Nas décadas de 1980 e 1990, sabíamos facilmente onde encontrar os principais eventos esportivos. É verdade que, naquela época, tínhamos apenas os canais abertos, então era mais fácil “zapear” e encontrar o que se queria assistir.
Marcas como Show do Esporte, Faixa Nobre do Esporte, Esporte Espetacular e Globo Esporte se consolidavam como as principais fontes de informação e entretenimento esportivo.
De lá para cá, no entanto, muita coisa mudou. Surgiram a TV por assinatura, as plataformas de streaming, e o esporte ampliou consideravelmente o seu espaço em todas as mídias. Em 2014, chegamos a ter, por exemplo, 12 canais na TV por assinatura 100% dedicados ao esporte. Com a concorrência acirrada, os principais canais disputavam cabeça a cabeça a atenção do espectador/assinante.
Em um mercado aquecido, com recorde de número de assinantes na TV paga (eram 21 milhões em 2014), as receitas destes canais permitiam a compra de direitos com exclusividade. Não existe forma mais fácil de atrair o espectador do que dizer que o jogo que ele quer assistir está apenas naquele canal. É desta forma que todos os canais buscavam fidelizar a audiência e assim ampliar sua base de assinantes e sua receita com publicidade.
Copa do Mundo, Jogos Olímpicos, Brasileirão, Copa do Brasil, Premier League e Uefa Champions League são exemplos de propriedades que já eram consolidadas. Tê-las de forma exclusiva na sua programação era importante para atingir os objetivos de receita com assinatura e publicidade. A busca pela exclusividade, porém, acabava aumentando consideravelmente o valor pelos direitos e podia dificultar “fechar a conta”.
E essa conta da exclusividade tem limite. Emissoras e plataformas de streaming têm toda uma matemática para entender qual é esse limite para o bolso, que não necessariamente é o mesmo para todo mundo. Com o tempo, começou-se a entender que dividir, sem dividir, também é uma estratégia inteligente. Mas o que é dividir, sem dividir?
É possível dividir os direitos de uma competição sem necessariamente dividir a atenção do espectador/assinante. Como? Basta que os jogos daquela competição sejam divididos de forma que todas as plataformas que comprarem um pedaço dela tenham algum tipo de exclusividade nos direitos, seja de plataforma ou de jogos. Parece confuso, mas vou tentar esclarecer.
A NFL, por exemplo, vende os seus direitos há anos para várias plataformas, chegando a incríveis US$ 10 bilhões de receita por temporada. Em 2022/2023, a Amazon terá a exclusividade dos jogos de quinta-feira, o Thursday Night Football, pagando mais de US$ 1 bilhão, enquanto a ESPN desembolsará quase US$ 3 bilhões para os jogos de segunda-feira, o Monday Night Football. NBC, CBS e Fox, por sua vez, pagam pouco mais de US$ 2 bilhões cada uma por uma parte desse bolo. Cada uma tem sua exclusividade, cada uma faz a sua conta para entender quanto pode pagar, e é dessa forma que a NFL conseguiu aumentar suas receitas, pois entendeu que não conseguiria gerar estas mesmas cifras entregando todos os seus direitos a um único parceiro.
Aqui no Brasil, a primeira entidade a “fatiar” os seus direitos de transmissão foi a Conmebol sob consultoria da IMG e da FC Diez. Em 2019, no início do ciclo atual, eram quatro pacotes diferentes distribuídos por quatro plataformas diferentes (TV Globo, Sportv, Fox Sports e Facebook). A Conmebol entendeu que seria a melhor forma de transformar suas competições e aumentar suas receitas, o que de fato aconteceu.
O Campeonato Paulista também adotou a mesma estratégia ao distribuir seus direitos por TV Record, YouTube, HBO Max e Premiere.
Ambas as entidades definiram seus pacotes e foram ao mercado com uma estratégia clara, mostrando a todos a força das suas competições. Quem quisesse “entrar na festa” precisaria seguir o que havia sido estipulado anteriormente.
É nesse mesmo momento de criação da estratégia que se define como será a distribuição dos jogos, ou seja, onde cada jogo será exibido. Mas isso é assunto para a próxima coluna, em que vou tentar explicar um pouco das diferentes estratégias e pontos que são levados em conta para essas definições.
Evandro Figueira é vice-presidente da IMG Media no Brasil e escreve mensalmente na Máquina do Esporte