No futebol moderno, a voz de quem comanda o clube vale tanto quanto o gol de quem decide em campo. Mas até onde o protagonismo de líderes como Luiz Eduardo Baptista, o Bap, e Leila Pereira fortalece as marcas, e em que momento poderá colocá-las em risco?
Nas arquibancadas do futebol brasileiro, nasceu um novo tipo de protagonista. Ele não dribla, não finaliza, e tampouco precisa vestir a camisa 10. Seu palco é a coletiva, a rede social e a reunião de conselho. Seus passes são palavras, e sua força, a capacidade de dominar o noticiário. São dirigentes que transformaram bastidores em espetáculo.
Protagonistas
Entre eles, dois nomes simbolizam essa nova era: Bap, presidente eleito do Flamengo em 2025, e Leila Pereira, primeira mulher da história centenária do Palmeiras a ocupar o cargo e reeleita no comando do clube. Ambos entenderam algo fundamental: quem controla a narrativa, controla o jogo.
Sob a liderança deles, Palmeiras e Flamengo se consolidaram como modelos de gestão profissional e de comunicação assertiva. Os dois sabem que, no Brasil, a paixão do torcedor é moldada inclusive em viver o clube como parte da sua própria identidade, e sacaram que ignorar o poder que o palco e o debate fora de campo possuem seria ingenuidade.
Quando Bap fala, o mercado escuta. Quando Leila se pronuncia, o país inteiro comenta e as redes sociais agradecem, pois o resultado é quase sempre o mesmo: manchetes, memes e milhões de interações com a certeza de que protagonismo tem nomes, cores, escudos e são eles que ditam o ritmo do futebol brasileiro.
Nada passa despercebido. Da sacada bem-humorada e perspicaz do termo “terraflanistas” à resposta irônica, calculada e debochada, tudo se transforma em conteúdo, e conteúdo vira moeda. Cada frase, uma estratégia. Cada gesto, um gatilho para engajamento.
O efeito é poderoso. Mais atenção, mais visibilidade, mais valor comercial e, seguramente, muito mais resultados.
No caso do Palmeiras, os números e os feitos são tão sólidos quanto o discurso. Durante a gestão da presidente alviverde Leila Pereira, o clube conquistou títulos em sequência (Libertadores, Brasileirão, Copa do Brasil, Recopa Sul-Americana e Paulistão), consolidando-se como a instituição mais vencedora da década.
Sob a presidência de Leila, o Palmeiras alcançou o maior superávit da história do clube, investiu em infraestrutura, construiu o Centro de Excelência, modernizou as categorias de base e manteve o futebol feminino entre os mais competitivos do continente. Uma gestão que uniu o campo à marca, o resultado à reputação e ainda, de quebra, lidera o maior programa de relacionamento com o sócio-torcedor do país. Hoje, o Palmeiras é sinônimo de consistência, profissionalismo e equilíbrio, dentro e fora das quatro linhas.
No Flamengo, não é diferente. A gestão corporativa, bem como a comunicação profissional e afiada, fizeram o clube ultrapassar R$ 1 bilhão em faturamento, ampliando receitas de patrocínio e direitos de mídia, além de títulos nacionais e internacionais importantes. A profissionalização do clube também teve participação efetiva de Bap, mesmo antes dele assumir a presidência do time rubro-negro, pois o dirigente fez parte da estruturação liderada por Eduardo Bandeira de Mello.
Dois modelos distintos, mas igualmente bem-sucedidos: um movido pela precisão administrativa, outro pela potência de mercado. Juntos, Leila e Bap personificam o novo papel dos líderes esportivos: figuras que pensam, falam e influenciam com a mesma força dos times que entram no campo de jogo.
Os riscos
Mas há um risco que precisa ser mitigado e que deve estar no radar de ambos. Quando a narrativa se concentra demais em uma única voz, o clube corre o risco de deixar de ser instituição para se tornar extensão de personalidade.
O escudo eventualmente pode dar lugar ao rosto, o coletivo cede ao individual, e a paixão que une pode, por vezes, dividir.
