Ministério da Justiça fala em ilegalidade de sites de apostas e pode ampliar investigação

A Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), órgão do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), abriu guerra contra a atuação dos sites de apostas esportivas no Brasil. Segundo a autarquia, essas empresas estão atuando sem autorização legal, sem nenhum tipo de fiscalização e causando prejuízo aos consumidores.

“A atividade vem sendo explorada sem a devida autorização e sem qualquer mecanismo de controle, fiscalização ou prestação de contas, uma vez que ainda não há regulamentação exigida pela lei, inclusive sem regras que mitiguem prejuízo aos apostadores/consumidores, o que pode, em tese, estar ferindo direitos básicos do consumidor”, afirmou a Senacon, em resposta ao questionamento da Máquina do Esporte sobre as investigações do órgão.

Investigação aberta

Na última terça-feira (30), a Senacon notificou os 40 clubes das Séries A e B, as federações organizadoras de 12 campeonatos estaduais, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), que gere o Campeonato Brasileiro, e a TV Globo a apresentarem contratos de publicidade ou patrocínio com sites de apostas.

As apostas esportivas foram permitidas no Brasil no final de 2018, quando o então presidente Michel Temer sancionou lei nesse sentido. Segundo os termos da lei, haveria um prazo de quatro anos (que se esgota no final de 2022) para que o Ministério da Economia regulamentasse o setor, ou seja, estabelecesse as regras para a atuação desse ramo de atividade no país. Prestes a estourar o prazo, esse regramento nunca saiu do papel.

Desde 2018, os sites de apostas atuam livremente no Brasil, porém com sede no exterior. Isso gera insegurança jurídica, já que as empresas, idôneas ou não, não têm regras para cumprir no Brasil, os consumidores não têm garantia de que receberão seus prêmios, e o governo não arrecada nada com impostos nem gera empregos no país com esse ramo de atividade.

“A nova modalidade de apostas (quota fixa) foi aprovada pela Lei nº 13.756/2018, porém ela ainda não se encontra com sua eficácia vigente, uma vez que fora fixado prazo para regulamentação (autonomia da lei)”, explicou a Senacon.

Preocupação recente

Apesar disso, o governo federal, nesses quatro anos, nunca havia se preocupado antes com possíveis perdas dos consumidores brasileiros ao fazerem apostas esportivas.

Questionada, a Senacon afirmou que o que mudou agora é que esses investimentos vêm crescendo em ritmo bastante acelerado no Brasil.

“Com a publicidade ostensiva com que essas empresas vêm atuando no país, a quantidade de participantes desse mercado, que já está exponencial, se elevará ainda mais e, consequentemente, aumentará a probabilidade de ocorrerem crimes financeiros e ofertas falsas de alto lucro em curto período de tempo, gerando um enorme prejuízo econômico para a sociedade”, justificou o órgão do Ministério da Justiça.

“Cabe, então, à Senacon, a prevenção, apuração e repressão de infrações às normas de defesa do consumidor, incluindo-se, nestas, aquelas relacionadas à publicidade abusiva”, acrescentou.

Patrocínio e publicidade

De fato, os gastos dos sites de apostas em publicidade vêm crescendo no país. Atualmente, os 20 clubes da Série A do Brasileirão possuem parceria comercial com alguma empresa do segmento.

Desses, nove têm patrocínio máster desse ramo de atividade, com a marca ocupando o espaço mais nobre da camisa de América-MG, Avaí, Goiás, Juventude e Santos (Pixbet); Atlético-MG e Fluminense (Betano); Botafogo (Blaze); e São Paulo (Sportsbet.io). O último clube a firmar contrato com esse segmento foi o Athletico-PR, que no início do mês anunciou a Betsson, cuja logomarca ocupa o espaço da barra traseira inferior da camisa.

Recentemente, o Grupo Globo fechou contrato de publicidade com três sites de apostas para as transmissões da Copa do Mundo do Catar 2022. A Pixbet comprou cota de patrocínio na Globo (TV aberta), a Betfair é uma das patrocinadoras do Sportv (TV fechada) e a Betnacional anunciará nos intervalos comerciais da competição.

“Nesse primeiro momento, chamou atenção o crescimento exponencial de contratos de patrocínio entre entidades ligadas ao futebol, inclusive emissoras de televisão, e as empresas do setor de apostas esportivas que, em muitas das vezes, exercem atividades sem autorização no país por meio de websites”

Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon)

“Como consequência da expansão, veio o aumento no número de reclamações e diversos consumidores relatando perdas financeiras exorbitantes, conforme amplamente divulgado na internet”, completou a autarquia.

Na ilegalidade?

O órgão dá a entender que a atuação dessas plataformas, com sede no exterior e que atraem os brasileiros aos seus sites, configuraria uma ilegalidade. Para apostar em um site estrangeiro, o consumidor usa um cartão de crédito internacional para fazer suas apostas. É algo similar ao brasileiro que adquire produtos em sites estrangeiros, como Aliexpress e Shopee.

O problema, no caso dos sites de apostas, é que não há nenhuma garantia de que o consumidor está fazendo negócio com uma empresa idônea. E não são poucas. Calcula-se que existam entre 400 e 500 empresas explorando essa atividade atualmente no Brasil (como não há regulamentação, é difícil fazer a conta exata).

Em caso de não pagamento de uma premiação, o brasileiro não pode acionar órgãos nacionais, como o Procon, contra uma empresa com sede em países como Malta e Curaçao. Consequentemente, perde dinheiro. Mas também é lógico que há várias empresas as quais, apesar de serem obrigadas a ter sede no exterior por causa da legislação brasileira, cumprem suas obrigações.

Investigação deve aumentar

No entanto, nesses quatro anos após a aprovação da lei e ausência de regulamentação, é a primeira vez que há uma investigação forte no setor. Mas o alvo não são as empresas de apostas, mas os contratos firmados por elas com entidades esportivas e a Globo.

Questionada sobre a razão de limitar as investigações às 54 entidades já citadas, sendo que há patrocínios para outras modalidades, clubes, torneios, veículos de comunicação e até influenciadores digitais, os quais fazem publicidade nesse segmento, a Senacon informou que pode ampliar o escopo das investigações.

“Muito provavelmente há outras emissoras (canais abertos e fechados) que possuem contrato de patrocínio com casas de apostas. Cabe salientar que, possivelmente, sejam emitidas novas notificações a fim de abarcar outras empresas que eventualmente não tenham constado nesse primeiro momento”, finalizou o órgão.

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