não sei dizer se aquelas mulheres percebiam, a fundo, o tanto que estavam reescrevendo a história.
Guardadas todas as proporções, quando for dado o pontapé inicial para Nova Zelândia x Noruega, no dia 20 de julho, um novo momento para o futebol feminino mundial estará se consolidando. Eu diria mais: um novo momento para o esporte feminino.
As marcas há muito tempo não viram mais o rosto para as mulheres boas de bola. Pelo contrário. Três dos maiores patrocinadores esportivos do mundo já traçam estratégias exclusivas e ousadas pensando no torneio, que começará daqui a pouco mais de 90 dias na Austrália e na Nova Zelândia.
Há alguns dias, a Visa anunciou a escalação de seu time de 33 atletas patrocinadas, incluindo a brasileira Debinha, no maior investimento da companhia ligado ao futebol feminino de todos os tempos. A empresa, parceira da Fifa desde 2007, já tinha se adiantado em 2021, sendo anunciada como a primeira patrocinadora da Copa do Mundo Feminina, aderindo ao novo plano comercial da entidade para promover o esporte para mulheres.
A Coca-Cola, por sua vez, deverá aproveitar a visibilidade do evento como plataforma para discutir empoderamento feminino, além de estender ao torneio na Oceania as famosas ações de hospitalidade já realizadas na Copa do Mundo masculina. Já a Nike botou o dedo na ferida: 13 das 32 seleções do torneio vestirão um uniforme desenvolvido para mulheres em dias de menstruação. A tecnologia estará disponível para o grande público e foi apresentado pela multinacional americana como uma ação de combate que a Nike chamou de “dropout formula”. Ou seja, uma das razões pelas quais mais meninas do que meninos deixam de praticar esporte na adolescência.
No Brasil, a revolução também está em curso. E será televisionada. A Cazé TV, com direito a Fernanda Gentil e tudo, transmitirá a competição, assim como a TV Globo e o Sportv, que trataram o sorteio das chaves da competição com a mesma pompa e circunstância ao vivo com as quais mostraram o sorteio da Copa do Mundo masculina.
Enquanto isso, os animados integrantes do Movimento Verde-Amarelo, a torcida que leva um pouquinho de Brasil iaiá para as arquibancadas, já avisou que estará na Austrália e na Nova Zelândia para empurrar a seleção de Pia Sundhage graças a acordos financeiros fechados com patrocinadores da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). A mesma CBF que, em setembro do ano passado, inaugurou uma estátua de cera de Marta, a Rainha do Futebol, como chama a entidade, para fazer companhia ao Rei Pelé. São as duas únicas estátuas de jogadores no Museu do Futebol Brasileiro.
Como escreveu o craque Richarlyson no cartaz que levou a Wembley para assistir (junto a outras 81 mil pessoas) a Brasil x Inglaterra na Finalíssima entre as seleções femininas campeãs na América do Sul e na Europa: “Se o Brasil joga, eu vou!”. E torcedores e marcas já mostraram que vão também.
Manoela Penna é consultora de comunicação e marketing, e escreve mensalmente na Máquina do Esporte