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Acorda, Brasil! Por que o Le Mans vale mais que um clube daqui?

Por mais que tenhamos um avanço nas SAFs, investidores brasileiros ainda preferem um time da segunda divisão da França em vez de um no Brasil

Em conjunto com a Outfield, Georgios Frangulis, Novak Djokovic, Felipe Massa e Kevin Magnussen são os novos donos do Le Mans FC - Reprodução / Instagram (@lemansfc.officiel)

Nos últimos dias, duas notícias chamaram a atenção no mercado de compras de clube de futebol e deveriam servir para um momento de reflexão ao futebol do Brasil.

A primeira delas foi o levantamento que indicou a presença de 117 SAFs no Brasil após quatro anos do início da lei que facilitou a criação das Sociedades Anônimas do Futebol no país. A outra foi a aquisição do Le Mans FC, da França, por um grupo de personalidades em parceria com a gestora brasileira Outfield.

O avanço das SAFs no mercado nacional é um caminho irreversível. É só observarmos como a Europa está hoje em relação à presença de investidores privados no futebol. Não tem muito como por aqui ser diferente.

Mas a questão que fica é a seguinte: sendo o mercado brasileiro a “bola da vez” para investimentos privados no futebol, por que um grupo de investidores liderado por um fundo brasileiro foi preferir comprar um clube da segunda divisão da França?

Hoje, é muito mais barato investir em um clube de segunda divisão no Brasil do que na França. Além disso, no Velho Continente, a concorrência é mais acirrada e mais profissional. Sem falar que, sendo um dos berços do pé de obra mundial e o maior exportador de talentos que há, um time de futebol no Brasil pode ser, no médio prazo, um negócio muito mais rentável do que um clube sediado na Europa.

Por que, então, Georgios Frangulis e Felipe Massa, amigos e sócios na Oakberry, foram preferir levar os também amigos Novak Djokovic e Kevin Magnussen a investirem em um clube de um país que não tem qualquer ligação com eles?

O que falta para o Brasil

Da mesma forma que o Brasil é um mercado em potencial e em crescimento para a compra de clubes, ele ainda é muito passional e instável para quem investe por aqui. É só olhar o que aconteceu com as primeiras grandes SAFs que foram feitas no país para perceber que o investimento na aquisição de clubes ainda precisa amadurecer para ser mais seguro.

As pressões da torcida sobre os primeiros donos de Cruzeiro e Coritiba indicam que um clube de massa, por aqui, ainda é um investimento que precisa de pulso firme e conhecimento da história e da tradição para ser mais bem-sucedido.

Da mesma forma, o enrosco que tomou conta do Vasco e, agora, parece querer chegar ao Botafogo, mostra que é preciso ter muita calma ao saber qual a capacidade de se investir que o parceiro tem.

Por fim, ainda existe um outro abismo por aqui. A falta de uma maior profissionalização do mercado de futebol como um todo.

O porto seguro europeu

Hoje, por mais que o futebol francês atravesse uma crise financeira, com dificuldade de encontrar um parceiro de mídia para a Ligue 1 e com a queda na arrecadação dos clubes, o cenário do futebol europeu dá segurança para quem vai investir no país.

Com campeonatos bem estruturados e regras muito bem definidas de gestão financeira e capacidade de crescimento, ser um clube-empresa na Europa é bem mais seguro do que por aqui, em que não há uma perspectiva de organização clara para a gestão do futebol brasileiro.

Além disso, a estrutura já existente no Le Mans, em comparação com a falta dela na maioria dos times das Séries A e B do Brasil, exige dos compradores do clube focar apenas no que é essencial, que é a gestão de atletas, sem tanta preocupação com a própria infraestrutura, tornando o investimento mais barato e com potencial de retorno mais rápido.

O Brasil é um mercado com um potencial gigantesco de crescimento para investidores privados no futebol. Mas, por enquanto, ainda é mais negócio para investidores brasileiros comprarem um time da segunda divisão da França do que um clube daqui.

Erich Beting é fundador e CEO da Máquina do Esporte, além de consultor, professor e palestrante sobre marketing esportivo

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