Tema que tem ocasionado muita polêmica no Brasil nos últimos meses, o fair play financeiro voltou a ser abordado pelo presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Samir Xaud.
Ao discursar no início da cerimônia de apresentação do novo calendário do futebol brasileiro, nesta quarta-feira (1º), o dirigente tornou a prometer, para novembro deste ano (a previsão inicial é que ocorra no dia 26), o lançamento das regras de sustentabilidade financeira para os clubes do país.
“Queremos construir um ecossistema sustentável para o futebol brasileiro”, disse Samir, que citou inclusive a questão do controle de gastos por parte das equipes.
Eleito para o cargo em maio deste ano, o presidente da CBF lançou, no mês seguinte, um grupo de trabalho para definir a proposta de Regulamento do Sistema de Sustentabilidade Financeira.
Basicamente, as regras, que já vigoram nas principais ligas esportivas do planeta, buscam garantir um equilíbrio financeiro mínimo entre as equipes que disputam as principais competições do país (especialmente a Série A do Brasileirão), assim como uma melhor gestão dos clubes, de modo a que não gastem mais do que arrecadam e honrem os compromissos assumidos junto a credores e profissionais contratados.
“Guerra de foice” por dinheiro de TV
Ao mesmo tempo em que alguns dos maiores clubes brasileiros debatem a criação de regras para tornar os torneios oficiais do país mais equilibrados em termos financeiros, várias dessas equipes travam uma “guerra de foice” declarada, por conta do dinheiro das cotas de televisão, que representam uma das principais fontes de receita dos times e determinam diretamente quanto cada qual pode investir em elenco, para se tornar competitivo.
A disputa ocorre no interior da Liga do Futebol Brasileiro (Libra) e ganhou força depois que o presidente do Flamengo, Luiz Eduardo Baptista, o Bap, passou a criticar publicamente o modelo de distribuição dos recursos provenientes dos direitos de transmissão implementado pelo bloco, que possui nove equipes na Série A.
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Na semana passada, o time da Gávea acionou a Justiça, a fim de bloquear o repasse de R$ 77 milhões do pay-per-view feito pela Globo aos clubes da Libra, que reagiram, veiculando notas de repúdio em seus sites e redes sociais.
A presidente do Palmeiras, Leila Pereira, foi além e chegou a sugerir a criação de uma liga independente no Brasil, excluindo o Flamengo.
“Minha sugestão seria criarmos uma outra liga excluindo o Flamengo. Eu acho que o Flamengo tem que jogar sozinho, nenhum clube é maior que o futebol brasileiro. O Palmeiras não joga sozinho, o Flamengo não joga sozinho. Só se ele quer jogar contra o sub-20 dele, entendeu? Então acho que seria bonito nós formarmos uma nova liga excluindo o Flamengo, e o Flamengo joga com ele mesmo. Eu quero ver a audiência que ele vai ter. Acho muito difícil gestores com essa mentalidade, isso não engrandece absolutamente nada o futebol brasileiro”, declarou Leila, em entrevista concedida à Record.
Semanas antes, ela e Bap já haviam polemizado sobre o tema, depois que o cartola rubro-negro disparou contra o acordo da Libra, numa entrevista à Flamengo TV.
Flamengo reage
Nesta quarta, o clube carioca divulgou um comunicado, com o objetivo apresentar sua versão acerca da polêmica.
O clube diz querer um acordo e garante que “não impõe nada a ninguém e nem pode aceitar imposição”.
“A questão gira em torno dos critérios para a divisão da verba de 30% das receitas de transmissão de TV. A Libra botou em votação 6 cenários para a divisão. O estatuto [da entidade] determina que a solução tem que ser por unanimidade. Flamengo e outros clubes votaram em cenários diferentes. Não houve consenso, o Flamengo entrou na Justiça porque a verba estava sendo paga segundo a divisão não aprovada por todos os clubes”, afirma o texto.
O clube alega ainda estar cumprindo o estatuto da Libra e que, no documento, não existe uma definição sobre como a verba de 30%, referente ao critério de audiência, deveria ser dividida.
O Flamengo diz ter procurado três clubes para negociar, mas que os interlocutores mostraram-se irredutíveis. O clube acusa a Libra de agir de forma ilegal, ao adotar o atual critério de distribuição dos recursos.
“O estatuto tem uma regra de transição que assegura, a todos os clubes, receber um valor mínimo garantido nos anos de 2025 a 2029, equivalente à quantia recebida em 2023 corrigida pelo IPCA [Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo]. Se esta regra do estatuto tivesse sido respeitada em 2025 o Flamengo receberia R$ R$ 321.181.432 nesse ano”, afirma o Flamengo.
Vale lembrar que, embora a divisão dos direitos de transmissão afete diretamente o fair play financeiro no futebol brasileiro, são quase nulas as chances de essa questão vir a ser pacificada pelo Sistema de Sustentabilidade que vem sendo gestado pela CBF.
Isto porque a Lei do Mandante, atualmente em vigor, torna os direitos comerciais e de mídia referentes aos jogos em casa propriedades de cada clube.
A solução para a polêmica seria a criação de uma liga independente, em que cada time aceitasse o sistema de divisão proposto, cenário que aparenta ser pouco viável, pelo menos por enquanto.
Antes mesmo de se eleger, Samir afirmou que trabalharia pela criação de uma liga no Brasil. Os ânimos belicosos dos cartolas indicam que essa promessa talvez seja a mais complexa de ser cumprida pelo dirigente.