Nesta semana, o Amazon Prime Video anunciou que transmitirá 100 jogos da liga de basquete profissional dos Estados Unidos (NBA). Notícias como esta, sobre investimentos de serviços de streaming em competições esportivas, têm se tornado cada vez mais comuns. Mas nem sempre foi assim.
Quando as empresas de streaming começaram a se tornar febre no mundo, há mais de dez anos, logo despertaram a atenção do público com suas mensalidades baratas em comparação à TV por assinatura, a facilidade de acessar os conteúdos em diferentes plataformas e a ampla oferta de filmes e séries. A ficção audiovisual parecia ser a vocação desses serviços.
No entanto, de uns tempos para cá, com a entrada de grandes players no mercado, a concorrência no setor tornou-se cada vez mais acirrada. Para se produzir um filme ou uma novela, desde a concepção até a finalização do produto, são necessários vários meses ou até anos. Isso em um cenário em que os clientes desse tipo de serviço criaram o hábito de maratonar séries, esgotando-as em poucos dias.
Suprir o apetite do público, nessa nova realidade, passou a ser o grande desafio dos serviços de streaming. Mais recentemente, as empresas resolveram cada vez mais retornar às origens e buscar no esporte uma saída para atrair e fidelizar clientes.
Esporte foi o início de tudo
As gerações mais jovens talvez acreditem que o streaming seja uma invenção de alguns anos atrás feita pela Netflix. Na verdade, porém, esse conceito já vem sendo utilizado há um bom tempo, desde o surgimento dos primeiros serviços de banda larga, em meados dos anos 1990, nos Estados Unidos.
Se antes, nos tempos da internet discada, o usuário precisava fazer o download do arquivo para poder acessar seu conteúdo, no streaming existe a transmissão em tempo real de um grande fluxo de conteúdo digital, por vídeo ou áudio. Ele trabalha com o armazenamento temporário, o buffer. A partir dele, o aparelho (celular, computador, tablet, TV ou notebook) recebe os dados no momento em que são transmitidos.
Os streamings mais conhecidos na atualidade são os on demand, em que o usuário pode acessar o conteúdo quando bem entender. É nessa modalidade que se enquadra a maioria dos serviços que oferecem produções audiovisuais de ficção.
A outra modalidade é o live streaming, que é o utilizado hoje em dia, por exemplo, em lives nas redes sociais. Se atualmente qualquer pessoa com celular tem condições de fazer uma transmissão ao vivo, via internet, há 30 anos isso aparentava ser algo impossível.
E foi justamente em um evento esportivo que o conceito do streaming provou que revolucionaria a forma como as pessoas consomem os produtos audiovisuais. Em 31 de agosto de 1995, ocorreu a primeira transmissão ao vivo de um jogo pela internet, da partida de beisebol entre New York Yankees e o Seattle Mariners, pela Major League Baseball (MLB).
Ali foi o começo de tudo. Foi quando os torcedores se deram conta de que seria possível acompanhar seu esporte favorito em qualquer lugar do mundo, bastando ter à disposição um computador conectado à internet.
Barreiras
Comparar a qualidade das transmissões esportivas via streaming feitas atualmente com as que eram realizadas há quase 30 anos é quase covardia. Mas a questão técnica não foi o fator que retardou a entrada dos campeonatos nesse modelo de transmissão.
O esporte, ao contrário do mundo da ficção, é repleto de complicadores. Um deles é a disponibilidade dos direitos de transmissão, conforme explicou o vice-presidente da IMG Media no Brasil, Evandro Figueira, que também é colunista da Máquina do Esporte.
“Direito de transmissão esportivo é algo que você não compra quando quer, mesmo que tenha uma mala repleta de dinheiro. Às vezes, você tem de esperar um, dois, cinco ou até mais anos até encontrar uma oportunidade”, destacou o executivo.
Amazon Prime Video
E as empresas de streaming não têm desperdiçado a oportunidade. Nos últimos anos, tem crescido cada vez mais a oferta de esporte nas plataformas que antes se dedicavam apenas à exibição de filmes e séries.
