Queda na negociação de atletas para o exterior já causa impacto no caixa dos clubes

Uma maneira consagrada pelos clubes brasileiros de gerar receita suficiente para empatar os custos de suas operações é a negociação de atletas para o exterior. Uma boa venda garante receita suficiente para superar os rombos do orçamento. A fórmula mágica, porém, dá mostras de desgaste e também de que deixará de ser uma fonte importante de receitas.

Segundo o relatório Convocados/XP, divulgado nesta terça-feira (14), que examina as finanças dos 26 principais clubes do Brasil, houve a arrecadação de R$ 1,155 bilhão com venda de jogadores em 2021, principalmente para o exterior. O montante parece alto, mas em 2019 era de R$ 1,486 bilhão. Ou seja, em dois anos, houve queda de 22,3%.

“No futuro, essa redução no volume de receita por negociação de atletas vai servir para apertar a vida dos clubes. Vai obrigar os times a se ajustarem de alguma forma”, analisou Cesar Grafietti, sócio da consultoria Convocados.

“Como não vem dinheiro de outras fontes, os clubes não vão achar receita de R$ 100 milhões do dia para a noite. Será necessário se reestruturar de alguma forma. Os times necessariamente vão trabalhar por uma redução de custos e investimentos“, acrescentou o economista. 

Queda nas vendas

O estudo examinou as finanças dos 20 clubes que jogaram a Série A do Brasileirão no ano passado, dos quatro times que subiram da Série B para 2022 (Botafogo, Coritiba, Goiás e Avaí), além de Vasco e Cruzeiro, que não conseguiram a promoção, mas entraram neste grupo pela representatividade que têm no futebol brasileiro.

No futuro, essa redução no volume de receita por negociação de atletas vai servir para apertar a vida dos clubes. Vai obrigar os times a se ajustarem de alguma forma.

“Negociar atleta não é um problema. Problema é quanto o clube depende disso e quanto consegue extrair de valor nessas negociações. Vender muito atleta é ruim. Mas não vender nada também é ruim”, explicou Grafietti.

Equipes que tradicionalmente conseguiam realizar boas vendas para o futebol europeu tiveram quedas expressivas. É o caso principalmente de Corinthians, Athletico-PR e São Paulo.

O time de Parque São Jorge deixou um patamar de R$ 139 milhões em 2020 para apenas R$ 28 milhões no ano passado (queda de 79,9%). O clube paranaense, por sua vez, negociou R$ 167 milhões em atletas há dois anos e somente R$ 17 milhões em 2021 (decréscimo de 89,8%).

Desse trio, o Tricolor Paulista foi quem menos caiu, indo de R$ 146 milhões para R$ 110 milhões, embora a diminuição de 24,7% desse ativo seja significativa para o balanço do clube. A venda de atletas significou 38% das receitas do São Paulo em 2020. No ano seguinte, essa parcela caiu para 24% da arrecadação.

Goiás e Coritiba, clubes que disputaram a Série B no ano passado, também tiveram quedas importantes no volume de negócios com negociação de atletas, talvez devido à menor visibilidade de seus jogadores na segunda divisão do Campeonato Brasileiro.

Flamengo embolsou R$ 150 milhões com a venda de Gerson ao Olympique
Reprodução / Instagram (olympiquedemarseille)

 

Flamengo se destaca

No outro lado da tabela, houve os clubes que superaram o momento ruim do mercado e mesmo assim conseguiram fazer bons negócios. Nesse quesito, quem se destaca é o Flamengo. O rubro-negro carioca foi de um patamar já alto (R$ 163 milhões em 2020) para R$ 250 milhões. Apesar de viver um ano esportivamente ruim, o Flamengo, sozinho, foi responsável por 21,6% do montante arrecadado pelos 26 principais times do país.

Negociar atleta não é um problema. Problema é quanto o clube depende disso e quanto consegue extrair de valor nessas negociações.

O Palmeiras, segundo time que mais faturou em 2021, atrás apenas do Flamengo, viu uma queda na arrecadação com venda de atletas. Em 2020, o clube paulista obteve R$ 164 milhões no segmento. No ano passado, vendeu 139 milhões (decréscimo de 15,2%).

No entanto, Flamengo e Palmeiras, times que se destacam financeiramente no futebol brasileiro nos últimos anos, dependem pouco dessas vendas para fechar o caixa. No ano passado, 24% das receitas do Rubro-Negro e 15% da arrecadação do Alviverde vieram com negociação de jogadores.

Fluminense, Atlético-MG, Santos e Vasco também conseguiram atingir um bom volume de negócios vendendo jogadores. O destaque foi o time de São Januário, com arrecadação geral em um patamar menor por disputar a Série B, que obteve 33% de suas receitas negociando atletas.

Dificuldade nas vendas

Grafietti lembrou que alguns fatores prejudicam a arrecadação dos times brasileiros no mercado internacional da bola. Por um lado, as potências europeias buscam jogadores cada vez mais jovens, muitas vezes ainda sem valorização plena.

Foi o caso de joias da base brasileira como Vinicius Júnior, negociado pelo Flamengo ao Real Madrid quando tinha apenas 16 anos (o jogador efetivamente se transferiu para a Europa com 18). À época, o time carioca recebeu € 45 milhões. Hoje, campeão da Champions League e nome certo na Copa do Mundo do Catar 2022, o atacante brasileiro vale € 100 milhões, segundo o site Transfermarkt.

A tendência atual é a Europa contratar jogadores mais jovens e trazê-los diretamente de outros mercados europeus.

Outro fator que pesa é que os gigantes europeus também têm dado preferência por contratar atletas já testados em ligas menores da Europa, como Portugal e Holanda. Times como Benfica, Porto, Ajax e PSV tradicionalmente faturam muito mais dinheiro com vendas de atletas da América do Sul do que os clubes formadores desses jogadores.

“A tendência atual é a Europa contratar jogadores mais jovens e trazê-los diretamente de outros mercados europeus”, apontou Grafietti.

Um exemplo recente é a contratação de Darwin Nuñez, do Benfica, pelo Liverpool. O atacante havia sido negociado pelo Peñarol ao Almería, então na segunda divisão da Espanha, em 2019, por € 13 milhões. No ano seguinte, o uruguaio foi atuar pelo Benfica por € 39 milhões.

Após fazer 34 gols e dar quatro assistências na última temporada, Nuñez despertou o interesse do Liverpool, que pode gastar até € 100 milhões pelo atleta de 22 anos. O clube inglês pagou € 80 milhões pela transferência e poderá gastar mais € 20 milhões em bônus por desempenho.

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