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SAF do Juventus: Reag e Contea levam vantagem em disputa, marcada por denúncias e guerra política

Total Player e AlmavivA, outras duas concorrentes, questionam transparência no processo de escolha da nova investidora

Dilson Tadeu dos Santos Deradeli (ao centro) é o presidente do Juventus - Reprodução / Instagram (@juventusclubesocial)

A discussões em torno da possível criação e venda da Sociedade Anônima do Futebol (SAF) do Juventus, de São Paulo (SP), adquiriram contornos de guerra política, que pode descambar para uma batalha judicial.

Na manhã deste sábado (14), o tradicional clube do bairro paulistano da Mooca promoveu reunião para que três grupos interessados em investir na SAF, que sequer foi constituída, pudessem apresentar suas propostas.

Durante o encontro, porém, os grupos Total Player, dos irmãos Calucho e Paulo Jamelli e do investidor Fernando Medida, e o AlmavivA, com sede na Itália e que já havia tentado assumir o futebol do clube em 2022, decidiram não realizar a apresentação.

Os representantes dos dois grupos gravaram um vídeo, questionando a falta de transparência do processo de escolha do investidor.

Vídeo em que representantes da Total Player e da AlmavivA comentam sobre a reunião – Divulgação

Apenas o terceiro participante, o consórcio encabeçado por Reag Investimentos e Contea Capital, acabou realizando sua apresentação.

Pela manhã, a assessoria de imprensa do grupo encaminhou comunicado à imprensa, explicando detalhes da proposta.

Total Player e AlmavivA, por sua vez, optaram por disponibilizar os links com os materiais de suas propostas e as apresentações que seriam feitas durante a reunião. Elas garantem que seguem na disputa.

Os dois grupos haviam protocolado suas propostas no fim de abril deste ano. Durante os mais de 40 dias que antecederam a reunião do último sábado, cada empresa tinha conhecimento de que a outra participaria da disputa.

A entrada do grupo liderado por Reag e Contea, porém, era uma novidade para os demais concorrentes. Apenas no dia do encontro é que o fato veio a público, após publicação de reportagem da Máquina do Esporte.

Inicialmente, a informação era de que o terceiro concorrente seria a P&P Sport Management, com sede em Mônaco. Na verdade, a empresa, que atua no agenciamento de atletas, não poderia adquirir clubes, por conta do regulamento da Federação Internacional de Futebol (Fifa), que proíbe essa prática.

O que ocorreu, na verdade, é que apresentação da proposta da Reag e da Contea foi feita pelo brasileiro Claudio Fiorito e o italiano Federico Pastorello, que são sócios da P&P Sport Management. Caso o consórcio seja vencedor, os dois irão participar na estruturação do projeto esportivo da SAF e pretendem utilizar suas experiências e redes de contatos para alavancar o futebol do Juventus.

Considerando-se o desenrolar dos acontecimentos, é possível afirmar que esse grupo leva vantagem na disputa para assumir a SAF do Juventus.

A definição ocorrerá apenas na próxima terça-feira (17), quando o Conselho Deliberativo votará se autoriza ou não a constituição da sociedade anônima. Se o “sim” vencer, a instituição ficará vinculada à proposta considerada mais viável, entre as três concorrentes.

Não está claro, ainda, se a aprovação da SAF ocorrerá por maioria simples ou se seriam necessários dois terços dos votos dos conselheiros.

Em 2022, quando a AlmavivA tentou assumir o futebol do Juventus, a tese predominante era de que a votação teria de ser com maioria qualificada.

Já neste ano, fontes que participaram da reunião afirmam ter ouvido do presidente do Conselho Deliberativo do Juventus, Carlos Eduardo Gomes Pedroso, a informação de que a aprovação seria por maioria simples.

Questionamentos e guerra política

O principal questionamento feito pelas duas outras concorrentes (e que foi expresso no vídeo por Domenico Rossi, representante da AlmavivA) reside no fato de que não está claro quem decidirá qual a melhor proposta para assumir da SAF do Juventus.

Na gravação, o executivo defende que essa escolha deveria ser feita pelos membros do Conselho Deliberativo. Na reunião da próxima terça-feira, eles apenas decidirão se o clube irá ou não se tornar SAF, com o nome da futura investidora já definido previamente.

Toda essa discussão em torno da criação e venda da SAF se desenrola em meio a uma das piores crises políticas da história do clube grená.

