Podemos afirmar que o consumidor esportivo está em constante evolução. Novas tecnologias, hábitos, regras, costumes, tendências e leis modificam ininterruptamente a maneira como interagimos e consumimos esportes. O rádio, que já teve a sua era de ouro na transmissão esportiva, foi trocado pela televisão, que agora também está perdendo espaço para outras plataformas.
A prova dessa nova transformação no hábito do consumo esportivo está refletida na pesquisa “2023 Sports Fan Insights: The beginning of the immersive sports era” (“Percepções dos fãs de esportes em 2023: O início da era imersiva dos esportes”, em tradução livre), da Deloitte, que mapeia o cenário de mudanças no comportamento dos fãs.
A pesquisa foi conduzida com mais de 3 mil torcedores, todos com mais de 14 anos e de diversas modalidades, nos EUA. Ela nos revela que o torcedor ainda está disposto a investir tempo e dinheiro para assistir às partidas. Entretanto, o que chama atenção é a diferença comportamental entre diferentes gerações.
Enquanto 71% dos torcedores em geral preferem assistir aos jogos ao vivo, esse número diminui para 58% para a Geração Z (nascidos entre 1997 e 2010) e a geração dos Millennials (1981 até 1996). Outro dado importante é que quase a totalidade dos fãs da Geração Z afirmaram usar mídias sociais para consumir conteúdo esportivo, sustentando que seguir seus clubes e atletas preferidos nas redes sociais seria uma maneira de demonstrar a sua paixão.
A interação interpessoal se apresentou como fundamental para a Geração Z, já que, em 61% das vezes em que assistem jogos de suas casas, os torcedores dessa geração dizem que estão assistindo na companhia de outras pessoas. Essa experiência em comunidade é um enorme atrativo para muitos da Geração Z: quase 40% afirmaram que estariam mais propensos a assistir a um jogo na própria casa se estivessem com amigos e familiares.
Nascidos já na era digital, os fãs da Geração Z estão usando a tecnologia para aumentar as interações com outros torcedores. Cerca de metade dos torcedores dessa geração dizem usar mídia social para ler comentários ou para interagir com outras pessoas, enquanto assistem a uma partida ao vivo em casa. A Geração Z também é mais aberta, em relação a gerações mais antigas, sobre ver jogos em streaming (sob demanda) com uma experiência mais personalizada, como visualização conjunta com amigos, diferentes ângulos e possibilidade de fazer comentários ao vivo. Cerca de um terço dos torcedores da Geração Z também gostaria de poder assistir a um jogo do ponto de vista de um atleta ou ter acesso aos bastidores dos jogos como parte de uma experiência de visualização sob demanda.
Mesmo quando vão aos estádios, os torcedores da Geração Z ainda precisam estar conectados com outras pessoas por meio de mídias sociais. Um quarto dos fãs da Geração Z afirmou que a razão principal de se ir a um estádio ou ginásio é para vivenciar a experiência com amigos e familiares, mas, enquanto assistem aos jogos, tentam se manter conectados trocando mensagens e fazendo publicações nas mídias sociais.
A transmissão por streaming em plataforma sob demanda parece ser mesmo o futuro das transmissões esportivas. 30% dos torcedores em geral já pagaram por uma assinatura para assistir a esporte nos últimos 12 meses. Entre os Millenials, esse número aumenta para 46%. Quando perguntados sobre a experiência de assistir a uma partida em streaming, cerca de metade dos torcedores em geral que já assistiram por essas plataformas afirmaram que a experiência foi mais interativa e personalizada do que um jogo na TV a cabo ou aberta. Muitos torcedores também indicaram que buscam mais personalização e recursos nos serviços de streaming.
A fragmentação dos eventos esportivos entre diferentes plataformas parece ser um problema relevante. Quase metade dos torcedores disseram que perdem jogos que gostariam de assistir por não ter a assinatura do serviço certo, e 44% revelaram que assinam mais de uma plataforma para acompanhar todos os esportes preferidos. A maioria dos torcedores (59%) disseram que pagariam um pouco mais para ter uma plataforma que possua todos os jogos que eles gostariam de assistir em um só lugar (80% dos Millennials estão dispostos a pagar mais).
Outros aspectos interessantes apresentados na pesquisa foram em relação a novas maneiras de interagir e consumir conteúdo esportivo. Metade da Geração Z e dos Millennials com mais de 21 anos demonstraram interesse de ter opções de apostas em tempo real durante os eventos esportivos. Os apostadores, em geral, também se mostraram mais ativos como torcedores, aumentando a probabilidade de ir aos estádios, assinar uma plataforma de streaming, adquirir produtos oficiais, comprar ingressos para a temporada e participar de jogos “fantasy”.
Entretanto, é importante destacar que 59% dos não apostadores expressaram preocupação sobre o impacto das apostas a longo prazo nos esportes profissionais.
A pesquisa também apresentou que os torcedores possuem um conhecimento moderado de tokens não fungíveis (NFTs) e fan tokens, especialmente entre a Geração X (nascidos entre 1965 e 1981) e os Millennials. No entanto, as taxas de adesão ainda são baixas, com apenas 5% dos entrevistados tendo afirmado que possuem os ativos digitais. Mesmo assim, 60% dos torcedores manifestaram interesse em comprar tokens digitais, se eles trouxerem benefícios no “mundo não digital” como assentos premium, eventos e produtos exclusivos.
Em resumo, o estudo revelou um novo cenário no mercado esportivo, delineado por mudanças comportamentais das novas gerações e evoluções tecnológicas. Cabe agora, em um momento de grandes negociações de contratos de transmissões, a clubes, ligas e emissoras absorverem essa nova realidade e essas tendências, criando experiências mais interativas, personalizadas, exclusivas e multiplataforma que satisfaçam as necessidades atuais dos torcedores.
Romulo Macedo é chefe de operações de mídia e serviços de notícias dos Jogos Pan-Americanos e Parapan-Americanos de Santiago 2023 e escreve mensalmente na Máquina do Esporte