O noticiário envolvendo os dois grupos que disputam a hegemonia da criação de uma liga unificada para organizar o Campeonato Brasileiro andava silencioso neste começo de ano, mesmo com toda a polêmica envolvendo a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), que acabou retornando para o colo do presidente Ednaldo Rodrigues, com as devidas bênçãos de órgãos como Fifa, Conmebol, Supremo Tribunal Federal (STF) e até mesmo dos clubes das principais divisões do país.
Nos bastidores, contudo, a movimentação criada em torno da tentativa natimorta de candidatura do presidente da Federação Paulista de Futebol (FPF), Reinaldo Carneiro Bastos, para o comando da CBF animou a Liga Forte União (LFU, antiga Liga Forte Futebol (LFF)) a realizar uma investida sobre o grupo dissidente, a Liga do Futebol Brasileiro (Libra).
Nesta semana, a jogada da LFU no tabuleiro de xadrez futebolístico materializou-se na forma de um memorando encaminhado aos clubes dos dois grupos, trazendo uma proposta para divisão das receitas, em caso de uma eventual venda dos direitos do Brasileirão à Globo, maior emissora do país e cujo contrato para exibição da Série A se encerrará neste ano.
Como é a proposta
Em linhas gerais, a proposta segue princípios muito parecidos aos da oferta que a Libra havia feito à antiga LFF, em fevereiro do ano passado, e pela qual 85% do valor arrecadado com direitos de mídia seriam destinados aos times da Série A, ao passo que os 15% restantes iriam para as equipes da Série B.
Na elite do Brasileirão, 45% dos recursos seriam divididos igualmente entre todos os clubes. Outros 30% seriam entregues de acordo com a performance de cada time no campeonato. E os outros 25% estariam relacionados ao apelo comercial das equipes, avaliado de acordo com um cálculo que levaria em conta não apenas a audiência, mas o peso de cada plataforma de mídia.
Essa proposta, embora parecida à que a Libra fez no ano passado, foi elaborada pela LFU, que, desde a mobilização em torno da tentativa de candidatura de Reinaldo Carneiro Bastos, passou a se aproximar dos times paulistas que também orbitavam o cartola da FPF.
Ainda não é namoro
Nos dias que se seguiram à reunião de Ednaldo Rodrigues com representantes de 40 clubes das Séries A e B do Brasileirão, a Máquina do Esporte conversou em off com um dirigente da LFU, que confirmou o movimento de aproximação com os times da Libra.
“Quando Ednaldo foi afastado, inicialmente a Forte União estava fechada com ele. Depois, com o desenrolar da situação, passamos a apoiar a candidatura de Reinaldo Carneiro Bastos, com o compromisso de que ele trabalharia para a liga unificada sair do papel. Agora, mesmo com o retorno de Ednaldo, essa proximidade entre os dois grupos permaneceu”, explicou.
De acordo com ele, a aproximação não equivale, pelo menos por ora, a um namoro.
“Por enquanto, o que rolou é aquela encostadinha de mão, que pode vir a se tornar algo mais sério lá adiante”, disse.
Na reunião realizada na sede da CBF, em 9 de janeiro, dirigentes da LFU abordaram Ednaldo e solicitaram ao dirigente que apoiasse a criação da liga unificada. O cartola não respondeu nem que sim nem que não.
Nos bastidores, a postura do presidente pode ser entendida como um sinal de que a confederação deixará a encargo dos clubes a missão de constituir ou não uma liga para organizar o Brasileirão.
Libra tem proposta bilionária pelos direitos de TV
No fim do ano passado, os clubes que compõem a LFU fecharam a venda de 20% de seus direitos comerciais do Brasileirão pelo prazo de 50 anos, contados a partir de 2025, pelo valor de R$ 2,6 bilhões.
Essa quantia deverá ser quitada nos próximos 18 meses, sendo que a primeira cota, de 50% do valor do investimento, foi paga já em novembro do ano passado. O acordo foi feito com a Life Capital Partners (LCP), a XP Investimentos e a norte-americana General Atlantic.
A Libra também conta com uma investidora, a Mubadala Capital, dos Emirados Árabes Unidos, que propôs criar, em sociedade com os clubes, uma agência que ficará responsável pela venda de direitos de mídia dos times do grupo que disputarem a Série A do Brasileirão.
Nessa sociedade, as equipes ficariam com 50% do faturamento, enquanto o fundo teria os outros 50%. A agência teria exclusividade por 25 anos (até 2049) na negociação dos direitos de mídia dos clubes, e, pela proposta apresentada, a Mubadala ficaria com uma série de obrigações para com os clubes.
Em junho do ano passado, Guarani, Ituano, Mirassol, Novorizontino, Ponte Preta, Sampaio Corrêa e Vitória, que integram a Libra, assinaram um acordo com o fundo de investimentos, recebendo em troca a quantia de R$ 3 milhões.
Em contrapartida, o Flamengo, clube de maior torcida do país e um dos principais articuladores da Libra, deixou claro que não está disposto a entregar seus direitos comerciais pelo prazo de 50 anos pelos valores oferecidos pelos fundos de investimento.
“Hoje, o Flamengo considera que as condições apresentadas aos clubes não valem a pena. Nos preocupa ver notícias de que clubes estão fechando contratos de 50 anos. No Flamengo, fizemos os cálculos, as eleições são de três em três anos. Um contrato desses pegaria os próximos 18 presidentes”, afirmou Gustavo Oliveira, vice-presidente de comunicação e marketing do time carioca, em entrevista ao podcast Maquinistas, comandado por Erich Beting e Gheorge Rodriguez, em novembro do ano passado.
Tanto que, nos últimos tempos, os clubes da Libra têm focado seus esforços nas negociações sobre direitos de transmissão com a Globo.
Na última proposta feita ao grupo, a emissora ofereceu R$ 1,3 bilhão, além da divisão das receitas do pay-per-view no Premiere.
Discussão sobre liga unificada segue empacada
Caso os times aceitem a proposta da LFU, as negociações da Libra com a Globo retornariam à estaca zero.
A Máquina do Esporte apurou com dirigentes de clubes que integram o grupo que as discussões com a LFU ainda seguem muito indefinidas.
“O que existe é uma proposta da Liga Forte União para a Libra. Apenas isso. Tudo está no mesmo passo”, afirmou um deles, ligado a um time que ainda não assinou com o fundo dos Emirados Árabes Unidos.
A recente movimentação da LFU deixa claro que o grupo resolveu voltar suas forças para a busca de uma negociação mais vantajosa pelos direitos de TV.
Vale lembrar que, apesar da LFU contar com um número maior de integrantes, a Libra tem em suas fileiras Flamengo e Corinthians, que possuem as duas maiores torcidas do país e mobilizam as audiências dos dois principais mercados de mídia do Brasil (São Paulo, no caso do time alvinegro, e Rio de Janeiro, no caso da equipe rubro-negra).
A Libra tem, na verdade, quatro das cinco maiores torcidas brasileiras (além dos dois times citados, ainda possui São Paulo e Palmeiras).
Diante desse cenário, a negociação em bloco com a Libra poderia ser benéfica para os times da LFU, ao menos neste momento. Enquanto isso, as discussões sobre a liga unificada seguem empacadas e sem perspectivas de avançar em um futuro próximo.