Não é raro para quem acompanha as notícias esportivas deparar com informações relacionadas à assinatura de um pré-contrato com um jogador profissional de futebol. No entanto, nem sempre há a clareza do que isso significa ou das consequências de tal documento. Assim, esta coluna se volta a algumas considerações gerais sobre o tema.
O pré-contrato ou contrato preliminar é um documento por meio do qual as partes assumem o compromisso de celebrar contrato futuro e definitivo, ajustando parte das condições que orientarão tal negócio. Trata-se de uma estratégia que é assumida para dar alguma segurança às partes quando, por qualquer motivo, ainda não é possível assinar o documento final.
Ocorre, porém, que há diversas formas de contrato preliminar. Inclusive, a doutrina jurídica reconhece, até mesmo, a existência de um pré-contrato unilateral, quando apenas uma das partes manifesta seu compromisso em celebrar, futuramente, o contrato definitivo.
Assim, as consequências da assinatura de um pré-contrato dependerão das características de cada documento analisado. Em razão disso, Alcides Tomasetti Jr, célebre professor de direito civil, distingue as figuras do contrato preliminar em grau de obrigatoriedade fraco e forte.
Em síntese, segundo o jurista, quando o contrato preliminar já contiver todos os elementos essenciais para a realização do contrato definitivo, ele possuirá grau de obrigatoriedade forte. Assim, caso uma das partes se recuse a assinar o contrato definitivo, será possível lhe exigir tal conduta.
Por outro lado, quando o contrato preliminar não contiver todos os elementos essenciais para a realização do contrato definitivo, ele possuirá grau de obrigatoriedade fraco. Assim, caso uma das partes se recuse a assinar o contrato definitivo, apenas será possível lhe exigir indenização pelas perdas e danos suportadas em razão da frustração do negócio.
A influência da obra de Alcides Tomasetti Jr no tema é inegável, sendo, inclusive, esse o tratamento dado pelo tema no Código Civil.
Pois bem. No mercado esportivo, a figura do contrato preliminar é frequentemente utilizada. Afinal, não é possível que um atleta mantenha, ao mesmo tempo, contrato de trabalho com mais de uma agremiação. Apesar disso, o Art. 25, §1º, do Regulamento Nacional de Registro de Transferência de Atletas de Futebol da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) autoriza que o jogador já assine um pré-contrato de trabalho durante os últimos seis meses de vigência de seu vínculo.
A utilidade do instrumento, portanto, é clara: apesar de não ser possível ao jogador já assinar um contrato definitivo com sua nova agremiação, há como as partes manifestarem expressamente a intenção de assiná-lo futuramente, o que lhes dá maiores seguranças. Tratamento semelhante é dado no âmbito internacional pelos regulamentos da Fifa.
É digno de nota, ainda, que há casos em que propostas oficiais enviadas aos atletas são consideradas contratos preliminares unilaterais, demonstrando a manifestação da vontade do clube em assinar o contrato definitivo nos termos propostos.
De forma semelhante, essa estrutura pode se tornar mais comum para atletas e intermediários. Afinal, o novo Regulamento de Agentes da Fifa, abordado anteriormente, apesar de reiterar que cada jogador só pode manter um contrato de representação válido, autoriza que os agentes abordem atletas agenciados por outros profissionais nos últimos dois meses de seus contratos.
Resta, então, saber: qual é a consequência jurídica se esses contratos preliminares, nos quais podem se incluir, até mesmo, propostas oficiais, forem descumpridos?
Como visto, a resposta dependerá dos elementos já previstos no pré-contrato ou na proposta.
A situação, porém, não é inédita, já tendo sido analisada pela Justiça do Trabalho brasileira e por órgãos de resolução de disputa especializados, como a Corte Arbitral do Esporte. Com efeito, já há decisões condenando a parte a cumprir o pré-contrato, bem como a indenizar a parte lesada, quando isso não for possível. Tudo dependerá, então, dos elementos contidos no pré-contrato.
É nítida, enfim, a importância do contrato preliminar, recomendando-se que seja sempre revisado por um advogado.
Alice Laurindo é graduada na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, em que cursa atualmente mestrado na área de processo civil, estudando as intersecções do tema com direito desportivo. Atua em direito desportivo no escritório Tannuri Ribeiro Advogados, é conselheira do Grupo de Estudos de Direito Desportivo da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, membra da IB|A Académie du Sport e escreve mensalmente na Máquina do Esporte