O Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) notificou, nesta terça-feira (30), os 40 clubes das Séries A e B, entidades esportivas organizadoras de 12 Campeonatos Estaduais, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), que gere o Brasileirão, e a TV Globo a apresentarem os contratos de publicidade e patrocínio firmados com empresas do ramo de apostas. Todos terão dez dias para responder.
A iniciativa da Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), órgão do MJSP, quer apurar quais empresas formalizaram os contratos com os clubes, sendo que todas essas empresas possuem sede no exterior.
“A questão é que temos uma situação de certa insegurança jurídica hoje no Brasil. A lei federal de dezembro de 2018, que legalizou atividade de apostas, tinha previsão expressa de regulamentação até dezembro de 2022. E até agora não houve essa regulamentação”, comentou Udo Seckelmann, advogado especialista em apostas, em entrevista à Máquina do Esporte.
“Será que a Senacon terá acesso a esses contratos para proibir o patrocínio dessas empresas? Querem investigar mais a fundo as empresas que têm operação no exterior? Se a empresa tiver operação no país, é uma contravenção penal. Não poderia”
Udo Seckelmann, advogado especialista em apostas
Atualmente, os 20 clubes da Série A do Brasileirão possuem contrato de patrocínio com alguma empresa do ramo de apostas. Desses, nove são patrocinadores másteres, ocupando o espaço mais nobre da camisa do clube: América-MG, Avaí, Goiás, Juventude e Santos (Pixbet); Atlético-MG e Fluminense (Betano); Botafogo (Blaze) e São Paulo (Sportsbet.io). O último clube a firmar contrato com esse segmento foi o Athletico-PR, que no início do mês anunciou a Betsson, cuja logomarca ocupa o espaço da barra traseira inferior da camisa.
Na lei, sem regras
As apostas de cota fixa, também conhecidas como apostas esportivas, foram aprovadas no Brasil por meio da lei 13.756/18, sancionada pelo então presidente Michel Temer. Havia a previsão de que o setor fosse regulamentado pelo Ministério da Economia até o final do ano, o que ainda não ocorreu.
Com isso, o Brasil vive em uma zona cinzenta em que o setor pode atuar no país, mas, como as regras não foram estabelecidas, as empresas que exploram esse ramo de atividade atuam do exterior.
É uma realidade ruim para empresas, governo e clientes. As empresas não podem estabelecer sede no Brasil para explorar melhor o setor. Os clientes, por sua vez, não têm garantia de que receberão sua premiação, já que há empresas que não possuem idoneidade, e é muito difícil reclamar os direitos do consumidor no exterior. Já o governo federal perde em arrecadação de impostos e geração de empregos.
Contratos, não empresas
Em sua justificativa para fiscalizar os contratos publicitários ou de patrocínio, a Senacon afirmou que “a atividade pode estar sendo explorada sem a devida autorização e sem qualquer mecanismo de controle, fiscalização ou prestação de contas”, o que de fato ocorre.
No entanto, esse ramo de atividade já acontece no país, com aval da legislação, há quatro anos. Apenas agora a Senacon resolveu investigar se há algum tipo de irregularidade nisso.
O mais curioso: a investigação não ocorre nas empresas de apostas, que poderiam estar atuando irregularmente com sede no Brasil ou deixando de pagar apostadores brasileiros, desrespeitando direitos do consumidor. A fiscalização é em cima de clubes, federações e da Rede Globo, que fecharam contratos de marketing com o setor.
A Máquina do Esporte procurou alguns clubes para se manifestarem sobre o assunto. No entanto, os times ainda estudam, com seus departamentos jurídicos, como atender à demanda do ministério e preferem não falar no momento.
Procurada, a Globo informou, por meio do seu departamento de comunicação, que não tinha como se manifestar sobre o tema. “Não temos como nos posicionar, pois desconhecemos a citada notificação”, afirmou a emissora.