Já faz algumas décadas que os torcedores brasileiros acostumaram-se a ver seus principais talentos sendo levados pelos clubes de futebol da Europa. Esse processo, que é antigo e ganhou força a partir dos anos 1980, tornou-se cada vez mais intenso em tempos recentes, com os jovens craques sendo contratados antes mesmo de terem a chance de brilhar por longos períodos nos principais times do país.
Vide o caso de Endrick, do Palmeiras, que está de malas prontas para o Real Madrid, da Espanha, com apenas 17 anos. E pode ser que, muito em breve, vejamos várias das nossas jovens promessas brilhando na Europa em idades ainda mais tenras, sem ao menos pisarem nos gramados brasileiros.
Na avaliação de Fábio Mello, sócio-proprietário da FMS, que atua há cerca de 20 anos nas áreas de agenciamento e gestão esportiva, a tendência atual é de que, cada vez mais, os clubes europeus passem a criar parcerias estratégicas no Brasil, a fim de ingressar no mercado de formação de jogadores no país.
A afirmação foi feita durante uma entrevista ao podcast Maquinistas, da Máquina do Esporte. Ex-jogador de futebol, revelado na base do São Paulo e com passagens por diversos clubes do país e do exterior, o agora empresário contou a Erich Beting e Gheorge Rodriguez um pouco de sua trajetória após deixar os gramados, aos 30 anos de idade, quando resolveu retomar os estudos e recomeçar em uma nova profissão.
Professor do curso “Gestão de atletas dos campos aos negócios”, da ESPM, Fábio Mello lançou, no fim de abril, seu livro “Jogando de Terno”, em que narra alguns dos principais episódios de sua carreira como agente e gestor esportivo.
“A indústria ainda conhece pouco o trabalho do agente. Em geral, ele costuma aparecer apenas para explicar alguma negociação polêmica ou alguma situação bombástica”, afirmou.
Segundo ele, a ideia do livro é também dar voz aos agentes esportivos e mostrar que há bons profissionais atuando no mercado.
Formação integrada
Ao comentar sobre sua própria trajetória, Fábio Mello lembrou que, para se profissionalizar como jogador, precisou abrir mão dos estudos. Na visão dele, o futebol brasileiro ainda não possui um modelo de formação integrada, que permita ao atleta ter acesso à educação formal, ao mesmo tempo em que evolui esportivamente.
Para o empresário, alguns clubes já conseguiram avançar nessa questão, caso do Palmeiras. De acordo com ele, o modelo de formação que vigora atualmente no país cria barreiras para que os jogadores brasileiros possam conquistar mercados no exterior.
“Os clubes europeus têm evitado contratar jogadores brasileiros. É claro que temos casos como do Endrick ou Estevão, também do Palmeiras, que são pontos fora da curva e irão brilhar muito lá fora”, disse.
Na opinião de Fábio Mello, essas lacunas de formação que persistem no futebol brasileiro farão com que os clubes e grupos europeus busquem, eles próprios, investir diretamente nesse mercado no país.
“Eles buscam uma formação mais ampla. E o modelo brasileiro não tem esse olhar”, afirmou.
Como exemplo desse processo, Fábio Mello citou as recentes aquisições das Sociedades Anônimas do Futebol (SAFs) de Bahia e Botafogo por grandes grupos econômicos do exterior.
“O Grupo City, que é o maior do mundo e possui diversos times, não irá olhar apenas para os jogadores profissionais do Bahia, mas também para a base. E pode acontecer de os melhores da base serem levados diretamente aos principais clubes do grupo no exterior”, explicou.
Questionado se acredita que o futebol brasileiro estaria defasado em comparação ao europeu, Fábio Mello foi enfático:
“Está tão atrasado quanto a educação, a cultura e a segurança. Ele é um reflexo do nosso país”, salientou.
Assista à entrevista completa do ex-jogador e empresário Fábio Mello no canal da Máquina do Esporte no YouTube: