Sua língua materna é alemã, mas, por questões geopolíticas que remontam aos grandes conflitos bélicos que varreram a Europa na primeira metade do século passado, ele tem nacionalidade italiana, mesmo ostentando um nome que tem origem germânica: Jannik Sinner.
Alcunha que, a propósito, caberia muito bem em algum protagonista de história em quadrinhos. E, de fato, nos dias que correm, trata-se de um atleta que tem uma legião de fãs e é tratado como herói por muitos.
Nascido na província do Tirol do Sul (região que foi tomada da Áustria ao fim da Primeira Guerra Mundial, em 1919), Jannik Sinner, filho de uma alemã, é o primeiro cidadão italiano na história a se tornar número 1 no ranking da Associação dos Tenistas Profissionais (ATP). Vale destacar que o da Associação de Tênis Feminino (WTA) também nunca foi liderado por uma representante da “Velha Bota”.
O feito será oficializado nesta segunda-feira (10), em uma condição um tanto amarga para Sinner, já que, na última sexta-feira (7), ele foi eliminado na semifinal do Torneio de Roland Garros, na França, pelo espanhol Carlos Alcaraz, que, no ano passado, tornou-se o mais jovem tenista da história a chegar ao topo do ranking da ATP.
De qualquer forma, Sinner já estava com a liderança garantida, graças à desistência do sérvio Novak Djokovic (até então o número 1 da ATP) nas quartas de final da competição francesa, por causa de uma lesão no joelho direito.
Na Itália, alguns órgãos de imprensa já se referiam a Sinner como “Il n.1 al mondo” (o número 1 do mundo), caso, por exemplo da La Gazzetta dello Sport, que lamentou a derrota do compatriota, mas destacou sua preparação para o Torneio de Wimbledon, no Reino Unido, que será disputado em julho (o italiano espera ter um desempenho ainda melhor na grama).
“Claro que também há a notícia do ranking, ser número 1 do mundo é bom, e estamos todos felizes. Mas o trabalho nunca vai parar e a mentalidade não vai mudar: sabemos o que precisamos melhorar para dar mais passos à frente”, declarou Sinner, que foi capa de uma edição italiana da revista Vanity Fair, por conta da conquista do Australian Open, em janeiro deste ano.
Roland Garros 2024 foi “caixinha de surpresas”
A chegada de Sinner ao topo do ranking da ATP não foi a única novidade proporcionada neste ano por Roland Garros. Pela primeira vez desde 2015, quando o suíço Stanislas Wawrinka ficou com o troféu, o torneio francês não foi vencido por Rafael Nadal ou por Novak Djokovic.
A final de 2024 colocou frente a frente Carlos Alcaraz e o alemão Alexander Zverev, responsável por eliminar Rafael Nadal (ganhador de 14 edições de Roland Garros) logo na primeira rodada do torneio.
O título ficou com Alcaraz, que garantiu a taça ao derrotar Zverev em um confronto que durou 4 horas e 18 minutos. Com a vitória, o sucessor de Nadal se tornou o primeiro tenista da Era Aberta (pós-1968) a ganhar seus três primeiros torneios de Grand Slam em três pisos diferentes. De quebra, conseguiu ultrapassar Djokovic e alcançar o segundo lugar no ranking de simples da ATP.
Esta foi a primeira vez, desde 2004, que Roland Garros não teve Nadal, Djokovic ou Roger Federer (os três principais tenistas masculinos das duas últimas décadas) na grande decisão, em um indício de que a mudança geracional consolidou-se de fato no tênis mundial.
Federer, aliás, foi a grande inspiração de Sinner na adolescência. Agora, o italiano tem a chance de trilhar os caminhos de seu ídolo e, quem sabe, até mesmo superá-lo. O tempo dirá.
Os negócios do novo líder do ranking
Apesar de suas raízes germânicas e de atualmente residir em Mônaco, Sinner ter fortes ligações com a Itália, a começar por sua paixão pelo “Calcio”. Ele é torcedor declarado do Milan.
O atleta começou a praticar tênis e esqui ainda na infância, destacando-se nos dois esportes. A partir dos 13 anos, dois fatos afetaram significativamente sua vida.
