Lembro-me com clareza quando me encantei com o esporte americano. Foi na mesma época em que me apaixonei pelos Jogos Olímpicos. Eu era um garoto assistindo pela televisão aos Jogos de Los Angeles, em 1984. Com uma equipe incrível e o boicote de vários países do bloco comunista, os americanos fizeram uma campanha histórica. Com destaque para Carl Lewis, um gênio das pistas de atletismo.
Interessado, comecei a tentar entender como uma equipe podia ser tão forte: ganhar ouro no basquete sem usar os profissionais, vencer no vôlei, arrebentar na natação e dominar no atletismo. A primeira resposta que encontrei foi a força e a estrutura do esporte universitário no país. Além do grande número de estudantes praticando esportes, as universidades contavam com uma estrutura incrível e o sucesso dos programas esportivos eram muito importantes para a imagem dessas instituições.
Mas essa explicação já tem quase quatro décadas. A evolução do esporte dos EUA nesse período foi focada em dinheiro, aliada à disputa acirrada pela atenção das pessoas, acentuada pelas redes sociais. Nos últimos anos, novas leis passaram a permitir que os atletas universitários ganhem dinheiro com a própria imagem, uma transformação enorme.
Dentre os atletas, estrelas de modalidades olímpicas são muitas vezes atraídas pelo dinheiro das grandes ligas, como a NFL. Marquise Goodwin foi para os Jogos Olímpicos de Londres 2012 no salto em distância, mas não se dedicou totalmente ao atletismo para fazer carreira no Buffalo Bills e no San Francisco 49ers, entre outros times da NFL. Atualmente, é jogador do Cleveland Browns. Apaixonado por rúgbi, Nate Ebner disputou os Jogos Olímpicos do Rio 2016 pelos EUA, mas foi pelo New England Patriots que garantiu três títulos do Super Bowl e o sucesso financeiro.
Se você ligar a TV, abrir o jornal ou escutar o rádio aqui nos EUA, perceberá que quase não há espaço para esportes que não sejam futebol americano, basquete e beisebol em um primeiro patamar, e futebol, hóquei no gelo, Nascar e F1 em um segundo nível. Tênis e golfe também aparecem de vez em quando. A disputa por atenção é feroz, com os esportes mais populares aumentando suas temporadas para atrair mais a atenção e ganhar mais dinheiro, como fizeram a NFL e a NBA nos últimos anos.
Quando tem esporte universitário na TV, o tempo é dedicado principalmente ao futebol americano, com alguma coisa que sobra também para o basquete. Modalidades como ginástica, natação, atletismo e luta, que garantiram aos EUA a melhor campanha nos Jogos de Tóquio 2020, raramente aparecem nas transmissões de televisão.
Estamos acostumados a ver a indústria do esporte como força, mas, para o esporte olímpico do país, essa indústria tem sido mais competição nos últimos anos. Se o caminho de modalidades fortes para o sucesso olímpico dos EUA não contemplar um forte retorno financeiro para os atletas, a tendência é de perda de competitividade nas modalidades que garantiram a hegemonia olímpica americana nas últimas décadas.
Sergio Patrick é especializado em comunicação corporativa e escreve mensalmente na Máquina do Esporte