“Foi um passo rumo ao sucesso. Há muitos degraus para se chegar ao sucesso. O Michael Jordan jogou por 15 anos e foi campeão 6 vezes. Então, os outros 9 anos foram fracassos? É isso que você está me dizendo?” Foi assim que o MVP da NBA, Giannis Antetokounmpo, respondeu a um repórter que perguntou se a derrota do time dele, o Milwaukee Bucks, para o Miami Heat nos playoffs de 2023 significava um fracasso.
Hugo Calderano, número 6 do mundo no tênis de mesa, fez a melhor campanha da história do país na modalidade em Jogos Olímpicos. Após perder a disputa pelo terceiro lugar, o atleta disse: “Conseguir uma medalha é o meu grande objetivo há muitos anos, desde que comecei, e essa decepção toda simplesmente mostra quanto esforço eu faço. Coloco o tênis de mesa na frente da minha vida sempre, minhas escolhas são pelo tênis de mesa, moro longe da minha família há muitos anos, treino sete dias por semana. Com certeza tudo vale a pena porque esses momentos são lindos de se viver, mas claro que não dá para ser diferente”. Ainda assim, as principais manchetes brasileiras focaram por outro ângulo, que Hugo tinha perdido o bronze para o francês.
“Não existe fracasso no esporte. Existem dias bons e dias ruins. Em alguns dias, você terá sucesso; em outros, não. Em alguns dias, será a sua vez; em outras vezes, não. Você não ganha sempre. Algumas vezes, as outras pessoas vencem. E, neste ano, outro time vai ganhar. É simples assim”. A resposta de Giannis vale para o Milwaukee Bucks, para o Hugo e para tantos atletas em Paris.
Por exemplo, vencemos a França no futebol feminino, mas não nos classificamos no vôlei de praia masculino. Temos as medalhas da gigante Rebeca Andrade, que se consagrou com uma das maiores atletas de todos os tempos, o ouro da Bia Souza no judô. Mas se elas não tivessem ganhado medalhas, seriam perdedoras? Seria justo com atletas de alto desempenho que competem muitas vezes sem apoio, incentivo ou expectativa? É justo invadir suas redes sociais apenas para celebrar as vitórias ou execrar após as derrotas?
Arthur Schopenhauer disse que o corpo humano é o único objeto que o homem conhece verdadeiramente. Pensando no esporte, vale complementar com: o mental atua sobre o corpo e mexe com o nosso conhecimento sobre ele. O psicológico mexe com o desempenho. Consequentemente, com o resultado. E o dia a dia influencia diretamente.
Fugindo dos Jogos sem fugir do tema
Há pouco mais de quatro anos, o Palmeiras “apostou” em uma promessa baseada em uma filosofia definida pelo clube e contratou o português Abel Ferreira. Em 1.368 dias de trabalho, o técnico de cabeça (nem tão) fria e coração (quase sempre) quente coleciona 13 finais, 10 títulos, 504 gols marcados e uma recente invasão no CT por “torcedores” que exigiam explicações sobre a atual fase de um time que vai bem em todas as competições que disputa.
Voltando a Paris
“Todo mundo quer ser pai de filho bonito”, poderia ter dito Schopenhauer de uma forma mais elegante ou Giannis após um título. Pela primeira vez na história, o Comitê Olímpico do Brasil (COB) ultrapassou o Comitê Olímpico dos EUA em seguidores no Instagram; são mais de 2,7 milhões de seguidores até o momento em que escrevo, sem termos Snoop Dogg ou Beyoncé ao nosso lado.
A estratégia por trás desse feito, os inúmeros posts pensados, desenvolvidos e publicados considerando as 21 marcas envolvidas, os memes criados sobre fatos e fotos emblemáticas como a de Gabriel Medina voando sobre a onda, as conexões e colaborações com diversas mídias e canais de comunicação, tudo veio de profissionais que entregam a vida como a Bia Souza, a Rebeca Andrade ou o Hugo Calderano. Mas parece que esse filho tem mais pais e mães do que jamais imaginei (algumas vezes, que nem mesmo conheço).
Confesso que sinto uma certa preguiça do jeito brasileiro de medir vencedores ou perdedores, assim como da forma que algumas figuras do jornalismo e do mercado esportivo por vezes se comportam. Raramente quem avalia experimentou as dores de uma jornada esportiva ou entende as lutas que profissionais devem superar para disputar os Jogos Olímpicos ou trabalhar neles. E volto à pergunta: vencer pra quê?
Talvez as perguntas corretas sejam “vencer por quê?” e “vencer para quem?”. E as respostas talvez sejam “porque as conquistas nos movem” e “para nós mesmos”. Talvez. Talvez as respostas sejam outras, e provavelmente mudem de pessoa para pessoa. Seja como for, se esse texto fizer com que alguém reflita sobre o assunto, já ganhei minha medalha de ouro.
Reginaldo Diniz é cofundador e CEO do Grupo End to End e escreve mensalmente na Máquina do Esporte