A explosão das apostas esportivas nos Estados Unidos após a anulação do Professional and Amateur Sports Protection Act (Paspa) ou Lei de Proteção ao Esporte Profissional e Amador, em 2018, nos mostra mais ou menos como será o futuro do Brasil após a assinatura da medida provisória (MP 1182/2023) pelo Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva em julho.
Enquanto o Congresso tem tempo para debater os ajustes da regulação proposta, ainda há uma janela importante de oportunidades para o Governo Federal considerar em relação às boas práticas que já ajudaram a proteger a integridade esportiva em outros mercados regulados.
Na coluna do mês passado, falei sobre como a tecnologia de monitoramento, que permite às ligas e reguladores visibilidade 24/7 de todos os mercados globais de apostas e é um dos pilares mais relevantes de um mercado regulado de apostas esportivas. Somente em 2023, a Genius Sports já identificou 81 eventos esportivos brasileiros que apresentaram apostas “fora do padrão”, em várias modalidades, mas principalmente no futebol.
A manipulação de resultados, como qualquer outra atividade criminal, se desenvolve mais onde não há transparência e compartilhamento de informações, e o uso efetivo da tecnologia de monitoramento das apostas é essencial para identificar atividades suspeitas e desencorajar a corrupção. No entanto, não se pode depender apenas dessa tecnologia. Prevenir é melhor que remediar, assim, medidas de longo prazo, como auditorias de integridade e programas educacionais, devem ser implementadas para proteger o esporte brasileiro.
Garantir que as políticas estejam alinhadas com as melhores práticas do setor
Com tantos problemas que o esporte brasileiro enfrenta, conforme destacado pelo relatório da Genius Sports e, recentemente, pelo pedido de extensão da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), a estabilidade é necessária para garantir que o futuro do esporte esteja protegido.
É fundamental que as entidades esportivas garantam o futuro das suas competições por meio da adoção de políticas e procedimentos já estabelecidos por ligas relevantes do cenário mundial. O primeiro passo começa com uma auditoria sobre integridade em que se analisa desde a quantidade de apostas que a competição atrai no mundo todo, até ferramentas para avaliação de seus regulamentos e sanções disciplinares existentes.
Esses padrões de conduta já começam a ser reconhecidos por algumas organizações esportivas brasileiras, como a Liga Nacional de Basquete (LNB), que acabou de anunciar uma nova parceria com a Genius Sports. De maneira proativa, a liga trabalhará para revisar suas políticas e aprimorará sua proteção às competições e sua capacidade de investigação.
A importância da educação
Apesar da falta de regulação, as apostas esportivas explodiram no Brasil com publicidade e patrocínios desde 2018. Essa visibilidade dos produtos de apostas faz com que a educação de atletas, técnicos e árbitros brasileiros seja muito importante.
A grande maioria dos jogadores e jogadoras que se envolvem com escândalos relacionados a apostas têm pouco ou nenhum conhecimento das potenciais consequências de suas ações e das estratégias utilizadas pelas organizações criminosas para manipular os jogos.
Em todos os níveis do esporte brasileiro, os participantes precisam entender o tipo de informação que pode ser divulgada, como notícias do time e lesões de companheiros; onde elas podem ser reportadas; e as consequências pessoais e profissionais que elas podem acarretar.
As ligas e federações têm duas ferramentas educacionais à sua disposição para combater a manipulação de resultados: workshops e plataformas de e-learning. No mês passado, a Associação Brasileira de Defesa à Integridade do Esporte (Abradie) organizou um workshop com a Liga de Basquete Feminino (LBF) para suas principais atletas e treinadores antes do Jogo das Estrelas. Como uma das primeiras ligas a se unir à Abradie, a LNB também já investiu em educação, organizando um workshop com seus atletas da categoria Sub-22 em maio.
Enquanto isso, no nível internacional, o PGA Tour foi uma das primeiras organizações esportivas a lançar uma plataforma de e-learning, criando um programa compulsório de integridade para todos os atletas, caddies e árbitros. Outros programas de e-learning similares foram utilizados pela Euroliga, a Ladies Professional Golf Association (LPGA), a National Lacrosse League (NLL) e outras, em parceria com a Genius Sports.
Adotando uma abordagem global à integridade
A manipulação de resultados é um problema bem complexo e que nunca será completamente eliminado. Não há uma solução única para que o esporte possa facilmente seguir e conseguir resolvê-la. Em vez disso, as ligas e federações em todos os níveis do esporte brasileiro devem ter uma abordagem mais global e a longo prazo, protegendo-se das ameaças em várias frentes.
Tanto dentro quanto fora do esporte, a educação tem o poder único de provocar mudança a longo prazo. Apenas se os atletas entenderem como podem ser abordados para manipular resultados e as consequências disso é que eles terão total ciência de como proteger suas carreiras e a integridade do esporte.
Em parceria com a Abradie e a Genius Sports, muitas ligas já estão proativamente investindo em educação sobre integridade. Mas, enquanto os níveis de corrupção relacionados às apostas crescem no país, é preciso fazer mais para educar e empoderar os atletas, treinadores, árbitros e outros participantes das competições com acesso direto a esse conhecimento.
Guilherme Buso liderou a comunicação do NBB por mais de uma década e ainda trabalhou na Federação Paulista de Futebol (FPF) e na Puma Brasil, antes de assumir como líder de esportes e apostas da Genius Sports para o mercado brasileiro. Jornalista com Pós-Graduação em Marketing e Mestrado em Gestão Desportiva pela Universidade de Coventry (Inglaterra), ele escreve mensalmente na Máquina do Esporte