A polêmica remonta à última eleição, realizada em abril deste ano e que foi marcada não apenas pela forte polarização, como também pela judicialização do processo.

A Chapa 2 – Novos Tempos, Renove Juventus, de oposição e encabeçada pelo conselheiro Marcello Lourenço Betone, mais conhecido como Magrão, precisou recorrer à Justiça para poder concorrer.

No fim das contas, acabou sendo derrotada pelo grupo liderado pelo presidente Dilson Tadeu dos Santos Deradeli, na votação realizada no Conselho Deliberativo, por 53 a 51.

Nesta semana, porém, Magrão pretende ingressar com uma ação judicial, pedindo a anulação da eleição, sob a justificativa de que quatro conselheiros teriam participado irregularmente da eleição.

Nos últimos dias, a disputa política no Moleque Travesso ganhou ares de guerra declarada. Na sexta-feira (13), o Conselho Fiscal do Juventus divulgou a ata da reunião que decidiu suspender, de maneira preventiva, Paulo Artur Vasques.

Ele ocupava a presidência do órgão, durante a votação que rejeitou as contas do presidente Dilson Tadeu.

Os conselheiros Claudio Molina e Eduardo Pinto Ferreira resolveram convocar para a vaga o suplente Gutemberg Almeida Braga, que acabou sendo referendado como novo membro efetivo e presidente do Conselho Fiscal do Juventus.

A Máquina do Esporte apurou que pelo menos oito membros do Conselho Deliberativo, que declaravam ser contrários à SAF, teriam sido afastados de seus cargos.

Entre os conselheiros suspensos está a jurista Eloísa Machado, professora de direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV), que foi impedida de entrar na sede do clube, no último sábado.

Existe uma forte tendência de que, por conta dessas suspensões de dirigentes e conselheiros, a discussão sobre a SAF do Juventus possa descambar para uma batalha judicial.

O que diz o Juventus

O clube foi questionado pela Máquina do Esporte a respeito das queixas de falta de transparência na escolha do investidor da SAF e de suposto direcionamento em favor do consócio Contea/Reag.

A assessoria do Juventus optou por encaminhar link de uma “Nota de Esclarecimento”, publicada no site oficial da instituição.

O texto enumera diversos documentos do Conselho Deliberativo, relacionados à SAF, e alega que “todas as informações, normas e instruções técnicas foram devidamente publicadas dentro do prazo legal, com transparência e em conformidade com o Estatuto do Clube Atlético Juventus”.

No processo em questão, três empresas manifestaram formalmente interesse e confirmaram presença na Reunião Extraordinária realizada no último sábado, 14 de junho de 2025. Contudo, no início da sessão, as empresas Alma Viva e Total Player/Medina optaram por não apresentar oralmente suas propostas, limitando-se apenas a disponibilizá-las por meio de QR Codes exibidos no telão, para consulta dos interessados.

Dessa forma, apenas uma proposta – da empresa Contea- foi efetivamente apresentada, conforme os critérios técnicos e administrativos previamente estabelecidos, sendo submetida à análise dos conselheiros e associados presentes.

O Clube Atlético Juventus agradece a todos os conselheiros e associados que compareceram e participaram ativamente da reunião, contribuindo para um momento crucial da história do Clube. O encontro marcou uma etapa significativa no debate institucional sobre o futuro do nosso Departamento de Futebol.

Trata-se de um dia histórico para o Clube. Enxergamos o futuro com esperança e determinação de reviver as glórias do passado. Acreditamos que, com a transformação e a profissionalização proporcionadas pelo novo modelo de gestão, poderemos sonhar com a volta à elite do campeonato estadual, a reforma do Estádio Conde Rodolfo Crespi, e a participação em competições nacionais.

Nota oficial do Juventus

Conheça as propostas dos grupos interessados na SAF do Juventus

A Máquina do Esporte teve acesso às propostas dos três grupos interessados em assumir a SAF do Juventus e traz, abaixo, informações resumidas a respeito de cada uma delas, em ordem alfabética.

AlmavivA

Com sede na Itália, o grupo conta com mais de 45 mil funcionários e possui investimentos em diversas áreas, sobretudo a de tecnologia.

A AlmavivA passou a atuar no país em 2006. O interesse da empresa pelo Juventus estaria relacionada a duas paixões de seu fundador, Alberto Tripi: o futebol e o Brasil.

O empresário enxergou no Juventus, clube fundado pela colônia italiana de São Paulo, uma forma de unir esses dois amores.

