Pandemia gera boom de aquisições de clubes europeus por fundos dos EUA

A compra de clubes de futebol europeus por investidores americanos tem sido cada vez mais comum, assim como acontece no Brasil, com o Botafogo, que vendeu sua SAF ao empresário John Textor, e o Vasco, que chegou a um acordo inicial com a 777 Partners.

A próxima aquisição no velho continente deve ser o Zaragoza. O time espanhol está perto de ser vendido para Jorge Mas, também dono do Inter Miami, clube que disputa a MLS. Mas assumiria uma dívida de € 70 milhões e investiria € 20 milhões na contratação de reforços para ficar com 90% das ações do Zaragoza.

Não é um fato isolado. Segundo dados da UEFA, um em cada dez clubes europeus vendidos em 2021 passou a ser controlado por capital americano.

Esse número pode crescer ainda mais, caso Roman Abramovich, que já anunciou que venderá o Chelsea, negocie com algum grupo dos Estados Unidos. O atual campeão da UEFA Champions League e do Mundial de Clubes da FIFA está avaliado em € 3 bilhões.

Entre os interessados no time do sul de Londres estão Todd Boehly, dono do Los Angeles Dodgers, da MLB, e proprietário de 27% do Los Angeles Lakers, da NBA. Ele estaria entre o grupo de investidores liderado pelo suíço Hansjorg Wyss, que avalia a compra do Chelsea.

Durante a pandemia, com a economia dos Estados Unidos tendo sofrido menos efeitos da crise sanitária, cresceu o número de investimentos de magnatas locais em clubes europeus. Cerca de 16 clubes receberam capital americano no período. Esse grupo inclui times tradicionais como o Genoa, arrematado por € 150 milhões.

O perfil desse grupo não é de novatos no esporte. O último a assinar um acordo grande foi Stephen Pagliuca, dono do Boston Celtics (NBA), que se tornou o maior acionista da Atalanta, ao adquirir participação de 55% do clube italiano. Um dos donos da Bain Capital, um dos principais fundos de investimentos do mundo, seguiu os passos deixados por seus conterrâneos nos últimos anos.

Na Itália, 35% dos times da Série A (7 de 20 clubes) são de propriedade de holdings americanas. O interesse desses investidores é no potencial de crescimento dos clubes italianos, que têm enorme tradição, mas enfrentam dificuldades financeiras geradas pela pandemia e necessitam de obras de infraestrutura para renovar estádios e demais equipamentos esportivos.

Durante a pandemia, o Genoa passou para as mãos da 777 Partners, mesmo grupo que negocia com o Vasco no Brasil. A empresa também adquiriu parte minoritária do Sevilla. O Spezia passou às mãos de Robert Platek, diretor de operações da MSD Capital, fundo de investimentos do bilionário Michael Dell, do setor de tecnologia. Já o Venezia, recentemente promovido à Série A, está nas mãos de Duncan L. Niederauer, ex-CEO da Bolsa de Valores de Nova York.

Um dos grandes da Itália, a Roma foi vendida ao empresário Dan Friedkin em 2020 por € 590 milhões. O americano é magnata do setor automobilístico e produtor de alguns dos mais recentes filmes de Clint Eastwood.

Após a aquisição, Friedkin injetou mais € 273 milhões em empréstimos para garantir as operações da Roma, que antes estava nas mãos de James Pallota, presidente do fundo Raptor Group, que já foi dono de 8% do Boston Celtics. Pallota agora concentra investimentos nos e-Sports e é acionista da Fnatic, equipe em que investiu € 6,2 milhões em 2017.

“Há muitos anos, as empresas do setor audiovisual e de entretenimento [dos Estados Unidos] têm optado pelo esporte como pilar de seu crescimento, o que tem permitido um crescimento exponencial das principais ligas, clubes e empresas do setor de entretenimento neste país”, afirmou Ignacio Legido, sócio e diretor da área jurídica da consultoria BDO.

“Eles têm muita experiência em explorar as sinergias existentes entre esses setores”, acrescentou o analista, referindo-se às áreas de audiovisual, entretenimento e esporte.

Há uma outra razão para esse boom de investimentos na Europa. “A legislação americana é, em geral, mais liberal do que a europeia. Isso tem permitido há muitos anos o investimento em ligas, campeonatos, clubes, etc. de forma muito mais simples e flexível do que outros sistemas mais rígidos, como os que prevalecem na Europa. Isso permitiu que o capital privado investisse no setor esportivo muito mais cedo do que na Europa. O futebol não é exceção”, analisou Álvaro Marco, que também é sócio da BDO.

O Milan é outro clube assumido por investidores americanos. O time foi adquirido pelo fundo Elliott após inadimplência do empresário chinês Yonghong Li. A Fiorentina foi vendida em 2019 para o ítalo-americano Rocco Commisso, CEO da Mediacom e dono do New York Cosmos.

E embora não seja dos Estados Unidos, o canadense Joey Saputo, dono do Bologna e do Montreal, que disputa a MLS, também tem sua experiência em uma liga americana.

“A Juventus está listada na Bolsa de Valores de Milão. Após a investigação da Covisoc [Comissão Supervisora ​​de Clubes de Futebol Profissional, órgão da federação italiana], o preço das ações do clube caiu quase um terço. Se tivesse acontecido com uma empresa listada nos Estados Unidos, os acionistas, depois de sofrerem os prejuízos, teriam que processar aqueles canalhas”, afirmou Commisso, em entrevista ao Financial Times.

Desde o início da pandemia, 27 clubes europeus passaram para as mãos de investidores estrangeiros. Em grandes clubes como Atlético de Madrid ou Liverpool, o capital americano entrou em rota mais conservadora. No campeão da LaLiga, a Ares Management injetou € 120 milhões na nova empresa que controla o clube e é administrada por seus atuais principais acionistas, Miguel Ángel Gil Marín e Enrique Cerezo. A participação gira em torno de 33%.

Por sua vez, o Fenway Sports Group, holding americana que detém o Liverpool desde 2010, decidiu transferir 10% de sua holding esportiva para a RedBird Capital por € 662 milhões. Nesta operação, que avaliou o grupo em € 6,18 bilhões, a RedBird se tornou também acionista do Boston Red Sox (MLB), do Pittsburgh Penguins (NHL) e do Toulouse, da Ligue 2 (segunda divisão) da França.

Na Premier League, outro clube que recebeu um novo investidor americano foi o Crystal Palace. O time londrino é controlado por David Blitzer, que também é dono do Philadelphia 76ers (NBA), do Augsburg (Bundesliga) e, desde janeiro, do Real Salt Lake (MLS). Em 2021, Blitzer recebeu € 103,3 milhões para ceder 18% do Crystal Palace a John Textor, mesmo investidor do Botafogo.

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