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Não basta patrocinar, é preciso entreter

O que NFL, F1 e Kings League mostram sobre a nova era do engajamento: conteúdo, emoção e pertencimento como estratégia de marca

"Drive to Survive" não só reacendeu o interesse global pela Fórmula 1 como criou uma nova base de fãs, mais jovem, mais engajada, mais digital - Divulgação / Netflix

O mundo mudou e, com ele, o esporte. O que antes era consumido majoritariamente ao vivo, agora disputa atenção com vídeos curtos, streamings, podcasts, memes e realities. O fã não se contenta mais com o placar final: quer personagem, drama e bastidores, além de participar, cocriando essa história.

Nesse novo cenário, a fusão entre esporte e entretenimento, o chamado “sportainment”, não é apenas uma tendência. É uma estratégia poderosa de fidelização de audiência e diferenciação de marca.

A NFL, por exemplo, entendeu isso há décadas. O Super Bowl é um fenômeno cultural global, tanto pelo jogo quanto pelo espetáculo. Em fevereiro de 2024, o show de Usher atraiu uma audiência que rivalizou com a da final em si. Marcas como Pepsi, Apple Music e Doritos não apenas expõem suas logomarcas, mas criam experiências integradas, com storytelling antes, durante e depois do evento, alimentando comunidades digitais e ativando a audiência em múltiplas plataformas.

A Fórmula 1 é outro grande exemplo. A série “Drive to Survive”, da Netflix, não só reacendeu o interesse global pela categoria como criou uma nova base de fãs, mais jovem, mais engajada, mais digital. Equipes que antes eram apenas entidades esportivas são, hoje, personagens de uma narrativa contínua. E os patrocinadores entenderam a mudança, passando a se posicionar como facilitadores do acesso, dos bastidores e da emoção, não apenas como apoiadores técnicos.

E então veio a Kings League, a liga de futebol digital criada por Gerard Piqué, que mistura esporte, game e show em tempo real. Lá, regras são flexíveis, partidas têm “cartas de poder”, e os torcedores interagem diretamente com as decisões do jogo. Não há fronteira entre quem joga e quem assiste. O modelo, irreverente, gamificado e 100% multiplataforma, mostra que o engajamento nasce quando o público sente que faz parte da história. Marcas como McDonald’s, Spotify, Adidas e Red Bull perceberam isso e entraram no jogo com ativações nativas ao universo da liga, falando a língua da comunidade.

O que esses casos ensinam? Que, para engajar e fidelizar, é preciso entreter de forma relevante. E isso vale para todas as marcas, não só as esportivas. Em um mundo onde a atenção é escassa, conquistar o tempo das pessoas demanda mais do que atributos racionais: exige narrativas envolventes, formatos interativos e experiências com significado emocional.

No Brasil, a maioria das marcas ainda ativa patrocínios e campanhas com foco na visibilidade, ignorando o potencial narrativo do esporte e do entretenimento.

Mas a mudança já começou.

As marcas que atualmente se destacam são aquelas que entendem o jogo como um palco de experiências, não apenas de exposição. Que criam conteúdos que o público quer compartilhar, ações que geram conversa, formatos que transbordam para o entretenimento. Que, em vez de apenas patrocinar, participam e cocriam com o fã.

Porque, no fim das contas, não se trata apenas de torcer ou consumir. Trata-se de pertencer. E para conquistar esse espaço no coração (e na atenção) das pessoas, o caminho passa por uma verdade simples, mas poderosa: antes de fidelizar, é preciso entreter.

Eduardo Corch é consultor de marketing e professor do Insper. Tem 25 anos de experiência no mercado esportivo, com passagens por Adidas, Grupo BRF e Bridgestone, além de agências como Havas Sports & Entertainment. Foi líder de projeto na Copa do Mundo do Brasil 2014 (Adidas) e Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro 2016 (Bridgestone), e gerenciou contratos de patrocínios com clubes, atletas e entidades esportivas

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