Além da NBA, por exemplo, o Amazon Prime Video deteve, em 2022, os direitos de exibição da Copa do Brasil. Tudo bem que, em ambas as competições, o serviço já deixou os assinantes na mão, ao anunciar que não tinha condições técnicas de exibir partidas importantes, como a volta da semifinal da Copa do Brasil entre Corinthians e Fluminense, no mês passado, ou os duelos Milwaukee Bucks x Philadelphia 76ers e Los Angeles Clippers x Los Angeles Lakers, pela NBA, nesta quinta-feira (20).
Paramount+ e Star+
Quem acessa o site do Paramount+, plataforma de streaming do estúdio que legou ao mundo obras-primas do cinema, como a trilogia “O Poderoso Chefão”, talvez imagine que as opções no cardápio da empresa estejam restritas aos produtos de ficção, já que eles ficam em destaque na página principal. Ledo engano.
Em maio deste ano, a empresa conquistou os direitos de transmissão das duas principais competições continentais para os clubes brasileiros de futebol: a Copa Libertadores e a Copa Sul-Americana. O contrato com a Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) será de 2023 a 2026.
O Star+, do Grupo Disney, também tem ampliado sua presença nas grandes competições, como a Libertadores e a Sul-Americana. Atuando alinhado à ESPN, porém, o serviço de streaming vem com uma estratégia que busca valorizar conteúdos exclusivos, caso do grande clássico espanhol, entre Real Madrid e Barcelona, pela LaLiga, que foi transmitido com exclusividade para os assinantes do Star+, tanto em março deste ano quanto na semana passada.
Na Premier League, o Star+ tem abocanhado a exclusividade de diversos jogos importantes. É o caso de Manchester City x Brighton e Chelsea x Manchester United, que serão exibidos neste sábado (22), respectivamente às 11h e 13h30, apenas na plataforma do Grupo Disney. O Star+ também transmitirá nove partidas exclusivas da temporada 2022/2023 do Novo Basquete Brasil (NBB).
HBO Max
Quando essa sigla é pronunciada, muita gente logo pensa em superproduções estilo “Game Of Thrones” (exceto o último capítulo, dirão alguns) e “A Casa do Dragão”. Mas o HBO Max está aí para provar que, mesmo quando a empresa tem vasto know how em ficção, hoje não é mais possível prescindir do esporte no cardápio.
O serviço do grupo Warner Bros. Discovery atualmente detém os direitos da Champions League, competição de clubes mais badalada do planeta. O contrato de transmissão está garantido até a temporada 2023/2024.
Atração e fidelização de clientes
Para Evandro Figueira, os eventos esportivos tendem a se tornar, cada vez mais, um diferencial para os serviços de streaming, na medida em que contribuem para a atração e a fidelização de clientes. A explicação para isso é simples: o assinante chega atraído por um conteúdo exclusivo e acaba tendo de permanecer pelo menos até o fim da temporada, que se estende por vários meses.
“Como um campeonato tem duração de cinco, seis e até dez meses, não tem como o cliente maratonar tudo de uma vez, diferentemente, por exemplo, do que poderia fazer com uma série, que pode ser cancelada depois de algumas semanas”, destacou o vice-presidente da IMG Media no Brasil.
Na avaliação dele, competições de longa duração tendem a ter mais valor estratégico para o streaming do que torneios de curta duração, mesmo aqueles de renome.
“A Copa do Mundo, por exemplo, não seria tão interessante para a estratégia do streaming, pois dura apenas um mês”, afirmou.
Como o streaming permite a possibilidade de se atender a determinados nichos de mercado, isso abre espaço para que esportes de menos apelo midiático possam garantir seu espaço na mídia.
“Na TV aberta ou fechada, você é limitado pela grade de programação. Quando eventos de vários esportes diferentes estão ocorrendo ao mesmo tempo, as emissoras tradicionais vão priorizar o mais popular, que quase sempre é o futebol. No streaming, não. Várias janelas se abrem, e o usuário escolhe qual transmissão deseja assistir. Isso permite que os serviços atendam a vários públicos e gostos. Depois de um tempo, é claro, a plataforma vai avaliar o retorno que aquele investimento oferece e se vale a pena continuar. Mas o streaming pode contribuir para a popularização de outros esportes, além do futebol”
Evandro Figueira, vice-presidente da IMG Media no Brasil