Em termos financeiros, a proposta da companhia italiana é a que aparenta trazer os menores valores. A AlmavivA oferece R$ 70 milhões pela SAF do Juventus (a quantia total chega a R$ 72 milhões).

Porém, ela argumenta que são “R$ 70 milhões investidos de verdade”, já que todo esse dinheiro sairia de seu caixa e não de possíveis receitas futuras do clube. Esse fator é apontado pelo grupo como um diferencial em relação às demais propostas.

A AlmavivA pretende destinar R$ 19,75 milhões para o clube social do Juventus, com R$ 11 milhões depositados em conta em até 48 horas, após a assinatura do contrato.

Outros R$ 8 milhões seriam pagos em duas parcelas de R$ 4 milhões. Além disso, seriam investidos R$ 450 mil no aquecimento das piscinas do parque aquático e R$ 300 mil em projetos socioculturais.

Para o futebol seriam repassados R$ 50,25 milhões, em recursos próprios da empresa. A meta é destinar R$ 2 milhões mensais à folha de pagamento, no primeiro ano, ultrapassando R$ 10 milhões no período.

A AlmavivA se compromete a pagar multa de R$ 10 milhões, caso o Juventus não retorne à Série A1 do Paulistão em até três anos.

A empresa também incluiu uma cláusula em que, caso resolva vender sua participação na SAF do Juventus, ficará apenas com a quantia que de fato pagou. O lucro resultante da operação seria inteiramente repassado ao clube.

Contea/Reag

A proposta do consórcio liderado por Reag Investimentos e Contea Capital veio a público no último sábado. Juntas, as duas empresas administram R$ 25 bilhões em ativos.

O grupo conta com uma série de parceiros, entre eles a P&P Sport Management, cujos sócios Claudio Fiorito e Federico Pastorello é que fizeram a apresentação, durante a reunião no Conselho Deliberativo.

A proposta divulgada pelo consórcio Contea/Reag chega a R$ 500 milhões, do quais parte seriam destinados ao pagamento de dívidas do clube.

No comunicado à imprensa, as empresas não informam se esse dinheiro seria integralmente aportado por ambas ou se viria das operações futuras envolvendo o Juventus.

O grupo pretende reformular o Estádio Conde Rodolfo Crespi, mais conhecido como Rua Javari, que passaria a ter capacidade para 15 mil pessoas.

A proposta prevê ainda a criação de uma nova estrutura administrativa voltada exclusivamente ao futebol, além da implantação de um centro de formação, com foco no desenvolvimento técnico e disciplinar dos atletas.

O consórcio tem a intenção de instalar no Juventus dois restaurantes (sendo um deles com temática italiana), hotel para os jogadores e um centro de fisioterapia, além de construir um spa e uma academia para o elenco profissional.

Total Player

O grupo Total Player é liderado pelos irmãos e ex-jogadores Calucho e Paulo Jamelli, contando também com a participação do empresário Fernando Medina.

O projeto se baseia na relação dos donos da Total Player com o clube da Mooca. Ambos frequentavam o Juventus desde os tempos em que eram criança.

A empresa administra a bilheteria da Rua Javari e o programa de sócio-torcedor do Moleque Travesso há cerca de dez anos. Além disso, Jamelli esteve à frente da escolinha de futebol do clube pelos últimos dois anos e meio.

A proposta da Total Player também atinge R$ 500 milhões, para assumir 90% do capital da SAF (os 10% restantes ficariam com o clube associativo).

Desse montante, R$ 303 milhões iriam para o futebol, sendo R$ 285 milhões para o profissional, R$ 8 milhões para a base e R$ 10 milhões para infraestrutura e centro de treinamento. A meta é retornar à Série A1 do Paulistão em até dois anos.

A Total Player propõe fazer aporte de R$ 10 milhões no momento da assinatura do contrato, além de outro de R$ 8 milhões, após 24 meses, e do pagamento de um total de R$ 6 milhões pelo aluguel do estádio (R$ 50 mil mensais).

A empresa afirma que pretende realizar reformas de até R$ 2 milhões no estádio, mas sua ideia é evitar qualquer tipo de modernização que venha a descaracterizar a Rua Javari.

A proposta consiste em profissionalizar a gestão, mas manter vivo o “futebol raiz” e garantir que o Conde Rodolfo Crespi seja uma espécie de contraponto às arenas elitizadas, hoje existentes no país.