Técnico de futebol profissional é uma das profissões mais incertas. A campanha pode até ter bons números, mas perdeu um clássico aqui, tomou uma goleada dum time pequeno ali, pronto, o fulano perdeu o emprego. Na cabeça do torcedor, o time perde não porque os jogadores estiveram mal ou porque os adversários foram melhores, mas porque o treinador não os colocou nas posições certas, não ensaiou as jogadas ou não fez as substituições corretas em tempo útil. O presidente, pressionado por torcida e conselheiros, se ele próprio não tiver a mesma mentalidade, põe o cara na rua. Pois é. Por estranho que pareça, porque reza a lenda que clubes mais bem geridos dão mais estabilidade ao treinador, mais profissionalismo pode tornar a profissão de técnico ainda mais incerta.
O Manchester United é um dos únicos clubes da elite do futebol no mundo que tem ações listadas na bolsa. Em agosto de 2012, os ingleses fizeram o IPO na bolsa de Nova York, a primeira oferta pública de ações, e desde então têm seus papéis negociados por investidores. Até semana passada, não dava para saber que efeito teria a demissão de um técnico nas ações do time. Alex Ferguson ocupou o cargo por 27 anos e o deixou no fim da temporada passada, de 2012/2013, com o 20º título do Campeonato Inglês conquistado com 11 pontos de vantagem para o segundo colocado. Uma festa. A saída do escocês foi extremamente atípica, então não havia muito o que concluir.
Aí entrou David Moyes, outro escocês, contratado do Everton para treinar o Manchester United em 2013/2014. A temporada não poderia ter sido pior. Foram 27 vitórias, nove empates e 15 derrotas, um aproveitamento de 52%. A equipe foi eliminada da Copa da Liga Inglesa, eliminada da Copa da Inglaterra, caiu nas quartas de final da Liga dos Campeões da Uefa e perdeu para o Everton no Campeonato Inglês, um resultado que tirou o clube da Liga dos Campeões de 2014/2015. Moyes, na terça-feira da semana passada, dia 22, foi enfim demitido pelo clube.
A demissão do técnico teve um efeito direto na bolsa americana. Cada ação terminou o dia 22 com preço de US$ 18,78. Foi o valor mais alto que um papel do Manchester United custou em mais de 11 meses. A última vez em que esteve acima deste patamar foi em 2 de maio de 2013, quando cada ação custava US$ 19,04.
A explicação para a alta não é muito complicada: investidores entenderam que, ufa, com Moyes finalmente fora do clube, o Manchester vai voltar a vencer. Não importou muito o fato de que, fora da Liga dos Campeões da próxima temporada, o time inglês vai sofrer uma redução considerável nas receitas, porque vai ganhar menos com premiações pagas pela Uefa a participantes do torneio e menos com direitos de transmissão referentes às partidas dele. É esta informação, de natureza financeira, que costuma importar para investidores de empresas convencionais. A direção quis passar a mensagem de que medidas estão sendo tomadas para recuperar os resultados – e conseguiu.
A experiência do Manchester United na bolsa com a demissão de Moyes mostra que, para o azar dos técnicos, mais profissionalismo e sofisticação na gestão também podem tornar o cargo do treinador ainda mais suscetível a pressão. Antes, havia a torcida, os conselheiros, os jogadores insatisfeitos, os outros membros da direção, entre tantos os que pediam a cabeça do técnico para resolver milagrosamente os problemas do time. Agora acionistas e investidores entraram na turma. A demissão passa também a ser a solução para estancar as perdas na bolsa de valores.