Florentino Pérez, no Real Madrid, mostrou como essa equação pode ser virtuosa — e perigosa. Transformou o clube em um império global com os “Galácticos”, mas também o fez refém de resultados e egos.
Dana White, no UFC, trilhou um caminho semelhante: criou uma liga bilionária, mas centralizou tanto a narrativa que qualquer ruído pessoal virava crise institucional.
O sucesso é indiscutível, mas a vulnerabilidade é a mesma: quando tudo gira em torno de uma pessoa, qualquer ruído vira crise.
Curiosamente, essa dinâmica extrapolou o esporte. No entretenimento, Taylor Swift mostrou que dominar a própria narrativa é poder. Ao assumir o controle total de sua imagem e carreira, transformou-se em uma força global e, por tabela, fez a NFL alcançar números históricos de audiência, apenas por aparecer nas arquibancadas para apoiar o noivo Travis Kelce, astro do Kansas City Chiefs. Uma artista movida pela autenticidade que provou algo simples e profundo: estratégia sem verdade não cria conexão.
No Brasil, essa lógica se intensifica e é inegável que Leila Pereira é a prova mais bem-acabada de que falar o que se pensa e com verdade, traz consigo a admiração e o respeito de muitos, inclusive com gostinho de: “poxa, eu deveria ter dito isso e não falei”. Do outro lado, Bap é sempre preciso e direto, igualmente não mede palavras e me resgatou uma frase de que gosto muito: “Ninguém morre de notícia ruim, morre de susto”. Isso já foi prova prática quando o assunto foi o sonhado estádio do Flamengo.
A comunicação dos dirigentes se tornou combustível para o debate e gatilho para paixões. Em tempos de redes sociais e da economia da atenção, um tuíte vale mais do que uma coletiva, e o silêncio pode custar mais do que uma derrota.
Mesmo assim, há muito mérito nesse novo modelo quando Bap e Leila continuam investindo em planejamento, profissionalização das estruturas, expansão das receitas e valorização dos seus clubes, trazendo para o futebol brasileiro um novo patamar de gestão e influência, já que são de fato líderes que inspiram, desafiam o status quo e movem multidões — cada um à sua maneira.
A questão sempre será o limite: até que ponto o protagonismo serve ao clube, e quando o clube começa a servir ao protagonismo? O mundo corporativo já ensina isso há tempos.
Steve Jobs era a alma da Apple, mas a empresa sobreviveu porque construiu uma cultura capaz de seguir sem depender de um único nome. No futebol, o desafio é o mesmo, pois lideranças fortes são importantes, mas culturas fortes são indispensáveis, e controlar a narrativa é essencial.
O futebol é feito de emoção compartilhada, vitórias coletivas e símbolos que sobrevivem às pessoas.
O sucesso, nesses casos, vem acompanhado de um aviso: quanto maior o holofote, mais tênue a sombra. Essa lógica é sedutora e perigosa: mesmo que a centralização acelere no curto prazo, o cuidado deve ser trabalhar a sustentabilidade no longo prazo.
A comunicação de Bap e Leila também tem um lado construtivo: profissionaliza, inspira, movimenta o mercado e mostra que gestão e emoção podem coexistir. Como o futebol é feito de emoção compartilhada, vitórias coletivas e símbolos que sobrevivem às pessoas, eles sabem exatamente o tamanho da responsabilidade que possuem.
No fim, o desafio de quem lidera, seja no campo, na empresa ou no microfone, é o mesmo: comunicar com propósito, inspirar com equilíbrio e transformar narrativa em legado. Tanto Leila quanto Bap sabem disso e, mesmo com o show à parte que suas colocações e presenças fortes trazem, ambos trabalham para que a indústria do futebol evolua além dos resultados em campo.
Não há dúvida de que o legado está sendo escrito.
Ah, e o juiz? Sem ele, esse artigo jamais teria sido escrito.
Reginaldo Diniz é cofundador e CEO do Grupo End to End
Conheça nossos colunistas