Na época em que Leila Pereira assumiu a presidência do Palmeiras, na antiga coluna da Máquina do Esporte no site da ESPN, escrevi que ela poderia trazer um frescor ao ambiente que contamina, se a gente pode dizer assim, o futebol brasileiro.
Leila trazia uma liderança totalmente diferente daquelas que a gente tradicionalmente acompanhava no futebol, do dirigente nascido e criado dentro do clube e que chegou ao cargo máximo da entidade que ele torce.
Leila chegou depois ao Palmeiras, como patrocinadora, e conseguiu alçar o caminho até a presidência. Desde então, vem provocando uma espécie de terremoto nas bases do futebol brasileiro.
Apoiada pelo sucesso do Palmeiras dentro de campo, ela assumiu uma liderança que começa a virar protagonismo no combalido ambiente de falta de atividade da cartolagem brasileira.
As atitudes tomadas no caso de racismo envolvendo o atacante Luighi são o melhor exemplo que a gente pode ver desse diferencial trazido por Leila. Ela simplesmente desistiu de esperar a conivência da Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) e até agora tem tentado ir às últimas instâncias para punir o que já deveria ser crime inafiançável em qualquer lugar do mundo.
Se ganhará a batalha, não dá para saber. Mas Leila mostra a diferença que faz a liderança feminina dentro do esporte. Ainda mais na América do Sul.
Historicamente, o futebol, especialmente do lado de cá do oceano, é um ambiente em que muito se fala, pouco se decide e quase nada se coloca em prática.
Como qualquer mulher, Leila sabe desde o berço que precisa tomar decisões. Mesmo que não seja a melhor delas. Mesmo que não agrade a todos.
Agora, ela mobilizou diversos clubes e a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) a aderirem ao pleito do Palmeiras e cobrarem diretamente a Fifa para intervir no caso da Conmebol. E começou a questionar, com argumentos econômicos, se não é melhor associar-se à Confederação das Associações de Futebol da América do Norte, Central e Caribe (Concacaf). Não o Palmeiras, mas o futebol brasileiro, para ampliar os ganhos dos times daqui, jogando com clubes norte-americanos e mexicanos em vez dos mesmos adversários ultrapassados da América do Sul.
Leila toma a decisão que o árbitro não toma dentro de campo ou mesmo fora dele no frescor do ar-condicionado de uma sala de VAR. Leila toma a decisão que a CBF não toma muitas vezes para mudar e respeitar o calendário do futebol brasileiro. Leila coloca o dedo na ferida e toma a decisão como poucos sabem fazer.
Como fez publicamente ao cobrar ídolos do Palmeiras, como Dudu e Rony, para respeitar contratos. Pode não ser a melhor decisão ou aquela que o torcedor não esteja tão acostumado a ver. Pode ser infeliz como perguntar se os torcedores estão mais calmos depois que tudo dá certo.
Mas Leila vem se mostrando uma dirigente que, para o bem ou para o mal, assume a responsabilidade de ocupar o cargo máximo de uma entidade esportiva. Parece óbvio, mas quase nunca o óbvio é regra no futebol.
O grande diferencial de Leila na cadeira da presidência do Palmeiras é mostrar que presidente de clube não pode jogar só para a torcida. É importante jogar com ela e não contra ela, mas da mesma forma é importante fazer o que precisa ser feito para tornar o ambiente do futebol mais saudável, em todos os aspectos.
No emblemático mês de março, Leila Pereira mostra que uma liderança feminina pode trazer ao ambiente do futebol aquilo que ele mais precisa: tomadores de decisão. Mesmo que não seja a melhor delas.
Pelo menos é alguém que honra o cargo que representa.
Erich Beting é fundador e CEO da Máquina do Esporte, além de consultor, professor e palestrante sobre marketing esportivo