Para inaugurar essa temporada do Diário da Copa para a Máquina do Esporte, lanço uma pergunta de alguns bilhões de dólares: se você fosse a maior autoridade do seu país no momento de concorrer como possível sede do Mundial, daria sinal verde ou nem cogitaria essa possibilidade? Ah, vamos desconsiderar interesses escusos, combinado?
Começando pelo lado econômico: aqui no Catar, é impressionante a transformação que o país viveu nos últimos anos. Metrôs foram construídos, bairros remodelados, modernos arranha-céus erguidos, as ruas e parques estão intocáveis e até uma nova cidade (Lusail) foi construída do zero. Ouvi de um membro do Comitê Organizador que dinheiro para fazer estádios com ar-condicionado não seria problema, bastava abrir um pouco mais a torneira do petróleo que a conta estaria paga. Se o retorno sobre investimento (ROI) não é o fator principal, injetar esse dinheirão na economia e no evento proporcionou que Doha se aproximasse de Dubai, nos Emirados Árabes Unidos, como uma das cidades mais modernas da região.
Por falar em modernidade, vamos para o aspecto social. A Copa de 2022 vem sofrendo ataques por sua incapacidade de oferecer um ambiente acolhedor a quem queira beber sua cerveja, demonstrar afeto em público ou levantar bandeiras referentes a causas. Colocando estes três pontos sob um olhar histórico, nenhuma destas liberdades em um tradicional país muçulmano se compara à brasileira, mas houve avanços em todas as frentes.
A InBev está vendendo menos do que vendeu na Rússia em 2018 ou venderá nos EUA em 2026, mas existem listas no WhatsApp de onde encontrar cerveja para quem quiser. Ao rodar por Doha, pude ver turistas confraternizando, e certamente muitos casais se beijarão nos estádios ao saírem gols das suas seleções. As causas sociais estão presentes com mais força do que o habitual, e bandeiras importantes fizeram com que os organizadores locais e internacionais precisassem se posicionar sobre condições de trabalho, direitos humanos e liberdade de expressão.
Será que tudo vai permanecer depois da Copa ou o cenário só está mais bonito enquanto a imprensa internacional estiver de olho? Difícil responder, mas usaria o exemplo das Copas de 2014 e 2018. No Brasil, ocorreram protestos e as ameaças de “não vai ter Copa” acabaram com Brasil x Croácia, jogo de abertura daquele Mundial. Já na Rússia, havia o temor de ataques terroristas, mas tudo correu de forma bastante tranquila. Como governante, eu responderia: se dinheiro não for um problema, vamos em frente.
Por aqui, não apostaria em legado esportivo, mas boa parte do investimento na cidade permanecerá, com milhões de pessoas beneficiadas. Do lado social, acredito que os sheiks locais perceberão que o movimento de se tornar um país mais moderno e inclusivo pode ser um bom negócio. Os sorrisos amistosos da população local até agora me fazem apostar nisso.