Um deles foi a mudança de sua família para Bordighera, na região da Ligúria, onde Sinner melhorou significativamente seu italiano. Hoje, ele também fala inglês fluentemente e é fã da série norte-americana “Prison Break” e do rapper Eminem.
Também aos 13 anos, ele resolveu deixar o esqui e o futebol (outra de suas paixões) de lado, para se dedicar exclusivamente ao tênis. Sábia escolha.
Até o momento, desde que se profissionalizou em 2018, Sinner acumula 13 títulos e totaliza US$ 21.499.280 em prêmios, somando-se simples e duplas, o equivalente a R$ 114.930.851 pela cotação atual.
Sua ascensão tem sido constante. Em 2020, Sinner era o adolescente mais bem ranqueado do mundo. No ano seguinte, já estava no Top 10 da ATP. Em 2024, no Australian Open, conseguiu o feito de derrotar ninguém menos do que Djokovic, que era o número 1 do ranking mundial e tem dez títulos do torneio no currículo.
Com as vitórias nas quadras, o italiano passou a fechar patrocínios importantes. Atualmente, Sinner possui parcerias com as seguintes marcas: Nike, Head, Rolex, Gucci, Intesa San Paolo, Fastweb, Pigna, Lavazza, La Roche-Posay, Panini e Fórmula 1.
De acordo com a imprensa da Itália, Sinner também negocia acordos que deverão ser anunciados em breve, com Alfa Romeo, Technogym e Parmigiano Reggiano.
Com 2,6 milhões de seguidores no Instagram, o tenista italiano procura produzir conteúdos que vão além de sua rotina nas quadras ou da exposição das marcas parceiras.
Ele foi responsável por lançar na rede da Meta, por exemplo, a iniciativa “What’s Kept You Moving” (“O Que Mantém Você se Movendo”, em tradução livre), uma série de conteúdos que se dedica a debater a questão da saúde mental, feita em parceria com o velocista Filippo Tortu e a esgrimista paralímpica Bebe Vio, ambos também italianos.
Em 2020, durante o auge da pandemia de Covid-19, o tenista divulgou nas redes o desafio #SinnerPizzaChallenge, em que pagava € 10 para cada foto que ele recebesse de uma pizza semelhante a si mesmo ou a outras personalidades da Itália. Os recursos foram destinados para a compra de suprimentos médicos para o tratamento de pacientes da doença.
Tênis em alta na Itália
Para se ter uma ideia do que Sinner representa para o tênis italiano, desde 1977, quando o país conquistou a Copa Davis, da Federação Internacional de Tênis (ITF, na sigla em inglês), a nação mediterrânea não alcançava uma conquista de expressão na modalidade.
Seja por ação da fortuna ou da virtu (conceitos criados por outro italiano célebre, o pensador Nicolau Maquiavel, para se referir à sorte e às qualidades de indivíduos nas disputas travadas em outra arena, a da política), o tênis italiano vive um momento de alta em 2024.
Além da chegada de Sinner ao topo do ranking de simples da ATP, a Itália contou com representantes em três finais de Roland Garros: no simples feminino e nas duplas masculina e feminina.
Jasmine Paolini classificou-se para a final no simples após derrotar a russa Mirra Andreeva, por 2 sets a 0. Na decisão, ela acabou sendo derrotada pela número 1 do mundo, a polonesa Iga Swiatek.
Paolini, de 28 anos, obteve outro feito notável para a Itália, ao garantir a vaga na final de duplas, ao lado da compatriota Sara Errani. Elas acabaram perdendo para a norte-americana Coco Gauff e a tcheca Katerina Siniakova, por 2 sets a 0.
Por fim, na decisão das duplas masculinas, os também italianos Simone Bolelli e Andrea Vavassori foram derrotados pelo salvadorenho Marcelo Arevalo-Gonzalez e o croata Mate Pavic, por 2 sets a 0.
Por ironia do destino, justamente o novo melhor do mundo e maior nome do tênis italiano em todos os tempos foi o único a não chegar à decisão em Roland Garros 2024 entre as quatro categorias principais. Além do simples masculino, a Itália também não teve representante na final de duplas mistas.